Você de Volta

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  Ao sair do salão comunal para os corredores frios do castelo de Hogwarts, Albus começou a pensar que havia sido uma péssima ideia ter saído de perto de Scorpius e ido a aula. Poderia ter faltado aula com ele e provar mais dos lábios que em pouco tempo se viciara e estava dependente daquele carinho. Scorpius ao todo era um assunto engraçado para Albus, pois ele sempre lhe pareceu diferente, não só no rosto por ter crescido, mas ele tinha uma certa postura diferente quando estava perto dele, era um sorriso de canto, uma tensão nos ombros, um olhar de brilho cálido e arrebatador, que Albus não entendia. Por que tantas notas sobre o comportamento de Scorpius, por que não se incomodava com os olhares diferentes que ele tinha? Ele se perguntava isso até antes daquela manhã, agora já tinha respostas suficientes, e o calor que Scorpius emanava quando estava perto dele, já tinha um nome, uma história e uma sensação, nostalgia. Albus havia percebido isso quando se afastou dele após a voz da diretora vibrar de dentro das paredes avisando que as fadas estavam presas. Quando sentiu o corpo de Scorpius se afastando do seu, quis imediatamente que ele voltasse a se sentar sobre ele, que o tocasse novamente, pois um vazio estava se formando a cada centímetro de distância e um sentimento de saudade. Albus sempre soube que alguma coisa do seu passado ainda estava sendo omitido pelos amigos e inclusive pela sua família, mas não imaginava que fosse um romance. Não haviam sido poucas as vezes em que ele perguntou sobre a sua vida naqueles anos perdidos, perguntara enfatizando a aliança, e todos sempre ficam nervosos, tropeçavam nas palavras e repetiam que aquilo havia sido uma coisa de Delphi para confundir sua cabeça. Óbvio que Albus não acreditou nem em um pedaço dessa história, mas sabia que alguma coisa estava por baixo daquilo. O sentimento agora estava vivo no seu peito, um calor que sempre procurou dentro de si, um pedaço faltando do seu coração, mas que agora se acomodava com a leveza de uma pena. Queria compartilhar isso, expor a alguém oque estava sentindo e até reclamar um pouco. Não podia falar com Scorpius. Não seria sensato lhe jogar na cara uma explosão de sentimentos adormecidos. Por isso, quando chegou na sala de Feitiços no segundo andar, procurou sua dupla de toda aula. Varreu a sala com a vista e só a encontrou depois de olhar detalhadamente os alunos, Clary estava escondida atrás de uma cortina de cachos castanhos, rabiscando em um papel, não parecia focada, estava mais para entediada. Albus cruzou a sala o mais rápido e pode, e se sentou na cadeira em frente à dela, se jogando no assento e deixando a bolsa no chão. Clary saltou de susto quando ele parou eufórico na sua frente, a pena que antes desenhava, estava agora flutuando no mesmo lugar onde sua mão a soltou.
-Interessante. -disse Albus esticando o braço e cutucando a pena entre as suas cerdas finas e brancas, e ela estremeceu como se sentisse cocegas. -Como...
-É uma Pena-Helio, da loja do seu tio. -disse orgulhosa, tocou a pena e ela levemente foi caindo até pousar na mesa. -Outro toque e ela volta a flutuar. 

  Albus afastou a mão da pena e colou as costas na parede. Brinquedos das Gemialidades Weasley eram muito perigosos, Albus inclusive tinha um histórico com brinquedos explosivos que ganhava de Natal do tio. Lembrava-se claramente do buraco no teto causado por um Trem-Lança-Surpresas, a surpresa era se o trem iria voar como um foguete ou se explodiria em corações de papel e mini fogos. O de James havia sido divertido, não só havia vindo corações de papel como também doces que foram atirados para todos os lugares do quarto e o de Lily viera corações e lacinhos voando. Albus nunca foi sortudo.  

-Tem certeza que não tem nenhum perigo nisso?  
-Diz na caixa que é segura. -ela disse pegando a pena e a analisando próxima aos seus olhos, espirrando logo em seguida quando as penas passaram debaixo do seu nariz. -Acho que não tem problema. -ela a deixou na mesa e se recostou na cadeira, o nariz levemente vermelho.
-Não era sobre penas que eu vim falar com você. -disse baixo e Clary ergueu as sobrancelhas curiosa. Albus se aproximou mais e apoiou um cotovelo na mesa dela, já ela se inclinou mais para perto. -Scorpius me contou tudo.
-O-O que? -sua voz tremeu e ela piscou várias vezes. -O que ele te contou? -seus ombros tensionaram, Albus sabia do que ela estava com medo.
-Eles não vão aparatar aqui. -tentou acalma-la, até poderiam chegar lá, mas antes disso Albus já teria a contado e mesmo assim não tirariam seu sorriso. -Quando você chegou no corujal hoje de manhã...
-Vocês estavam muito próximos. -ela interrompeu desconfiada. Conhecendo-a bem, a malícia estaria na ponta da sua língua, mas essa Clary era diferente da Clary que era maliciosa em relação a ele e a Scorpius, estava mudada desde que fora obrigada a esconder tudo, então se havia malícia, passou despercebida. -O que estava acontecendo ali?
-Ele estava me contando oque eu ainda não sabia e que a senhorita me escondeu. -reclamou num sussurro. -Devia ter me contado que eu e ele havíamos tido alguma coisa. Eu ter esquecido isso deve ter sido horrível.
-Eu não podia Albus! -ela disse também baixo, mas batendo as mãos na mesa sonoramente. Vários rostos se voltaram para eles e ela murchou atras da mesa. -Não podia.
-Eu estava quase beijando ele no corujal quando você entrou, quase estragou meu momento.
-Espera ele te deu um fora?! -ela voltou a se sentar ereta e arregalando os olhos.
-Não. Beijei ele no dormitório mesmo, -Albus riu e Clary ficou o encarando chocada. -O que? Eu precisava fazer alguma coisa. Ele... eu já queria ter feito isso antes, mas eu não podia.
-Qu-Quer dizer que vocês estão de volta?! -ela perguntou com a voz quase estridente, sendo abafada pelos outros alunos, então começou a o estapear no braço. -Sério?!
-Eu acho que sim. -ele riu, puxando o braço junto ao seu corpo e esfregando onde os tapas dela ardiam. -Se ele me quiser de volta.
-Ele não está nem doido que não querer. -aos poucos o sorriso dela foi alargando. Ela juntou as mãos à frente do corpo, mas o sorriso não sumiu, parecia se controlar para não levantar e o abraçar. -Eu fiquei muito mal quando soube que Scorpius tinha que esconder sobre vocês dois. -disse com a voz baixa, escorregando pela cadeira até estar com a nuca apoiada no encosto da cadeira e os olhos azuis o encarando lá de baixo como uma sereia sob o lago da Lula. -Ele ficou trancado sem dar notícia nenhuma nas férias, nós não podíamos te contar, ele não podia, foi difícil. -ela suspirou pesarosa, como se pudesse repassar todos os sentimentos daquele verão na cabeça e pudesse senti-los. Então levantou a cabeça e voltou a abrir o sorriso. -Você está quase de volta então. Scorpius sem você é esquisito.
Uma coisa branca passou voando pela cabeça deles, e automaticamente eles se abaixaram, mesmo Clary que já estava afundada na cadeira. Albus olhou para trás procurando o início daquela baderna, e viu que o professor havia entregado almofadas para os alunos. Albus não gostava de aulas práticas, normalmente algum objeto que não deveria estar voando, caia no seu rosto bruscamente. Aquele era o mesmo professor Flitwick, baixinho, na frente do quadro, sobre o seu banco auxiliador que com alguns comandos do professor o deixava mais alto que todos os alunos ao esticar as pernas do banco, ou podia abaixá-lo para o deixar no chão novamente. Ele estava escrevendo no quadro, com o banco deslizando para esquerda e direita para ajudá-lo, enquanto os alunos gritavam e brincavam atras dele. Albus se voltou para Clary, e ela já estava sentada mais apropriadamente.
-Dizer que ele sem mim é estranho, me faz achar estranho. -disse com um sorriso. -É difícil ainda entender que eu... namorava?
-Isso. -assentiu Clary.
-Namorava com o meu melhor amigo...-ele divagou na última palavra, que de repente não parecia se adequar muito a Scorpius. -Ou eu ainda namoro?
-Ah, aí é você e ele. -ela disse erguendo as mãos. -Vocês nunca terminaram oficialmente.
  -É, eu só esqueci dele, parte dele. -disse frustrado, os dedos correndo pelo couro cabeludo, os fios longos e escuros passando entre seus dedos. Quando suspirou, a sensação que teve foi que o seu peito estava pesado, o lado do coração, e na garganta também havia um nó. Não era de choro. Albus se conhecia bem, não era chorar que ele queria no momento. Aquela sensação era de quem queria gritar, estava cansado de tantas informações, achava que aguentaria tudo sem se sentir pressionado, mas agora tinha uma inimiga, um namorado, e uma amiga levada pelo ministério. Ele girou de volta para frente, encarando o quadro onde um giz flutuava desenhando as ações que deviam fazer para o feitiço do dia. Olhou esperançoso para o relógio na parede, mas não haviam se passado nem vinte minutos da aula. Então se apoiou nos livros à sua frente, os cotovelo ao lado das lombadas do caderno e no livro de feitiços, o queixo sobre a capa. Quando se inclinou para frente, sentiu a varinha no bolso interno da capa o espetar de leve, quase apenas para o certificar de que estava ali. Seria bom que pudesse aparatar, ou que soubesse, poderia ir a sala de Scorpius e o levar com ele para outro lugar, mesmo que não quisesse dizer nada.
  Conformado de que não havia outro jeito a não ser esperar que o relógio movimentasse os ponteiros, Albus puxou uma grande quantidade de ar, e o expirou lentamente. Mais tarde descobriria que a calma nunca foi parte da sua rotina.

Stigma - ScorbusOnde histórias criam vida. Descubra agora