1 mês depois, Brasil
_ Que raiva! Ohhh São Pedro, espera um pouquinho, cara!! _ implorou Anabelle olhando para as pesadas nuvens que se acumulavam no céu bem acima de sua cabeça.
Ela conhecia a fazenda desde criança e sabia que iria chover muito forte nas próximas horas.
Olhou em volta e forçou a memória para reconhecer cada canto dali. Lembrou que deveria ter uma pequena estrada que dava direto para uma cabana de pescadores.
Aquele lugar era seu refúgio quando levava alguma repreensão de seu pai ou de Filó. Torcia para que o lugar ainda não tivesse caído aos pedaços.
Dirigiu por mais alguns minutos e respirou aliviada ao ver a cabana. Como se o destino quisesse fazer uma imensa piada com ela a chuva caiu forte.
_ Ahhh! Sério? Sério mesmo? C'est naze!!!* _ balbuciou.
Esperou alguns minutos dentro do carro e a chuva continuava. Bufou fortemente e decidiu enfrentar a tempestade. Puxou a pequena mala de mão do banco de trás e desistiu de pegar o guarda-chuvas.
O vento por certo o arrancaria de suas mãos. Além disso, ele mal cobriria sua cabeça, pois era minúsculo.
Saiu em disparada até a cabana. Como era de se esperar a água escorria de seu cabelo, no rosto e as roupas estavam encharcadas. Empurrou a porta com o pé e entrou.
Surpresa, percebeu que o lugar não fedia a mofo. Pelo contrário, estava limpo e organizado.
Os móveis, apesar de rústicos, estavam muito bem dispostos e limpos. Existia até alguns objetos de decoração.
O mais estranho era um tapete fofo no chão que lembrava um animal. No entanto, pensaria nisso mais tarde. Teria bastante tempo, pois a chuva só aumentava.
Olhou a pequena valise que trouxera consigo e suspirou. Lá estavam seus cremes, maquiagens, perfumes e a única coisa útil, um pente.
_ Ahhhh, c'st naze!!! C'est naze!!!* _ xingou entredentes.
Até pensou em voltar ao carro e pegar a outra mala, mas descartou a ideia após ouvir um trovão. Com a sorte que estava naquele dia, era bem capaz de ser alvo de um ou dois raios.
Penteou o cabelo como pode e deixou as mechas formarem pequenos cachos na altura dos ombros. Os cachos estavam bem hidratados e foi fácil colocá-los no lugar.
Aquela menina de longos cabelos escuros e tranças estava morta. Aquela gente que usurpou e roubou tudo o que herdou a matara há dez anos.
Ela tinha se preparado muito para aquele momento. Contratou detetives para descobrir o que pudesse sobre aquela família maldita, sabia o que tinham, as dívidas, os investimentos e os pontos fracos.
Em seguida contratou advogados que entraram com pedidos de liminares para o congelamento de todas as contas e bens deles. Ela bem que poderia esperar que o oficial de justiça fosse até a fazenda expulsar os tios usurpadores, mas o sangue lhe fervia só em pensar que não veria eles serem humilhados.
Ela queria pisar, queria que todos vissem os monstros ladrões que eram. Por isso pensou em cada detalhe para arrancar-lhes as máscaras publicamente. Ela pensava neles como um bloco único, as poucas vezes que seus pensamentos passearam por cada um, uma dor profunda queimou seu ser ao lembrar-se de André.
Era orgulho ferido, pensou. Uma mágoa e decepção tão profundos que nada poderia apagar. Com o tempo se convenceu que jamais o amou, afinal, era uma criança tola e romântica. Aquilo foi uma ilusão, uma paixonite de adolescente.
Porém, isso não o isentava de ser o foco de sua maior ira. Ele pagaria. Ela iria esmagá-lo e, talvez, com mais força que os demais, porque ele a machucara tão profundamente que sua alma jamais foi a mesma.
Após planejar tudo, sonhou em reaparecer na fazenda tal como via nos filmes: a mocinha chegando toda poderosa, depois de uma transformação. Destruindo e esmagando seus inimigos.
Contudo, sua vida estava mais para uma tragicomédia de quinta categoria.
Ali estava ela inteiramente molhada, a blusa de seda clara colada ao corpo revelando o sutiã de renda, a calça verde escura toda embarreirada, os cabelos pingando e, muito provavelmente, a maquiagem borrada. Pelo menos aquilo poderia resolver.
Abriu a mala e tirou alguns produtos e um pacote de algodão. Com cuidado removeu todo o excesso de rímel que tinha se espalhado por suas bochechas.
Pronto, agora não estava parecendo um panda zumbie.
Levou as mãos aos botões da blusa, ela precisava tirar as roupas e deixá-las secar. Nesse instante se assustou ao ouvir um barulho na porta. Alguém tinha entrado. Antes que se virasse para olhar, ouviu uma voz que, nem se vivesse mil anos, esqueceria. Os dez anos só a tornaram mais grave e dura.
_ Quem esta aí e o que esta fazendo na minha casa?
Ensaiara centenas de vezes aquele reencontro e agora sentiu o corpo estremecer. Xingou mentalmente sua fragilidade.
Todo seu plano não podia dar mais errado. Não era hora de encontrá-lo. Ainda não estava pronta, mas será que um dia estaria? O coração, imbecil, bateu aceleradamente como se fosse sair do peito. Ela precisava se controlar.
Buscou na memória o instante em que ouviu os tios planejando seu sumiço e a voz dele concordando. Pensou no quanto fora sofrido ter seu filho sozinha e depois cuidar dele quando adoeceu. A cada pensamento respirava fundo para se acalmar.
Relembrou as noites em que chorava bem baixinho para não acordar a criança. Ele era um deles, planejara sua morte, feriu seu coração e sua alma, brincou com seus sentimentos mais puros e verdadeiros.
Trincou os dentes e cerrou os punhos de ódio. Ela não seria fraca nunca mais. Reuniu toda a sua força e virou-se com um meio sorriso cínico.
_ Sua casa, André?
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*Isso é uma merda. Usado para falar de situações ruins ou desagradáveis.
E agora heim? Depois de dez anos será que ainda existem faíscas deste amor?
Se puderem deixar uma estrelinha 🌟 e um comentário vou adorar!
Bjinhos molhados de chuva!!
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As voltas do coração [COMPLETO]
RomanceAnabelle sonha em conhecer um grande amor, se casar e viver feliz para sempre na fazenda onde nasceu. André sonha em ter vida fácil, foi muito mimado e não acredita no amor. Quando se conhecem, ela pensa ter encontrado o que sonhou e ele tem a missã...