Bom dia

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Minha cabeça dói, eu abro os olhos e uma luz branca forte vai de encontro á eles. Ouço um estrondo forte vindo do meu lado e um tranquilo carinho na mão. Olho para o lado e vejo uma cabeça apoiada na cama do hospital, uma mão enlaçada na minha, dois perfumes que reconheço. Viro a cabeça com cuidado, ouço outro estrondo.
É Philip. Ele soca a parede. A porta se abre e duas enfermeiras entram "O senhor precisa se acalmar, ou sair do quarto. A paciente não pode passar nervoso novamente." Novamente? Não me lembro de ter passado nervoso, apenas um sono tranquilo sendo carregada no colo de Lucca, e a luz forte que ainda arde em meus olhos.
Ao perceber que eu acordei, o foco deixa de ser Philip e as duas enfermeiras correm para me analisar. As mãos com luva me tateiam e eu sinto dor. "Clavícula deslocada." "Isso dói." Eu tento sibilar.

"Mas que merda S, você me deu um susto." Philip corre na minha direção. Olho em seus olhos, mas não consigo acha-los tão verdes como antes. Eles tem um tom cinza, um tom de quem trai, talvez seus olhos nunca foram tão maravilhosos como achei, talvez ele não fosse quem eu achei que fosse. Mas ainda assim, ele está aqui, e isso ainda me conforta. "Achei o pôr do sol." Ouço uma risada e olho para a cabeça abaixada, eu sei exatamente quem está ali, de quem é a mão enlaçada a minha.
"É efeito do remédio?" Philip pergunta as enfermeiras. "Não, ela está consciente, pode falar com ela." " Por que ele ri?" Philip me pergunta, eu dou risada, mas logo sinto a dor no ombro esquerdo. Merda.
"E como é o pôr do sol?" "Sem graça, tem cor de mel." Ele ri novamente. A porta fecha com força e eu vejo Philip indo embora, visivelmente transtornado. 

 "Lucca, onde está Jesse?" Ele levanta a cabeça ainda abaixada, e vejo um corte profundo em sua sobrancelha. Eu assusto. "O que aconteceu?" "Eu estava com você no colo, achei que jogariam apenas uma bomba, mas foram duas. E para não te machucar eu tentei ficar em pé. Não deu muito certo." "Isso deve ter doído." "É que você não viu a injeção que me deram no local, eu mal sabia que era possível tomar injeção em um corte." "Ainda bem que eu faço Direito e não enfermagem, eu não saberia como reagir." "Você está pior S, acredite."

Sinto muita falta da minha irmã e da minha tia, olho pra frente e Lucca percebe "Elas estão bem, estavam aqui até um pouco antes de você acordar, mas as duas precisavam de um descanso, e eu não largaria sua mão por nada. Então relutantes elas foram dormir um pouco, Jenna as levou." "E Philip? Você acha que ele tá bem?" "Acho que não." "Você pode chamar ele? Quero conversar." Ele me olha de lado, "Sério S?" "Sério Lucca.""Eu grito quando terminar, e você e Jake entram, pode ser?" "Claro." Ele revira os olhos e levanta. 

A porta abre em um impulso forte e faz um barulho alto. Seus olhos estão cheio de água e regados de olheiras. "Serena." Ele sussurra meu nome e eu me lembro do que costumávamos ser. Se eu pudesse voltar no tempo, eu ainda assim aceitaria a proposta da minha melhor amiga para fazermos um aniversário surpresa para Jake e Philip. Foi assim eu pude entender que nem tudo o que saia da boca de Phil era verdade, ou então, tudo o que ele falava era exagero. Talvez ele goste de mim, mas amor não é isso, amor é não conseguir sair de perto, ele conseguiu. Eu por outro lado tive que aprender a não ama-lo, ainda não aprendi, mas não morri, aparentemente. 

Ele contorna a cama e me olha nos olhos, "Volta pra mim?" "Sério Philip? Nada do tipo, como você tá? O que tá sentindo? Posso te ajudar?" Eu ouço meu eco no quarto, ouço meus pensamentos inquietantes na cabeça e não posso deixar escapar um riso "O que tem de engraçado?" Ele me encara sério, "A um tempo atrás, isso seria a única coisa do mundo que eu iria querer ouvir, mas hoje já não é o suficiente." Me dói, me dói muito dizer isso, mas no momento é o que eu preciso dizer. "O que não é o suficiente?" "Você sumir, e quando aparece, falar coisas bonitas. De frases tocantes a internet tá cheia meu amor, eu preciso mesmo é de você, da sua presença me provando que eu estou errada." "Talvez eu seja assim." "Talvez dizer isso é o caminho mais fácil." "Eu vou tentar." "Espero que consiga Phil." 

"Que pôr do sol lindo né não?" Eu falo alto e aponto pra janela. "Serena, são 7 horas da manhã." Lucca e Jake entram na sala "Olha lá Philip, o pôr do sol." Eu não consigo guardar a risada, e sorrio observando a janela. O momento constrangedor é interrompido por uma enfermeira entrando no quarto. Os três meninos parados á minha frente arregalam o olho á espera de informações "Bom Serena, o seu quadro é simples nada muito complicado. Você está com a clavícula deslocada, no momento você não sente dor por estar sob um alto analgésico na veia." A pequena enfermeira olha para os meninos e se refere-se a mim como se eu fosse incapaz de responder. "Serena ficará por mais um dia em observação, com soro e remédio na veia, após esse tempo creio que ela terá alta. Imobilizaremos a clavícula, mas ela terá que voltar daqui a alguns dias no hospital. Qual de vocês é o namorado dela?" "Eu." Lucca e Philip dizem em coro, ambos se olham feio e a enfermeira se perde, Jake dá risada e calmamente diz "Sou eu, pode falar." Fico grata por ele fazer isso, e acho graça da postura de Lucca e Philip, eles se olham com raiva e sinto que Jake é meu irmão mais velho. "Ela ficará um bom tempo imobilizada e precisará da sua ajuda com algumas coisas, quando ela voltar no hospital daqui a algum tempo, se a clavícula não tiver melhorado, teremos que analisar a ideia de uma cirurgia." Jake assente "Creio que não será necessário." Philip completa "Ela é guerreira, uma grande mulher, com certeza vai melhorar." Lucca acrescenta "Ela é folgada isso sim, vai adorar não fazer nada. Mas pode deixar que eu me mudarei pra casa amanhã mesmo, pra estar pronto pra alta dela." Jake gosta da ideia "Eu e Jenna te ajudamos." Eu sorrio e me sinto feliz por ter todo o apoio das pessoas que amo, mas esqueço do pequeno detalhe que Philip não sabia que Lucca morará em casa, e até onde eu sabia, nem Jake ou Jenna, mas eu já tinha dado a autorização para Lucca os contar, ele estava animado. 

Philip ainda olha pasmo para seu melhor amigo e Lucca "Que mudança?" Nenhum deles responde, Philip pergunta novamente, transtornado. "QUE MUDANÇA SERENA?" Eu não fico quieta, não sou obrigada a isso. "Pam está bem Philip?" Jake não é rápido o suficiente para separar o grande e habilidoso punho de Philip do belo maxilar de Lucca, muito menos a enfermeira é capaz de se mexer perante a cena. "Olha o que você fez! Fez Serena me odiar." Mal sabe ele que preciso de uma cola forte e muito fôlego para juntar e colar cada caco meu do chão. "Não se finja de burro e nem passe a culpa para mim, se você não tivesse sumido com Pam aquele dia, nada disso teria acontecido." "MAS EU NÃO TIVE NADA COM ELA! SERENA SABE DISSO." A diferença do tom de voz dos dois é discrepante. Lucca me olha, vejo o pôr do sol ameaçando garoar. Algumas lágrimas dos seus olhos caem, rezo internamente para que sejam de dor do soco. "Ela não sabe Philip, tudo o que ela mais queria era uma explicação, não um namorado que some e aparece com a amiga morando e vivendo com ele." "Como se ela não estivesse fazendo isso nesse exato momento." "Não nos compare, não ouse chegar a esse ponto. Serena não é Pam e eu não sou você." "É muito claro que você não sou eu." "Verdade, eu a deixaria." Outro soco e vejo sangue jorrar, os pontos de Lucca abriram, e o que já estava feio ficou pior ainda. Sinto-me totalmente mal por não conseguir me mexer, mas não dá tempo, Jake dá outro soco em Philip. Nesses meses todos em que convivi com Jake, ele nunca passou do estado de cansado, ele está furioso agora. "Cala a merda da boca Philip, a sorte é sua de ainda falar com Serena, eu não te deixarei cometer o mesmo erro duas vezes." O mesmo erro duas vezes? Que erro? O sangue de Lucca ainda jorra, duas enfermeiras entram e um segurança, que leva Philip e Jake para fora. As duas moças loiras e apavoradas sentam Lucca na cadeira ao meu lado e retiram gazes de seu avental branco e bordado. 

Eu vejo a cena e me pergunto se devo reprimir a sensação de querer beijar o homem sentado ao meu lado. A última vez que fiquei feliz por um cara se arriscar e ultrapassar barreiras comigo, ele foi um idiota. Mas algo me diz que Lucca não é um desses caras. 

FinalmenteWhere stories live. Discover now