14 - Deixando no passado

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Narrado por Max

Eu estava deitado em minha cama, num pequeno quarto de um apartamento que eu alugara numa cidade vizinha à São Gabriel. Era uma tarde de quarta-feira, eu havia emprestado meu carro a Luca, para que eles fizessem uma viagem. Eles realmente mereciam um tempo apenas para os dois, tinham de curtir a gravidez da Ruivinha. Respirei fundo e me levantei, tirei minha camiseta e fui até a geladeira na minúscula cozinha que havia no local. Abri-a e peguei uma cerveja, então, eu senti. Era ela. Estava perto do meu apartamento, devia estar na escada, mas decidi me mostrar indiferente, esperei que o anjo caído batesse à minha porta. A campainha tocou e eu fui calmamente até a entrada. Atrás da porta havia o anjo mais bonito que já habitou a terra. Uma pele linda de chocolate, um rosto angelical e atraente, e os olhos mais ameaçadores que eu já vira. O vestido branco destacava-se eu seu corpo, pois modelava completamente suas curvas. Respirei fundo, admirado com sua beleza.

— Olá, Max.

— O que deu em você para vir me procurar?

— Senti saudades, lindinho.

E assim, Luma entrou na moradia sem ao menos ter sido convidada. Eu tinha que admitir, adorava seu jeito atrevido de quem faz o que quer e quando quer. Ela era simplesmente encantadora. Mas não sabia mentir. Não para mim, pelo menos.

— Saudades? Conta outra, Luma... — Debochei. — Quer? — Ofereci a cerveja a ela, embora soubesse que ela achava o meu gosto pelo álcool, desprezível.

— Não.

Ela tirou o lata da minha mão e empurrou-me no sofá, sentando em meu colo logo em seguida.

— O que foi que deu em você?

Ela envolveu os braços em volta do meu pescoço.

— O que foi? Não me quer mais?

Observei sua expressão, parecia estar exausta, como se tivesse ficado pensando durante muito tempo em algo perturbador.

— A questão, Luma, é que você não me quer. — Cuspi essas palavras e a olhei com indiferença.

O anjo fez uma cara tristonha e baixou o olhar.

— Sabe, Max, eu errei com você... Errei muito. Acabei... bem, acabei percebendo tarde demais que você é a pessoa certa.

Foi inevitável, no exato momento em que ela parou de falar, meu coração disparou e foi impossível não beijá-la. O beijo foi ardente e eu estava louco para tê-la só para mim, por que ela tinha que ter demorado tanto para ver que eu só queria fazê-la feliz? Deitei-a no sofá e fiquei sobre ela.

— Achei que nunca perceberia isso.

— Você me ama? — Seus olhos se iluminaram e ela mordeu o lábio inferior. — Faria qualquer coisa por mim?

— Qualquer coisa... — Respondi enquanto beijava-lhe o pescoço.

Luma me empurrou de leve com a mão em meu peito, transmitindo um calor incrível. Seus olhos me encaram com carinho.

— Tem alguém que me fez muito mal há alguns dias...

— Quem?

Afastei-me um pouco para olhar em seus olhos, só a ideia de existir alguém que a feriu já me deixou irritado.

— Destrua-a para mim, Max...

— Quem foi, Luma?

Ela passou a mão de leve pelo meu rosto, e seus olhos ficaram tristes de repente.

— É horrível lhe pedir isso, não queria que fosse assim... — Balançou a cabeça negativamente.

— Diga... — Pedi, acariciando-lhe a bochecha em seguida. — Quem foi?

— A Susana.

A princípio, pensei não ter ouvido direito, mas não. Então, levantei-me e caminhei de um lado a outro da pequena sala de estar. Virei-me e a encarei, ela parecia arrasada por ter me pedido aquilo.

— O que a Su fez?

— Ela me bateu, Max. Ela ia me matar... e Luca não fez nada para impedir.

Luma se levantou e caminhou até mim, pousando graciosamente suas mãos delicadas sobre o meu peito, fitando-me com um olhar suplicante.

— Não entendo...

— Não precisa entender, meu amor... Apenas faça-os pagar. Eles me feriram, Max... eu fiquei arrasada.

Comecei a pensar sobre tudo aquilo. Eu havia passado anos correndo atrás de Luma, realmente gostava dela, nunca havia me importado por ela ser apaixonada por Luca, ainda mais quando Susana apareceu na vida dele, pensei que com isso, Luma o esqueceria. E de fato, nós dois tínhamos conseguido tentar algumas vezes. Algo sempre a impedia de continuar, mas eu não sabia o que era. Luma sempre havia sido a representação da mulher ideal para mim, mas se Susana a tinha machucado, alguma razão deveria ter, ela com certeza teria feito algo para ambos terem feito o que fizeram, e eu jamais trairia a confiança do meu melhor amigo por uma mulher, ainda mais quando já havia sido desprezado pela mesma durante tanto tempo.

— Luma...

— Sim, meu amor?

Fitei seus olhos âmbar, havia ódio por trás daquela cor maravilhosa que me lembrava o pôr-do-sol. Respirei fundo.

— Quero que saia daqui.

— O quê?

Sua expressão ficou confusa.

— Se Su a feriu e Luca não impediu... tiveram motivos.

— Não! Você não pode me abandonar!

Ela começou a socar meu peito, o que me deixou com raiva, então, peguei-a pelos pulsos e a empurrei até a porta da entrada.

— Tanto posso, que farei isso.

— Você nem me ouviu! Não sabe o que eles fizeram! — Gritou. — Max! Max, não faça isso! Eu amo você!

Parei no mesmo momento, sem deixar de notar o quanto aquela frase pareceu falsa saindo de seus lábios. Encarei-a.

— Francamente, minha cara, eu não me importo.

Bati a porta na cara da mulher que eu havia esperado anos. E, muito estranhamente, senti-me aliviado por isso. Luma não gritou, nem tentou entrar em meu apartamento novamente. Eu contaria a Luca assim que ele voltasse de sua viagem. Eu poderia ser todo o tipo de coisa: malandro, talvez um pouco mau e folgado, mas "desleal" não se encaixava em minha lista de defeitos. Luca era importante para mim, e consequentemente, sua família também, e Susana era sua família. Era a única que ele tinha, eu jamais tiraria dele o que havia conquistado com tanto sofrimento. Luca, mais do qualquer outra pessoa que eu conhecia, merecia ser feliz. E concluí que eu também, não mendigaria mais pelo amor de quem não me deu nada quando eu havia oferecido tudo. Eu valia mais do que isso.

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Pois é, enquanto uma se mostrou uma verdadeira cobra, outro provou ser, não um amigo, mas um irmão.

Herdeiros (livro 3)Onde histórias criam vida. Descubra agora