Antes de sair Egydinha pediu permissão à mãe para doar duas de suas roupas para Ciça, alegando que gostaria que a ama se arrumasse melhor para acompanhá-la até o Centro.
- Ela tem o corpo parecido com o meu. E como a senhora diz: temos que fazer caridade.
- Faça como achar melhor, mas não abuse. Os empregados precisam reconhecer seus lugares.
- Ora mamãe! A Ciça sempre foi um amor de candura e respeito também.
Foi assim que naquela tarde, Egydia e Ciça, sua serviçal saíram como duas amigas. E Ciça se sentiu a vontade para fazer confidências.
No Bonde
- Patroinha, eu não queria abusar, mas preciso lhe pedir um favor.
- Fale Ciça. Do que se trata?
Ciça lhe entrega a carta que recebeu que estava dobrada entre seus seios.
- Será que a sinhazinha pode ler pra mim?
- Claro que sim. Posso abrir?
- Sim, por favor. - disse Ciça ansiosa
E lá mesmo no Bonde que as levavam até o Centro as duas ficaram sabendo do que se tratava.
- Um lindo postal Ciça! Veja! E parece ser de um pretendente que quer conquistar seu coração.
- O que diz aí?
- "Para a morena mais linda da Capital ofereço essa flor e o meu coração. Benedito Silva"
- Mas quem será esse Benedito?
Egydinha sorriu da ingenuidade de Ciça e falou:
- Ora Ciça, é o Tito, o carteiro.
- Será? – ela ainda demorou a entender.
- Claro que sim. Tito é só um apelido, o nome de certo é esse: Benedito Silva.
- É, vou ter que perguntar a ele quando ele aparecer se foi ele mesmo que mandou essa flor, quer dizer esse...
- Postal Ciça. Aliás, belíssimo. É do tipo mais caro porque tem relevo, sinta a flor.
- É bonito sim, mas...
- Mas o que? Fale Ciça!
- Eu pensei em me casar com um rapaz mais acertado, assim com mais...
- Posses. Um rapaz que pudesse lhe proporcionar uma vida melhor. Eu entendo, mas veja Tito é trabalhador e esforçado. Você devia dar uma chance a ele. Por outro lado eu acho que posso lhe ajudar nessa história de melhorar de vida, de ganhar dinheiro.
- Pode? – Ciça arregalava os olhos como a esperar a revelação da boca de sinhazinha.
- Vou lhe ensinar a ler e escrever. Todos os dias da semana, de segunda a sexta, durante uma hora teremos aula. Pode ser na cozinha ou na varanda do meu quarto. Isso eu posso fazer. Eu só preciso pedir permissão à mamãe.
- Vige! Dona Inês vai me mandar embora se a senhorinha começar com essa conversa de me ensinar a ler.
- Eu sei como convencer minha mãe Ciça. Com o que eu vou te ensinar você vai ver que palavras podem ser usadas como grandes argumentos para se ganhar uma batalha.
- Uma batalha? Mas eu não quero que sinhazinha brigue por minha causa.
- Fique calma Ciça. Deixe isso por minha conta, está bem? Agora vamos levantar e nos preparar para descer no próximo ponto.
- Sim sinhazinha.
- Ainda temos que andar um bom pedaço. – completou Egydinha.
No Ateliê da Costureira
Egydia experimentou o vestido de noivado na Madame Tedesco e aproveitou para ir até o Convento da Ajuda para comprar doces com as monjas. Ela adorava as mães-bentas, o seu preferido.
Quando estava recebendo os doces o barulho de tropa cavalariça veio aos seus ouvidos. Ela se virou e observou os soldados passarem devagar, um atrás do outro. Um deles retirou a boina e a cumprimentou com um lindo sorriso. Ela retribuiu o sorriso e ao ver as lindas covinhas de Egydia o soldado se animou e disse.
- Bela! Bela!
- Bela o que soldado? - gritou uma voz mais a frente.
- Bela Cidade Capitão!
- Silêncio!- gritou o Capitão.
Egydinha e Ciça riram da situação do soldado, que quis fazer um gracejo para Egydinha e quase ficava a pé como castigo.
Depois que a tropa passou, Ciça comentou:
- Bonito soldado!
- É bonito sim, mas provavelmente não o veremos mais.
- Eles sempre passam por aqui essa hora sinhazinha, isso já me contaram lá no terreiro.
- É... Mas eu não estou interessada Ciça, esqueceu que estou quase noiva?
Como Ciça nada respondesse, Egydinha completou.
- Vamos indo, precisamos chegar antes que meu pai.
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Egydinha
RomantikA história se passa no Rio de Janeiro no início do século XX. Com apenas dezessete anos, uma jovem é obrigada pelo pai a ficar noiva de um homem estrangeiro rico que veio trabalhar numa indústria no Brasil. Os negócios da família vão mal e ela sofr...