CAPÍTULO 12 - Segunda chance

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Ethan puxou da aljava uma flecha diferente: menor e bem menos pontuda.
- Eu vou ter que apagar os policiais. - Disse ele como se estivésse tentando convencer a si mesmo.
- Tá de brincadeira, né?
- Queria estar. Mas fica tranquilo. São flechas soníferas, elas não penetram tanto e possivelmente colocam até um boi pra dormir. Que no caso, espero que não seja necessário.
- Não tem outra maneira? - Perguntei. Não queria arriscar a vida daqueles homens.
- Sim. Ela se chama: Fugir para a casa da Liz.
- Idiota. - Murmurei
- É simples, cara. Elas só irão colar no pescoço deles e abrir pequenos furos, por eles entrarão uma toxina sonífera feita através de ervas.
- Meu Deus. Quem fez isso pra você? - Ri ao imaginar quem seria louco para contribuir nas ideias de Ethan.
- Sua curandeira preferida. - Ele sorriu de canto.
- Duvido que ela tenha contribuído com isso.
- Depois de vê-la irritada hoje, ainda duvida de algo diferente dela?
E como na maioria das vezes, não entendi o que Ethan queria dizer.
- Eu vi que ela estava irritada. Mas não entendi o porquê.
Ethan riu de mim como se eu fosse uma criança mais nova. Que no caso, não sabia se isso era verdade pois nunca havia perguntado sua idade.
- Ciúmes, cara. Ciúmes.
- Não. - Ri e até desconcentrei um pouco da missão. - Nina não é de sentir essas coisas. Não pelo pouco que sei dela.
- Hã-ham. É que nos meus 7 anos de acampamento nunca a vi daquele jeito.
- Liz é uma estranha pra ela. Isso explica mais do que sua teoria de ciúmes.
Ethan armou uma flecha e pôs o arco na altura de seus ombros.
- É. Talvez.
Ele a disparou, ela fez uma curva com a ajuda do vento e seguiu até onde meus olhos não podiam mais enxergar. Entretanto, eu sabia que ele podia.
- Até onde isso foi? - Perguntei preocupado.
- Até o último policial dessa área. Agora vamos. Temos uma passagem até a " cena do crime". - Movimentou os dedos para simular as aspas.
Nos movimentamos pelos flancos. Como Ethan havia dito, a policia tentava conter muita gente que queria passar pra dentro da fita amarela, tornando assim nossa passagem por trás algo mais tranquilo. Estava tudo indo bem, mas ao virarmos por um beco nos demos de cara com um policial. Em um movimento desesperado Ethan se escondeu atrás de uma lata de lixo. O oficial não o viu mas já estava com os olhos em mim. Fixou seu olhar e soltou a seguinte frase:
- Eu conheço você.
- Merda! Merda! Merda! - Ethan sussurrou escondido.
- É... - Cocei minha cabeça sem saber o que fazer ou falar. - Talvez tenha me visto na tevê.
Não sei aonde eu tava com a cabeça pra falar aquilo.
- Desculpe. Mas não lembro de você lá.
Pensei, pensei e pensei. Então a melhor resposta veio.
- Sou jogador de rugby. Time de Londres.
- Pelo seu tamanho e pelo seus musculos... - Ele me analisou. - Talvez seja mesmo.
Certo. Eu poderia tê-lo enganado mas o que eu falaria para poder passar?
- Está vendo esse meu amigo aqui? - Ele perguntou e saiu da frente de um corpo. Era o corpo caído no qual Ethan havia acertado a flecha. Droga, Ethan. - Ele foi acertado por uma flecha no pescoço, coisa que não é muito normal aqui em Londres. Ele não está morto. - Como se eu não soubesse. - Mas de qualquer maneira, isso é muito estranho. Uma flecha lhe colocou pra dormir. Ela não era nada afiada mas... e se fosse? Sabe de algo? Não têm nada a ver com isso, não é?
Foram as únicas três perguntas que um policial fez pra mim na minha vida, mas sem dúvida alguma, as piores.
- Claro que não, Sr. Policial.
Ele me analisou novamente. Graças a Deus eu estava com a jaqueta cobrindo minha armadura de peito e minha espada só apareceria no momento em que eu quisesse.
- Certo, então.
Ele pareceu não acreditar mas se virou para olhar como seu amigo caído estava. Nesse momento Ethan saiu de seu esconderijo e disparou outra flecha sonífera, mas dessa vez no policial que me "interrogava" . Ele desabou em cima da outra vítima de Ethan.
- Tá louco, cara? Ele viu meu rosto.
- Por isso mesmo eu o botei pra dormir. O que mais a gente podia fazer?
- É. Tá certo.
Nós seguimos escondidos por trás de alguns carros destruídos. Fomos rápidos e sigilosos. Do outro lado tinha no mínimo uns vinte policiais, nada que nos ajudasse no momento.
- Ethan! - Ordenei que ele parasse.
- O que foi? Eles virão pra cá logo. Precisamos achar alguma coisa, uma evidência, qualquer merda que nos leve até os Azuis.
- Espera! - Acabei gritando. - Eu sinto cheiro de sangue, eu sei que houve muita gente morta aqui mas... mas é sangue fresco, misturado com areia. Tem alguém aqui. - Flexionei as narinas. - Embaixo. Está embaixo.
Corri até uma pilha de escombros. Eles estavam da altura de uma casa e quanto mais eu me aproximava, mais o cheiro de sangue eu sentia.
- Acha que tem alguém enterrado? - Ethan rapidamente guardou seu arco nas costas.
- O cheiro vem daí. Vamos!
Não sei o que me motivou a ter tanta força para desenterrar escombros maiores que meu próprio corpo, mas eu não deixaria mais alguém morrer, não no meu bairro.
- Vamos, porra! - Ethan gritou e juntos levantamos a pedra mais enorme que eu havia visto na minha vida.
A recompensa veio em forma de um garoto abrindo os olhos e sentindo a luz do sol tocar seu rosto após tanto tempo preso na escuridão de escombros.
- Oh, meu Deus. - Puxei ele e o agarrei para sustentar seu corpo.
- É. - Ethan estava com a respiração ofegante. - Você estava certo.
Segurando em meus ombros, ele fraquejou. Devia ter uns 10 anos, não dava pra saber. Seu corpo estava completamente sujo de terra e um ferimento aberto em sua testa fazia jorrar um pouco de sangue.
- Obrigado. Eu pensei que ia... - Chorou. - Eu pensei que ia morrer.
- Não. Não vai, não. - Tentei lhe acalmar.
- Ei, garoto. - Ethan passou a mão em sua cabeça. - Agora eu irei gritar para os meus amigos policiais, quando eles chegarem aqui, quero que diga a eles que os oficiais Patrick Willer e Taylor Jones salvaram você. Vamos lá, dê a nós um aumento.
Ele balançou a cabeça assustado.
- Faça isso, por favor. - Insistiu Ethan, mas sem pressionar o menino. - Agora eu vou gritar, certo? Não se assuste. - Ethan puxou o fôlego. - EI! TEM UM MENINO PRESO AQUI!
De longe pude sentir o odor dos policiais vindo em corrida até nós.
- Vamos, Kevin. - Ordenou Ethan.
- Obrigada. - O garotou falou com uma voz tão fofa que nos impediu de correr.
Sorri para ele.
- De nada.
Corremos e escalamos a casa mais próxima. De lá conseguimos avistar os policiais chegando no menino.
- Ethan. Quem são Patrick Willer e Taylor Jones?
- Os policiais que apaguei. Eu olhei os crachás. Ninguém merece levar uma flechada na nuca e não receber um aumento.
Sorri pela atitude de Ethan.
- Justo.
- Não conseguimos nenhuma pista.
- É. Mas salvamos uma vida.
- Sim. Salvamos sim. - Dei um soco leve em seu braço. Bom, nem tão leve quanto uma pessoa normal.
- Vamos para a casa da Liz? - Ethan pareceu mais animado que eu.
- É. Vamos.

Saltando de telhado em telhado, já tinhamos cruzado metade do caminho. Admito que houve uma corrida involuntária enquanto corríamos. Ethan estava vencendo, até que parou de correr.
- O que foi? - Perguntei cansado.
- Hajick. - Ethan rangeu os dentes.
Até onde eu lembrava Hajick era o Azul que tinha mandado um clone pro acampamento. Se aquele cara estivésse ali, eu tinha certeza de que nós teríamos problemas.
- Acho que Liz terá que nos esperar. - Suspirei.
- Vamos!
Essa é a pior parte de andar com alguém que tem super visão: ele vai ver algo à quilômetros de distância e lhé obrigará a correr até lá com ele. E assim foi feito. Eu não sabia para onde estávamos indo mas era pra bem longe de Liz. Pulamos ao solo novamente, já estava cansado de telhados. Se aproximava das 9 da manhã e lá estávamos nós, correndo atrás de alguém que eu nem podia ver daquela distância. Ao se aproximar de uma casa estranha, Ethan pareceu mais motivado a correr, tanto que arrombou sua porta com um chute. Graças a Deus aquela rua não tinha muito movimento, a da Liz tinha, mas estávamos longe de lá agora. Ao adentrar a casa, nós dois subimos as escadas e fomos até a parte de cima. Ouvi uma voz feminina aos berros. Uma mulher clamava por ajuda, quem era e por que gritava, eu não sabia. Os gritos se tornaram mais agudos e próximos. Enfim chegamos à origem deles. Uma mulher sentada no chão encostada na parede. Ela chorava de medo e seu cabelo estava todo assanhado. De pé na sua frente, Hajick.
- Oh, meu docinho. Por que parar agora? Não vai me dizer que a presença deles a incomoda, não é? - Apontou para nós com o polegar.
Não pude acreditar. Hajick estava fazendo mesmo o que eu estava pensando. Eu era um cara bom, não me gabando, mas há alguns dias atrás eu não teria coragem de matar alguém. Mas hoje... até onde poderia ir o limite da minha bondade?
- Por favor, me ajudem! - A mulher chorava. Não como o menino que haviamos salvo hoje mais cedo, aquele era um choro de alívio. Esse era um choro de desespero.
Ethan não pensou duas vezes e disparou uma flecha em Hajick. Ele a segurou como se fosse um aviãozinho de papel.
Ethan não desistiu e disparou mais flechas em sequência. Hajick se esquivou com facilidade de muitas e agarrou a última ainda no ar.
- Esperava mais da Águia do Vento. Pelo menos a verdadeira, Hanna... ai, o que posso falar da Hanna? Seu corpo era tão...
- Cala a boca! - Ethan disparou uma flecha para o lado direito. Ela fez uma curva e foi em direção a Hajick.
- O truque do vento não irá me enganar. Mas admito que é um bom truque, mesmo pegando apenas os novatos. E sabemos, Ethan, que nesse ramo de matar, somos veteranos. - Ele soltou uma risada debochante para Ethan. Parou de rir, olhou para a mulher sentada em prantos e acariciou seu rosto. - Oh, meu docinho. Não chore mais, já voltarei para cuidar de você.
- Chega! - Longinus surgiu e eu avancei para atacá-lo.
Ele nem se moveu. Como se soubesse que meu ataque não teria sucesso. E realmente não teve. Ele desapareceu, da mesma maneira que seu clone fez no acampamento.
- Apareça, covarde!
- Cuidado com o que deseja. - A origem de sua voz era indentificável. Assim como a de Aurora quando na floresta. Mas então, ela desapareceu.
Me agachei próximo a mulher.
- Vai ficar tudo bem. Ele vai pagar pelo o que fez.
- Por favor, me tira daqui. - Ela ainda chorava com medo.
- Certo. - Apenas com um olhar pedi para que Ethan chegasse até nós. - Não deixa ele encostar nela.
- Posso ficar aqui. Se ele voltar, não deixarei isso acontecer. E você, o que fará?
- Irei atrás dele.
Ethan me segurou pelo ombro.
- Sozinho?
- Não. - Tirei do bolso algo que Wind havia me dado ainda no acampamento. Aquele cristal branco de tamanho mediano. Alguma coisa me fez lembrar daquilo, mesmo o momento sendo completamente inoportuno. - Eu tenho isso.
- A Pedra da Segunda Chance. - Ethan parecia impressionado e assustado ao mesmo tempo.
- É um belo nome. Mas o que eu faço com ela?
Ethan sorriu.
- Tenha sua segunda chance.
Não entendi muito bem o que ele queria dizer mas não havia tempo pra explicações. Eu tinha que ir buscar Hajick.
- Tenta não morrer. - Ethan deu seu último aviso.

A Sexta Irmandade (Vol.1) - O Lobo Vermelho Onde histórias criam vida. Descubra agora