Estranhos não tão estranhos

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Na cozinha da fazenda ninguém falava. Os funcionários estavam amontoados em um canto. A noite tinha sido longa e o dia seria ainda maior, hoje era o funeral do Seu Pedro. Filomena entrou no cômodo e suspirou. Ela sentia os ossos doerem pela noite que passara em claro acalmando Aninha.

_ Como esta ela? _ perguntou Cida

_ Dormiu agora, dei-lhe um chá forte _ suspirou novamente _ coitadinha da minha menina!

Todos se entreolharam sem saber o que dizer. Durante a noite conjecturaram sobre o que aconteceria com a fazenda, uma vez que Aninha ainda era menor de idade.

_ O que será de nós, Filó? _ Chico expôs o que cada um ali pensava.

_ Deixe de ser egoísta, homem! _ cortou Filomena _ Aninha não tem ninguém por ela e você aí pensando no seu umbigo velho?

Chico baixou os olhos envergonhado, porém, sua preocupação era legítima. Eles até pensaram em cuidar da fazenda pelos próximos meses até que a menina completasse dezoito anos, porém, não sabiam se a lei ia permitir.

Filomena pegou um café e deixou os olhos percorrerem seus amigos. Ela também estava preocupada com toda aquela situação. Um movimento na porteira distante lhe chamou a atenção. Uma camionete acabara de estacionar. Provavelmente eram conhecidos que souberam da morte de Pedro, portanto, gritou com um dos peões para que ele abrisse. Curiosa foi até a sala receber as visitas.

Um casal muito bem vestido entrou na casa seguido por um jovem, usando fones de ouvido e alheio a tudo em sua volta. A mulher encarou Filomena por alguns segundos, mas não se deteve. O homem percorreu a sala com os olhos e voltou-se para Filó.

_ Meu nome é César, sou o irmão de Pedro. Soube o que aconteceu ontem _ falou em um tom de voz monótono e sem vestígios de emoção _ viemos para cuidar da minha sobrinha.

Filomena abriu a boca e não conseguiu emitir nenhum som. Lembrou-se do Seu Pedro falar de um irmão de criação com quem perdera contato há muitos anos. Ela não se lembrava do nome dele, mas provavelmente era aquele sujeito que estava ali diante dela.

_ Onde esta Anabelle? _ perguntou a mulher sem se apresentar.

_ Ela dormiu tem algumas horas, senhora. Esta no quarto _ respondeu Filomena sem graça.

_ Tudo bem, mas não a deixe dormir demais. Acorde-a daqui uma hora _ falou secamente _ agora arrume um quarto para mim e meu marido e outro para nosso filho e, em seguida, vamos discutir a rotina do dia.

_ S... sim, se.. senhora _ Filomena não estava certa do que acontecia ali. Aquela mulher estava tomando conta e dando ordens como se fosse a dona da casa.

Saindo da sala, foi dar a notícia aos outros funcionários e depois cumprir as ordens. Filomena reconhecia que era parte do corpo de empregados da fazenda, todavia, nunca fora tratada como tal. Enquanto se encaminhava para a cozinha, pensou que não recebera sequer um obrigada daquela mulher. Com a ponta do avental, secou uma pequena lágrima que brotou no canto do seu olho. Mais do que nunca sentiu a falta do Senhor Pedro.

Em poucos minutos organizou dois quartos no andar de cima para as visitas e foi chamar Aninha. A menina pareceu menos triste ao saber que havia parentes em sua casa e Filomena preferiu omitir sua primeira impressão deles.

Ana sentiu um pequeno alívio por saber que não estava tão sozinha quanto imaginava. Ela tinha uma família e eles poderiam protegê-la. Colocou um vestido escuro para o velório, prendeu os cabelos em duas tranças, como costumava fazer e desceu para conhecer os tios.

Enquanto descia as escada,s com cuidado para não tropeçar, observou as três pessoas estranhas. Tentou puxar pela memória para ver se já os tinha visto e não conseguiu se lembrar. Seus olhos passaram rapidamente pelo homem alto e grande que estava encostado na parede ao lado da janela, ele não lhe lembrava em nada o pai.

As voltas do coração [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora