Capítulo 6 - Rebeca

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            Permaneci alguns instantes imaginando o encontro daqueles jovens encantadores, meus avós, como parecia ser divertido esse bailes anuais de primavera de seu tempo... Eu sempre fui uma eterna apaixonada por romances de época, pelos famosos anos dourados, décadas de 50,60,70,80 era difícil escolher a minha preferida. Mas sei que em todas elas era possível viver um grande amor, algo apaixonante, que te consome e devora de um jeito bom, claro que existiam  ilusões, desilusões, traições, enfim, mas o amor tinha uma força maior, simplesmente porque as pessoas acreditavam nele.

   Corpos colados com respirações tão ofegantes que se misturam e se transformam em uma só, em vez de um namoro virtual, a base de mensagens e milhões de corações que são fáceis de se mandar e possíveis de serem mandados para qualquer um, a maioria das pessoas hoje em dia possuem uma vida virtual do que vivem a própria vida longe de aparelhos digitais. Por isso sempre senti a repulsa de vovô por aparelhos eletrônicos e a tecnologia... Suga toda a graça de uma boa conversa pessoalmente com uma cerveja e um jogo de tabuleiro. '' Amor '' virtual, assim, não dura, não evolui, não tem sustento, nem base, uma hora ou outra caí no esquecimento. Já paixão, adrenalina, amor vivido na vida real te marca, consome, e o principal, amadurece, te transforma pra sempre, algo que encontro facilmente nas páginas que leio, emoção...

- Você se parece com ela.

  Vovô me despertou de meus pensamentos voltando a desencaixotar seus livros.

- O senhor acha ?

    Minha avó era uma mulher brilhante sem dúvidas era um elogio e tanto ouvir de vovô que eu me parecia com ela, não que eu concordasse, não achava que tivesse tanta atitude quanto ela esbanjava, na verdade me sentia apenas uma garota  tentando descobrir seu lugar no mundo, como todo mundo.

- Vovô parou um instante de revirar seus livros e me encarou com o rosto brando, calmo, mas seu olhar parecia estar indo muito além de mim, quase desvendando a minha alma.

- Você é uma garota incrível Rebeca, mas ainda não se deu conta disso, você é serena e sua alma é tão pura que faz com que transborde um brilho único, você não nasceu para viver aqui, e no fundo sabe disso, a sua essência quer que você se descubra em outros lugares. Tem uma personalidade única, como sua avó tinha, aonde você esta é impossível existir preto e branco. Você nasceu para comandar sua vida, e não deixar ela comandar você como quiser. É um novo ano Rebeca. Permita- se experimentar coisas novas. Cresça, amadureça, não pelos outros, mas por você mesma, não tenha medo de viver.

   Eu ouvi as palavras de vovô em silêncio, refletindo sobre cada uma delas, e como se encaixavam na minha vida. Vovô estava certo, sempre suspeitei que ele me conhecia até mais que eu mesma.

Vovô era um observador e sem dúvida um homem muito sábio.

- Obrigada vovô !

   Apertei a mão dele sorrindo agradecida. Ele sempre sabia exatamente o que fazer para me encorajar.

- Vou falar com eles vovô... Sobre a faculdade, cansei de me questionar, não consigo nem gostar de me imaginar trabalhando junto com meu pai a vida toda em algo que ele sonhou pra mim, não eu.

- Tem certeza Rebeca ? Sabe como ele vai ficar.

Tinha quase certeza de vovô estava me testando com a pergunta, por mais que fosse verdade, eu sabia exatamente como ele ia ficar.

- Não posso passar a minha vida toda fazendo tudo que eles sonharam pra mim. O teatro, as aulas extras de artes, a faculdade de direito... Tudo passa tão rápido, sabe que a última coisa que eu quero é decepciona-los, mas...

Vovô me interrompeu sorrindo orgulhoso como se eu tivesse dito exatamente o que ele queria ouvir.

- Sabe que a única coisa que eles mais querem é te ver feliz, não sabe ?

Talvez eu nunca tenha pensado por esse lado, parei para refletir um pouco e vovô tinha razão, eles iam me entender, tinham que me entender...

- Sei vovô. Não aguento mais o estágio que meu pai conseguiu, não sendo ingrata, mas eu ainda nem prestei o vestibular e não aguento mais passar horas dentro daquele escritório gelado lendo e relendo contratos, atendendo telefonemas o tempo todo... Tá na hora de seu ser a dona da minha vida.

- Gosto te ver falando assim mas você sabe que mesma desistindo da faculdade de direito e procurando fazer o que gosta, haverá dificuldades.

Suspirei.

- É a lei da ação e da reação não é ? sempre haverá uma consequência, sabia disso quando terminei com André... Mas essa é a graça da vida, nos fazer escolher o caminho sem ter a mínima ideia do que vai acontecer depois. Nem tudo é dor e sofrimento, algumas vezes coisas se vão, para que melhores possam vir.

Vovô sorriu.

- Estou orgulhoso de você Rebeca, assim como tenho toda certeza que sua avó também estaria.

   Sorri olhando para os livros do vovô, e no silêncio que se iniciou eu só consegui perceber o quanto sentia a falta dela, apesar de não doer tanto como antes, ainda doía muito.

   Comecei a ajuda-lo a desencaixotar os livros, eram muitos e eu duvidava que desse conta sozinho, apesar de que vovô sempre me surpreendia.

- Sinto falta dela.

Vovô sorriu, um sorriso saudoso, abrindo mais uma caixa.

- Eu também.

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