6 - Verdades

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Depois do meu baile frustrado, fui para meu quarto com uma dor de cabeça terrível. Pedi a Hector que não fosse me fazer nenhuma visita, não estava com cabeça para as suas gracinhas. Para ser sincera, queria muito conversar com Lotte, era incrível o modo como a pequena raposa sempre conseguia me acalmar com sua voz doce e seus olhos brilhantes. Eu estava um caco, não sentia fome, muito menos sono. Deitei-me em minha cama e encarei o teto. Respirei fundo e levantei-me pouco tempo depois, comecei a observar os móveis do meu imenso quarto, era tudo extremamente elegante e delicado, chegava a ser irônico, afinal, eu era a "princesa das trevas", quem poderia imaginar que não havia somente objetos escuros e assustadores?

— Não seja ridícula, Su... Nada é como você pensava.

Sentei-me no banco em frente ao piano e toquei de leve em suas teclas, eu não sabia tocar absolutamente nada, apenas estava tentando romper um silêncio perturbador que se instalara no cômodo. Ao ouvir o som agudo que se fez quando pressionei as últimas teclas, lembrei-me de Ana, ela tocava extremamente bem. Senti falta dela. Senti falta de Enrique e dos outros. O que eles estariam fazendo naquele momento? Estariam sentindo minha falta tanto quanto eu sentia a deles? Uma lágrima escorreu pelo meu rosto, parando em meus lábios. Uma vontade louca de apertar as bochechas de Heloíse veio em minha mente, queria abraçar aquela coisa pequena e ruiva. Assim como meu pai e minha pequena bolinha de pelos -que mais parecia um sorvete de flocos. Abracei a mim mesma, tentando conter a saudade de todos eles, pois não podia voltar, não naquele momento. Observei o relógio de pêndulo antigo na parede, e notei que já estava bem tarde. Levantei-me e saí do meu quarto, precisava distrair minha mente. Caminhei pelo corredor -com os pés descalços, os sapatos estavam machucando meus tornozelos- e fui até a biblioteca, a porta estava aberta. Os candelabros nas paredes estavam todos iluminados, o que me dava uma boa visão das estantes, menos de uma parte do cômodo, na qual eu sabia que havia uma poltrona de couro marrom, esta, como ficava atrás de uma das estantes, sendo uma área reservada para leitura, não podia ser vista apenas com as luzes da biblioteca, quem quisesse usá-la tinha de levar seu próprio castiçal.

— Vamos lá... — Sussurrei.

Passei meus olhos calmamente por uma das estantes, cujos livros restringiam-se apenas à fantasia. Eram muitos, eu não fazia ideia de qual escolher. Caminhei um pouco e parei em frente a parte de livros de poesia.

— Também acho muito difícil escolher.

Soltei um grito agudo e virei-me rapidamente para trás. No entanto, não havia ninguém ali, pelo menos, não onde eu pudesse enxergar.

— Quem é você?

Uma silhueta começou a aparecer em meio à escuridão, ele devia estar sentado na poltrona, por isso eu não o tinha visto.

— Olá.

Então, ele apareceu completamente à minha frente. A primeira coisa que notei foram seus olhos, um deles era verde, e outro, azul. Os cílios eram longos e pouco curvados. Foi difícil desviar o olhar daquelas íris, ele parecia estar tentando me despir com os olhos e isso me abalou. Então, observei o restante do seu rosto, seus traços eram fortes e o sorriso de canto, irônico. Exacerbadamente irônico. Ele usava um terno inteiramente escuro e seu pescoço estava tombado levemente para a direita, como se desejasse me observar por outro ângulo, assim como Hector fazia. Agradeci mentalmente por estar com um vestido e não somente com uma camisola, afinal, quando Hector o fazia, não era tão constrangedor, mas aquele cara, eu nem sequer o conhecia. Então, notei seus olhos parados em minha perna direita, que estava à mostra graças à fenda que havia no vestido.

— Você me assustou. — Informei, com a voz trêmula.

Xinguei-me por dentro por isso, eu devia demonstrar confiança, mesmo que não me sentisse nem um pouco segura.

Herdeiros (livro 3)Onde histórias criam vida. Descubra agora