Aprovado

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Jenna liga o chuveiro, não me importo se estou com o vestido, sinto a água percorrer o caminho do meu corpo, tentando invadir os pedaços de pele coberto pelo tecido preto. J me vira de costas e abre o vestido, assisto ele cair no chão. Ouço a porta abrir e fechar. Encaro o azulejo branco, horas antes eu ouvira Lucca dizer o quão bonita eu sou em sua visão. Do mesmo jeito que estou agora, nua, com o cabelo molhado. Será que ele ainda diria que sou linda? Ouço a porta abrir novamente, Jeny desliga o chuveiro e estende a toalha pra mim, ela envolta os braços e o tecido em volta do meu corpo, me abraça e encosta o queixo em meu ombro. Passa a mão em meu cabelo molhada "tudo vai ficar bem" ela sussurra em meu ouvido. De longe é possível ouvir a porta da casa abrindo e fechando, e sei que minha melhor amiga mandou seu namorado sair. 

Com um copo de chá na mão e J penteando meu cabelo, começo a voltar ao mundo real. As vezes, depois que alguma crise, as coisas não fazem sentido pra mim, é como se eu me desligasse da vida e me isolasse mentalmente. Meu corpo se programa em uma auto-defesa que me impede de encarar a realidade novamente, por que sabe que há algo errado nela. São nesses minutos após a crise que consigo a paz que tentei encontrar durante o ataque de ansiedade. Já ouvi de diversas pessoas situações como essa. Ter problemas assim não é incomum, mas ter quem se preocupe e cuide de você é. Por isso sinto um calor interno enorme ao perceber a sorte que possuo por ter uma melhor amiga com a paciência e o potencial que Jenna tem. Não se encontra por aí pessoas dispostas a encarar os seus piores momentos por motivos que, para muitos de fora, não são razões necessárias para despertar ansiedade. Jenna não se importa pelo motivo, isso me deixa feliz. Ela sabe que se me deixou no estado que estou, então é importante pra mim. 

Algumas lágrimas caem ao refletir sobre ela. Não são de dor, são de felicidade. Ela me coloca na cama e passa a mão no meu cabelo. Deito sobre seu peito e massageio sua barriga. Meu sobrinho não poderia ter escolhido família melhor. Eu não poderia ter escolhido família melhor.

Caio no sono e acordo, depois do que se parecem dezenas de horas. Ouço J+J conversando em seu quarto. Eles conversam alto, como se discutissem, mas não parecem bravos, apenas interessados no que um tem para ouvir o outro. "É direito dela ir!" Jenna exclama, "Ele não quer que ela vá!" Jake parece implorar para que sua namorada entenda. 

Pego meu celular em cima do criado-mudo. 

Eu devo ter dormido muito mais do que pensei, por que já é outro dia. Levanto com pressa, abro o armário e coloco uma calça jeans preta e uma regata larga branca com um cardigã. É hoje a apresentação do trabalho de Lucca. Paro no meio do quarto e olho em volta. Ele não dormiu aqui. 

Repenso antes de abrir a porta. Não sei se ele me quer lá. J+J ainda discutem. 

Abro a porta do quarto. 

A porta deles abre também. 

"Bom dia S" Jake sorri "Bom dia J" sorrio de volta. Jenna não está com uma cara muito boa, será que é ela que precisa de ajuda hoje? Puxo minha amiga pra dentro do quarto. "Tá, pode me falar o que aconteceu" tento extrair alguma coisa, mas ela parece querer distância de mim "J, casais brigam, tudo bem se você e Jake brigaram, eu cuido de você" complemento. 

Ela dá um sorriso baixo, "não briguei com ele S" "então qual o problema?" "eu mandei Jake atrás do Lucca ontem, antes de você ir dormir. "E?" tento entender "E que o Lucca preferiu não vir dormir aqui, e nem que você vá na apresentação dele" fico paralisada observando Jenna falar tudo aquilo. 

"Como assim? Ele tá bravo por que eu fugi da festa? Como ele ousa fazer isso comigo?" Jenna estende os braços, mas eu não quero ser confortada agora. Sinto raiva de Lucca querer distância, quero ouvir de sua boca que ele não quer me ver. "Obrigada Jey, mas acho que preciso tomar um ar" saio as pressas, deixando o casal falando sozinho. 

Pego o carro e saio do Vista Cay o mais rápido possível, provavelmente a apresentação de Lucca já vai começar. 

Como a UCLA está em recesso, quase não há estudantes no campus e posso estacionar na porta do prédio que L está, vejo seu carro preto parado ao lado do meu e tenho certeza de que ele não me espera lá. 

Ainda estou brava, mas encarno um sorriso antes de abrir a porta da sala. 

Vejo Lucca parado ao lado de um projetor, 5 professores da qual parecem não ter tomado café da manhã e dezenas de cadeiras vazias. Não é um costume não trazer família para as apresentações, os alunos sempre querem alguém com eles, é o momento final da faculdade. 

Luc veste a mesma roupa do que ontem, sem o terno dessa vez. Mesmo com olheiras profundas, ele está maravilhoso. Peço desculpas pelo incômodo silenciosamente e sento na primeira carteira. 

Não entendo dezenas de palavras ditas e explicadas na apresentação, mas me impressiono com o resultado de pesquisa feita sobre uma nova doença e sua cura. Eu já havia ouvido L falar sobre, mas nunca com tanta propriedade como agora. Me orgulho do rumo que a apresentação está levando. A banca de professores trocam olhares entre si e anotam observações em seus cadernos. O resultado parece ser óbvio, e os docentes não poupam elogios sobre o trabalho árduo que o aluno tivera nesses anos todos de faculdade. Inclusive no fato de Lucca ter entrado adolescente, e iniciado uma pesquisa tão complexa como essa que apresenta agora. 

Todos da sala batem palma com o resultado de aprovado, inclusive eu. Me retiro do recinto antes que L consiga falar comigo, te-lo encarado por uma hora já foi demais e penso que se ele não queria que eu viesse, talvez não vá querer conversar comigo agora. 

Saio do mesmo modo como entrei, silenciosamente. Enquanto ando rapidamente pelo corredor da faculdade, ouço meu celular tocar. 

É Angela. 

"S?" "Senhora Angela? No que posso ajudar?" "Ah querida, sem formalidade. Preciso conversar com você, o que acha de nos encontrarmos no Starbucks perto do Vista Cay?" "Estou a caminho" 

FinalmenteWhere stories live. Discover now