- Kevin! Kevin! Kevin! - Alguém gritou enquanto me chacoalhava na cama.
- Mas que merda. - Limpei os olhos. - O que foi, Hank?
- Sally e Sarah sumiram. - Disse ele desesperado.
A cabana estava completamente vazia, com excessão de nós dois. Ethan entrou arrombando a porta e quase a quebrou.
- Alguma notícia, Hank?
- Não. Nada. - Respondeu ele. - Achou alguma coisa?
- O mesmo que você, nada.
Tirei as cobertas de cima de mim e apoiei as costas na cabeceira.
- Me digam pelo amor de Deus o que está acontecendo.
- O que está acontecendo é que Sally e Sarah sumiram. - Hank estava desesperado e com as mãos na cabeça. Ethan parecia estar com raiva, mas não só pelo desaparecimento das duas.
- Vamos! - Ordenou ele em alto e bom tom. - Ficar aqui não vai fazer ninguém aparecer magicamente.
Tive que abandonar o sossego da cabana. O dia estava quente e estava o maior furdúncio lá fora. Alguns corriam para um lado e outro, como se fossem ajudar em algo. Wind estava dando ordens a alguns arqueiros, pelo o que ouvi, os mandou subir as colinas atrás das duas. Sandra analisava a beira do rio no qual eu e Chloe treinávamos na noite passado. Caramba, onde estava Chloe em meio a tudo isso? E Nina? Se Sally e Sarah haviam desaparecido, talvez elas... não, era melhor não pensar nisso.
- Certo. Alguém, por favor, pode me explicar a situação? - Não hesitei em falar mesmo na frente de Wind.
- Essa é a situação. - Ethan se agachou e arrastou o dedo no barro, junto com ele, veio sangue já não tão fresco.
- Isso é de alguma das duas? - Perguntei preocupado.
- Provavelmente. - Respondeu Ethan. - Não é você que tem o faro de um lobo? Deveria saber.
Sinceramente, eu não entendia a personalidade dele. Na primeira vez que o vi, ele demonstrou ser um cara legal. No outro dia, já estava com a cabeça em outro lugar. E hoje, parecia aborrecido, particularmente comigo.
- Tá tudo bem, cara?
- E isso importa? - Respondeu ríspido.
- Para mim, importa.
- Tanto faz, Kevin. - Ele virou a cara.
- Com faro, ou sem faro, esse sangue não é de nenhuma das duas. Bom... - Hesitei um pouco em falar. - É meu.
- Como assim é seu? - Hank parecia incrédulo.
- Eu estava treinando aqui, ontem, à noite. Com Chloe.
- Claro. - Murmurou Ethan.
- Ela me cortou com a espada. - Prossegui. - Mas olha, eu conheço o cheiro daquelas duas. Adquiri esse poder ontem, mas já estou me acostumando. Olha só: Hank, você não toma banho há 2 dias.
- Ei! - Protestou ele.
- Não precisa de poderes para saber disso. - A voz de Chloe pairou atrás de nós. - Procurei pela floresta da Fogueira Central, nada delas.
- Oi, Chloe. - Disse eu meio sem jeito com toda aquela situação.
- Oi, Kevin. - Respondeu ela rapidamente.
Uma figura tremulou mais à frente de Ethan. Uma névoa azul envolvida em areia se formava e todos ficaram atentos a ela. Então a forma se revelou humana, ou pelo menos era o que eu achava. Tinha cabelos grisalhos, um rosto rígido e com cicatrizes. Suas roupas eram longas, armado com uma foice nas costas e um sorriso estampava sua cara.
- Um Azul! - Gritou Chloe e todos nós nos armamos.
Chloe sacou duas adagas de seu coldre e segurou cada qual em uma mão. Ethan se afastou dele, se aproximando mais de nós enquanto armava uma flecha no arco. Hank foi um pouco mais lento, mas enfim puxou seu facão. E finalmente, Longinus surgiu em minhas mãos.
Wind correu para nos impedir de qualquer ação tola.
- Não ataquem! - Gritou ele se posicionando em nossa frente.
- Mas Wind, é um Azul. - Protestou Chloe.
- Sim. - O Dragão Amarelo assentiu com a cabeça olhando para Chloe. - Mas ao mesmo tempo, não. É apenas um clone. Uma mensagem. Não pode nos ferir. Assim como nós não podemos ferí-lo.
Ethan disparou uma flecha no olho do homem. Ela atravessou seu corpo e foi parar em uma árvore distante. Um buraco se fez em seu olho e ali descobrimos que ele era feito por areia - especificamente azul. Logo então, foi se fechando aos poucos.
- É. Tem razão. - Mesmo aceitando o fato, não teve confiança em guardar seu arco.
- Esse é Ethan Hall? - O homem riu com satisfação. - Que temperamental você, garoto. Vamos, abaixem essas armas. Estou aqui pela paz.
- Hajick. -Wind rangeu os dentes e tive medo de que fumaça saísse por suas narinas. - Você fala de paz, mas assim como todos os Azuis, promove guerra.
- Ora, meu velho amigo Wind. - Ele estendeu os braços como se quisesse um abraço de Wind. - Não seja tão ignorante. Nós fazemos o que precisa ser feito. Vocês querem se impor a nós...
- Não! - Wind o interrompeu em grito. - Vocês querem se impor aos humanos. Nasceram da escuridão, mas podem provar que são melhores que isso.
- Sempre essas mesmas baboseiras. Até quando vai se esconder da realidade? Somos o que somos e fazemos o que fazemos. Não há mudança, não para nós.
Aquela conversa estava parecendo mais uma briga de velhos amigos. Mas aquele era um Azul, uma força nascida da escuridão. Como aquilo era possível? Mesmo com os avisos de que aquele homem não podia nos atacar, não deixei minha espada se esvair em sua areia vermelha. Além do mais, ninguém havia se desarmado até ali.
- E por que está aqui? - Wind finalmente fez essa pergunta.
- Vocês são tão ingenuos que foi preciso um de nós vir até aqui. Se preocuparam tanto com um rio, que esqueceram de outro.
- O que quer dizer com isso? - Chloe apontou a adaga para o clone.
- Conhecem tão bem seu acampamento que se preocuparam apenas com um objetivo. Mataram nossos monstros e pensaram que estava tudo bem. Mas esqueceram que aqui há mais que só uma fonte nascente de água. Era só o que precisávamos, um espetáculo de vocês para servir de distração. Enquanto lutavam bravamente contra os homens crocodilo, outro grupo se dedicou a algo... bem mais complexo: Duplo sequestro.
Hank quis avançar contra o clone mas o segurei.
- Espera. - Sussurrei para Hank. - Talvez ele nos dê mais informações.
- Vejam só! O Lobo até que é esperto. - O tal Hajick zombou. - Pensei que se limitava apenas a musculos.
- Há outro rio aqui? - Perguntei a Wind.
Ele baixou a cabeça como se um sentimento de culpa passasse por ele.
- Sim.
Hajick riu, logo após tossiu.
- Acho que meu clone já está morrendo. Nos veremos por aí. E claro, como poderia esquecer? Meus mestres deram um prazo bem pequeno para as gêmeas. Elas estão sendo levadas junto com a Lámina da Ressurreição... Então é melhor que se apressem.
Hank correu até o clone e acertou um golpe com o facão. No mesmo instante ele se desfez naquela areia azulada e Hank estava com sua enorme faca enterrada no chão.
- Temos que ir atrás dele. - Afirmei.
Wind já estava bem menos agitado do que qualquer outro ali.
- Esquece, Kevin. Não tem como alcançá-lo. E mesmo que consiguisse, morreria nas mãos dele. Vocês tem que partir. Rápido.
Chloe e Ethan foram ao arsenal que até então era desconhecido por mim. Mas pelas histórias, lá havia mais de mil armas de guerra. Ou talvez fosse apenas boatos. Não importava, agora eu tinha Longinus. Parei pra pensar se Jason chegou a usá-la. Jason... Seu nome não parava de martelar em minha cabeça. Novamente, o Lobo Vermelho estava para sair em uma missão com três parceiros, da mesma maneira que ele anteriormente. Eu nunca irei entender seus motivos, mas não creio que exista um para trair seus amigos e matá-los. Em pouco menos de dois dias a missão mudou totalmente de rumo, antes pensávamos que seria apenas achar aquela espada que ressucita monstros. Como era mesmo o nome, hein, Cassie? Lámina da Ressurreição? Ah, certo. É que as vezes eu esqueço. Ela sabe da história melhor que eu. Enfim, até então havia o enfraquecimento das águas do Tubarão Branco, que deixava o acampamento totalmente vunerável pelos dois rios e também havia o sequestro de Sally e Sarah.
Eu estava sozinho na cabana. Não tinha muito bem o que preparar para a missão. Todas as minhas roupas ficaram em Londres e possivelmente foram destruidas. Eu precisava de um banho naquele momento. Só então avistei uma toalha na cabeceira da minha cama. Como eu não havia visto aquilo antes? Talvez eu estivesse cansado demais para reparar na cabeceira toda vez que desabasse na cama para dormir. Entretanto, a toalha era vermelha e nela tinha escrito meu nome. Ou melhor, meu nome havia sido bordado nela. A segurei com as mãos e me perguntei quem havia feito aquilo. Hank entrou cabisbaixo pela nossa única porta.
- Ei, cara. - O chamei em um tom mais calmo. - Nós vamos encontrá-las.
- Eu poderia ajudar. - Ele se sentou em sua cama com as mãos na cabeça. - Por favor, me leva junto para essa missão.
Admito que aquilo doeu no meu coração. Eu demorei para perceber mas ele tinha um carinho especial pela Sally. Seu comportamente perto dela até mudava. E sem dúvida alguma, ele era o que mais estava abalado com o rapto dela. Eu sabia disso, mas eu já havia escolhido meu parceiro. Ou melhor, minha parceira.
- Desculpa, Hank. Você sabe o quanto gosto de você, cara. Mas eu já dei esperanças a outra pessoa de ver o lado de fora.
- Ah, claro. A curandeira. - Disse ele ríspido. - Espero que ela seja de boa ajuda em batalha.
- Você não sabe que não é por isso. - Falei calmamente. - Eu só quero que ela possa sair ao menos uma vez daqui.
- Está arriscando uma missão porque está apaixonadinho por ela e quer fazer algo bom para a tal. Mas poderia fazer algo bom para todo o acampamento. Poderia levar alguém que aguentasse ao menos o peso de uma espada.
Talvez ele estivesse certo. Mas eu era um cara de palavra. Eu disse a ela que a levaria para o lado de fora. E era isso que eu faria. Passei por Hank e fui em direção à porta. Já estava pronto para sair dali.
- Eu vou trazer Sally e Sarah de volta. Com Nina, sem Nina. Com uma equipe, ou até mesmo sozinho. Mas eu prometo que até o fim dessa semana, você as verá dormindo novamente nessas camas.
- Não prometa aquilo que não pode cumprir. - Disse ele ainda aborrecido.
- Em Londres, eu não pude salvar uma certa pessoa. Mas elas... elas serão salvas.O tempo foi passando, o sol se pondo, a noite chegando. Algumas horas depois eu estaria embarcando em uma missão. Há dois dias atrás eu era apenas um adolescente normal de Londres, nem tão normal. Não tinha amigos; apenas uma mãe para cuidar de mim e ainda fazia questão de ser um intrometido, tanto que lutei com meu vizinho para que ele não esfaqueasse sua mulher. O lado bom é que me adapto facilmente com coisas novas e talvez por isso estivésse pronto para a missão. Já o lado ruim é que me adapto facilmente com coisas novas e sempre é difícil deixá-las para trás.
Sandra havia chamado a mim e Ethan para sua cabana. No caminho senti necessidade de falar com ele sobre um assunto nada confortável.- Ethan. Eu sei o que houve hoje mais cedo.
- Tá falando do quê?
- Qual é, cara. Eu sou burro, mas não idiota. Tá, talvez um pouco dos dois, mas não importa. Só quero que saiba que eu e Chloe somos apenas amigos. Eu não tenho nenhuma outra itenção com ela e...
- Pode ir parando por aí. - Ele colocou a mão sobre meu peito. - Por que acha que estou com ciúmes?
- Porque eu passei por isso no colégio.
- Era ciumento?
- Não. O namorado de uma amiga minha sentia ciúmes dela comigo.
- Pensei que não tivesse amigos.
- Não muitos. - Suspirei. - Acredita em mim?
Ele fez uma cara de quem estava pensando na resposta.
- É. Acredito. - E sorriu.
- Muito bem, passarinho. - Lhe empurrei na brincadeira.
- Ah, não. Você não me chamou de passarinho. - Ele disse com repugnância.
- O que vai fazer? Tacar seu bico na minha cabeça?
- Corra antes que eu acerte uma flechada na sua bunda.
Nós rimos.
- Isso não é contra as regras?
Chegamos na cabana de Sandra. Era um pouco menor que a de Wind, mas era bem mais arrumada e caramba, quanta menina bonita ali. Não que eu tivesse reparado, foi Ethan, claro. Ou melhor, só tinha meninas naquela cabana.
- Até que enfim chegaram! - Sandra nos assustou.
- Ai, Deus. Não nos assuste assim.
- Desculpa, amores. - Eu sei. Isso foi estranho.
Mas o mais estranho veio quando ela nos abraçou.
- Tenho roupas novas para vocês. - Ela parecia mais que animada. - É uma réplica perfeita da qual Kirish e Hanna usavam.
Então eu entendi. Kirish havia sido o Lobo original e Hanna a Águia. Há centenas de anos. Wind e Sandra conviveram com eles por séculos e um dia eles se foram. Agora era como se nós fossemos eles. E para Sandra, era como se cuidasse dos seus antigos amigos de novo.
- Que legal! - Falei porque Ethan não conseguia dizer nada. - Posso ver?
- Claro. - Ela abriu o guarda-roupas. - Aqui está a sua.
Ela colocou o traje sobre sua cama. Uma calça preta com listras vermelhas; já no tronco uma armadura vermelha, parecia ser leve, não cobria meus ombros, apenas do peito até o fim de meu abdome e se passaria facilmente como uma roupa normal; um tecido revertido em ferro e em forma de camiseta regata, no qual ficaria debaixo da leve armadura; um par de luvas marrons de couro.
- Sandra. Isso é demais. Muito obrigado, sério mesmo.
- Que fofo, você. - Fez uma pausa. - Ethan.
- Senhora? - Ele virou o rosto rapidamente para ela porque estava distraído com outra garota.
- Não entendo como tem ciúmes da Chloe se vive olhando para outras garotas. - Murmurei.
- Cala a boca, Watson. - Devolveu ele.
- Venha cá, Ethan. - Sandra chamou.
Ela então puxou a roupa de Ethan do guarda-roupas. Parecia mais um collant preto, como os de Super-Herói; junto com um capuz de listras azuis; as luvas de Ethan também eram de couro, entretanto eram longas e se estendiam até o meio de seu antebraço.
- Sandra. - Ethan Falou. - Por que me marcou com a cor do inimigo?
Eu ri.
- Imaginei que não gostasse de dourado. - Respondeu Sandra. - Nem Hanna gostava e ela era a Águia Dourada.
- Mas por que logo a cor do inimigo?
Ri novamente.
- Esquece, Ethan. - Resolvi falar. - Não vou te atacar por engano.
- Espero. - Disse ele.
ETHAN HALL, CHLOE BLANCHE, KEVIN WATSON E NINA. VÃO PARA A SAIDA DO ACAMPAMENTO E SE DESPESSAM DELE, HORA DE SAIREM PARA A MISSÃO.
E essa foi a primeira vez que o cara do holofote não nos chamou de alguma coisa estranha.
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A Sexta Irmandade (Vol.1) - O Lobo Vermelho
AdventureE assim nasce o primeiro dos sete heróis.