A QUIMERA DE STELLA NERA

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Agora estou em Arezzo, antigo sítio do extinto povo etrusco. Não tenho ideia por onde começar, as paredes das ruas por onde tenho passado estão perfeitamente limpas, não vejo nenhum grafite, nenhuma pichação, escreverei o que me vier à cabeça e enviarei para a revista.

Estou a procura de um exemplar da arte etrusca que tenha registrado a transição da cultura primitiva
visual sintética, para a cultura arcaica visual analítica.

Este lugar vem sendo habitado desde a era paleolítica.

Estou passando pelo Anfiteatro Romano quando vejo, em uma de suas paredes, algo que chamarei de "grafite adesivo" por se tratar dessas películas plásticas que se usa atualmente para fazer anúncios publicitários, letreiros de casas comercias, etc. Nesse mural pode se ver o retrato fotográfico da Quimera de Arezzo*retocado com pinceladas de tinta "selvagemente aplicadas" como se o artista tivesse agredido a quimera diversas vezes com o pincel.

Me chamou particularmente a atenção a assinatura do artista. A sua assinatura consiste em uma foto sem retoque daquela estrela de oito pontas do quadro de Miró, de que tanto já falei. Abaixo dessa assinatura visual, vem a sua assinatura verbal: Stella Nera.

Essa estrela é um elemento visual "neo arcaico", logo é um signo visual analítico. O estilo "visual" da Quimera de Arezzo pode ser considerado sintético-analítico, logo encontrei o que estava procurando.

Fico parado admirando a quimera e imaginando que um animal como esse, com corpo de leão, uma cabeça de bode nas costas e uma cauda que é uma serpente, poderia ter existido realmente.

Aquilo que a natureza criou ao acaso, a engenharia genética poderia fazer em laboratório.

Tirei fotos do mural e enviei para a revista. Estava começando à merecer o meu salário.

Além de está em Arezzo por motivo de trabalho, não posso esquecer também que tenho um vínculo de sangue com este chão, Arezzo foi o berço da família Cavalcanti, daqui, eles migraram para Firenze.

Retiro do bolso a carteira com a bala que é meu passaporte para o outro mundo. Num ato reflexo tate-i-o a cintura a procura de uma arma que não está lá. Volto a guardar a carteira no bolso.

Volto à me concentrar em meu trabalho, quero conhecer a identidade dos turistas mortos naquele "acidente". Liguei a Internet móvel e felizmente consegui um sinal. Pesquisei noticias da época e finalmente fiquei sabendo que eram da Turquia.

Não consegui os nomes deles mas sei que o sobrenome Iri ocorre com maior frequência na Turquia.

É puro palpite, mas desconfio que o marquês tem uma colherada de sangue turco nas veias. Só tem uma maneira de confirmar as minhas suspeitas de que o marquês não só é um turco meio sangue, como também é primo distante dos dois turcos que morreram, e que tomou parte no assassinato deles, é fazer essas perguntas ao próprio Carlo e esperar para que diga a verdade.

Não farei essas perguntas. Enviarei para sua caixa postal que encontrei dois turcos primos seus em Pisa, e esperarei pela sua reação. Se minha suposição estiver certa ele vai responder a mensagem.

Estendo a pesquisa para conhecer quem é Stella Nera, que pelo nome deve ser mulher, e ficar conhecendo suas obras.

Fiquei sabendo pelo Google Imagens tudo que queria saber sobre Stella Nera, que seu nome verdadeiro é Eme Iri di Menenia, que a crítica especializada, a considera um novo genio da street art, que ela tem seus murais de película expostos em diversos edifício medievais, e mais antigos ainda, espalhados pela Toscana.

O seu trabalho mais notável é uma releitura do Tottomondo. A artista se fotografou despida, nas posições das figuras multicoloridas que se espalham sem ordem naquele estranho mural. Em seguida, pintou tudo, com pinceladas precisas e opacas, que escondem cada centímetro quadrado de sua nudez total. A sensação visual que se tem, é a de ambiguidade, podendo cada figura ser vista como nua e vestida. Também passam a sensação de que estão dormido ou acordadas, vivas ou mortas.

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