☆Capítulo trinta e um☆

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 Depois de meia hora de caminhada da casa de Logan, passando por uma mata alta e densa, com árvores de tronco largo e aparência muito antiga, finalmente chegamos ao lugar onde, um dia, foi a casa das irmãs Clark. Hoje não tem indícios nenhum de que houvera uma casa ali. Provavelmente devido ao incêndio. Mas eu conseguia sentir. Uma energia, que percorria todo o meu corpo. Faíscas saem da ponta de meus dedos e os meus poderes imploram para agirem, mas eu me controlo. Ainda não é a hora.
 Sento em um tronco caído e Logan faz o mesmo, deixando pouco espaço entre nós. Ele ficou encarregado de me trazer. Alec tem uma alcatéia para cuidar e parece que tomou como uma ofensa pessoal o fato de Erick ter fugido ontem. As meninas foram buscar as velas que eu pedi. Observo o fraco sol da manhã. O vento em meu rosto me desperta e me impede de deitar sobre esse tronco duro e frio e adormecer.
 Depois da conversa de ontem dormimos pouco e acordamos assim que a loja mais próxima se abriu para comprar as velas, pouco depois das 8 horas.
 - Aqui já foi muito bonito. - diz Logan, quebrando o silêncio. - A propriedade era uma das melhores na época.
 - Uma casa enorme, de dois andares com um jardim lateral todo florido bem ali. - digo apontando para onde um dia, fora a casa.
 - Como sabe? - ele parece surpreso.
 - Andei sonhando com essa casa várias vezes. Você também está no sonho. - digo não entrando em detalhes.
 - Andou sonhando comigo? - diz com um sorriso de lado e por alguns instantes, seu rosto recupera o ar brincalhão de que eu tanto senti falta.
 - Sim e com Davina... - digo e ele faz uma careta ao escutar esse nome. - E com sua filha.
 Eu não tinha ligado os pontos antes, mas agora tenho certeza. O bebê dos sonhos é a filha de Davina. E Logan descobriu isso logo naquela época. E algo mais aconteceu. O tom magoado que ele usou ontem ao falar dela é bem parecido com o que ele usa no meu sonho. E é Davina que eu vejo quando olho no espelho.
 - Por que não nós conta a história inteira? - pergunto olhando o mesmo nós olhos.
 - Eu contei tudo o que podia ajudar. Os outros detalhes não são necessários. Não ajudariam em nada. - diz desviando os olhos. Não digo mais nada. Apenas volto a olhar para o céu. O que ele insiste em esconder? Será que tem medo que o julguemos por ter feito algo horrível por estar magoado? Sinceramente, não sei. E ele não parecer que vai falar.
 - Está com medo? - Pergunta, depois de alguns minutos.
 - Se tivesse me perguntado a dois dias atrás, diria que estava morrendo de medo. Hoje? Minha resposta mudou. - digo e ele parece surpreso.
 - Não tem medo de... Não resistir ao feitiço? - pergunta, visivelmente curioso.
 - Está perguntando se eu tenho medo de morrer? Não. Não se eu morrer sabendo que estava fazendo a coisa certa. - digo e ele parece ainda mais surpreso.
 - Eu tive. Eu e Mai tivemos. Queria ter tido metade da coragem que você tem hoje. - diz abaixando os olhos.
 - O que quer dizer? - pergunto não entendendo.
 - Estávamos a beira de morrer - diz ainda com os olhos baixos. - Acabamos pegando uma doença grave, e temendo nossa morte, nossa mãe pediu a uma bruxa muito poderosa, que a devia um favor, que nós salvasse. Ela nós deu imortalidade, força, velocidade, imunidade a todas as doenças e o pior: a sede de sangue. Mas como não se pode violar as leis do universo sem um preço, viramos os monstros que somos hoje. Mas nós tínhamos escolha.  Podíamos  aceitar o feitiço ou aceitar a morte. Claro que eu não sabia que me tornaria isso, mas mesmo assim, tive medo e aceitei o feitiço. Mai não queria, mas aceitou para não me deixar sozinho.
 - O que aconteceu? - pergunto, porque sei de alguma forma que isso não é tudo.
 - Minha mãe também pagou o preço por mexer com magia tão poderosa. Ela e meu pai, que não sabia nada da história. - diz e uma sombra de arrependimento e tristeza cobre os seus olhos.
 - Não precisa contar se não quiser. - digo segurando sua mão.
 - Tudo bem. Tínhamos acabado de nós transformar. Só pensávamos em uma coisa, coisa pelo qual iríamos matar: sangue. Acabamos perdendo o controle e os matando. Foi a primeira e única vez que Mai se descontrolou. - diz segurando minha mão com tanta força, que eu temi que quebrasse os ossos. - A morte não nós levou, mas levou duas almas consigo. Meus pais.
 - Eu... sinto muito. - digo. Claro que estou chocada com o fato deles terem causado a morte dos próprios pais, mas não consigo não sentir pena. - Então, o lance da mordida para transformar é mentira?
 - Não. A maioria das transformações ocorrem assim. É a mais usada já que não se precisa pagar um preço. O feitiço foi só com as primeiras. - explica finalmente soltando minha mão.
 - Então, são os primeiros vampiros? - digo ainda mais perplexa.
 - Eu não diria os primeiros. Mas um dos mais velhos, sim. - diz. - Depois que perceberam que não precisavam recorrer ao feitiço, a mordida se popularizou bastante.
 Não consigo dizer nada, apenas o encaro. A história me deixou um pouco abalada, mas me fez entendê - lo melhor. Ele se culpa pela morte dos pais, por ser quem ele é e por ter arrastado a irmã pra isso. Por isso é tão frio e reservado. Então ele não é assim só porque teve o coração partido. Mas um pensamento me invade. Ele me contou isso mas se nega a contar tudo que aconteceu na noite que foi se encontrar com Davina. O que ele fez que poderia ser pior que matar os próprios pais? Reprimo um calafrio.
 - Achei que iria me odiar depois disso. - diz ao ver que segurei sua mão novamente. Apenas nego com a cabeça.
 - Você, ao mesmo tempo que é corajosa e uma das mulheres mais fortes que já conheci, é uma garota linda que precisa de cuidados. - diz com um brilho nos olhos. - Me lembra muito Mai.
 Reprimo uma careta ao ouvir essa comparação. Não que não tenha gostado de escutar o que ele disse sobre mim, mas me comparar a irmã caçula, por quem ele não sente nenhuma atração física e algo além de amor de irmão é frustrante. O que eu estou pensando? Queria ter algo a mais? Suspiro, completamente perdida. Ele parece não sentir minha frustração e encosta seus lábios em minha testa. Cada célula do meu corpo reage. Encosto meu rosto em seu ombro e sinto seu cheiro. Algo parecido com menta e outra coisa que não consigo identificar. Não fico animada com essa demonstração de carinho. Pelo contrário. Até meu irmão faria algo assim.
 Por sorte ou azar, não sei dizer, somos interrompidos pela chegada de Aila e Mai, com várias velas nas mãos. Estava na hora.

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