Ministros e armadilhas

454 55 3
                                    

  Os três passaram pela escola direto para a sala da diretora, sem ao menos terem tempo para respirar. Hogwarts era grande, e Scorpius agradecia pelas correntes de ar dos corredores, ou estariam correndo por um forno.
  Só quando chegaram a sala que Scorpius percebeu que, haviam tido sorte por Minerva ter enfeitiçado seus pijamas. Má sorte para Susan. Ela não pensara duas vezes ao sair do dormitório, e acompanhara os dois até ali, vestindo um pijama de algodão verde com ursinhos.
  A sala parecia um pequeno conselho de guerra, Scorpius percebeu que até os irritantes ex-diretores haviam desocupado os quadros. Mais de uma dúzia de bruxos ocupavam a sala da diretoria, que parecia um tanto menor vista desse modo. Capas coloridas se roçavam no chão, um farfalhar sem fim. Scorpius suspeitou reconhecer alguns da sua breve visita ao ministério depois da ida ao passado, mas alguns eram completamente novos aos seus olhos. Uns vestiam roupas de frio, uma versão de outro país das capas londrinas antigas que usava-se em Hogwarts. Kimonos, burcas, turbantes, até roupas que lembravam a Scorpius leprechauns.
  Entre toda a balbúrdia, Minerva estava à escrivaninha, analisando os outros por trás dos óculos de meia lua, rugas de preocupação marcavam ao redor dos seus olhos e ela mantinha as mãos entrelaçadas com os cotovelos apoiados sobre a mesa. Seus olhos suavizaram ao passar por eles, mas a expressão era mesmo assim, rígida. Parecia incentiva-los a passarem pelos bruxos antes que os notassem.
  Não foi um problema para Susan, antes de Scorpius dissesse que deveriam ir, ela viu os pais e costurou correndo por entre os bruxos. Isso infelizmente chamou a atenção de alguns desatentos, que perceberam a porta aberta e os dois adolescentes parados no vão.
  Susan correu para os pais como se todo o mundo tivesse desaparecido. A senhora Martin se levantou e abriu os braços para receber a filha, seus olhos brilharam ao ver a garota, como se tivesse medo que ela não estivesse ali. O pai de Susan envolveu as duas com os braços, não era um homem grande, nem largo, mas a esposa era magra demais e Susan aparentemente havia herdado isso. Não era difícil para ele abraçá-las. Scorpius não conseguiu evitar uma dorzinha de inveja, seu pai nunca o receberia assim. Nunca teria uma família daquela forma. Se perguntava também se não seria melhor daquela forma, estava bem como estava. Claro, sentia falta da mãe constantemente, mas as vezes as coisas aconteciam por uma razão desconhecida. Ele preferia ver assim.
Ao seu redor, Scorpius podia sentir os olhares dos bruxos, muitos deviam ter os reconhecido das confusões recentes. Sabia que não eram direcionados a ele especificamente. Aparentemente Albus também estava notando isso. Tinha os ombros tensos e os olhos baixos, Scorpius chutava que o namorado estivesse tentando evitar chamar atenção, mas o estrago já estava feito e ele estava tão pálido como se estivesse prestes a vomitar. O casal em particular não era difícil de ser notado, os cabelos de Scorpius era platinados típico dos Malfoy, cor da espuma do mar quando se chocava com as pedras -essa foi a comparação de sua mãe fez quando visitaram uma praia na casa da avó, não muito longe, ele ainda se lembrava de como ela parecia radiante naquele dia -, os olhos de Scorpius eram cinza e tomavam o tom das coisas para si dependendo do que olhava. Como agora, estavam coloridos devido às capas dos bruxos. Já Albus era diferente, ele chamava atenção pelo ar Potter que carregava, haviam três características nessa família; ou eram ruivos, ou tinham olhos verdes como grama nova -essa era uma observação do próprio Scorpius. E havia uma característica especial, que não era de todos os Potter, mas apenas dada a dois deles. Carregavam um estigma, podia ser uma cicatriz, ou olhos vermelhos.
Scorpius pensou em pegar a mão de Albus e o levar para fora daquele lugar, mas Minerva lançou um olhar fumegante de detrás da sua escrivaninha. Parecia incomodada com tanta gente no seu escritório. Ela gesticulou para que se aproximassem também. Scorpius pôs uma mão nas costas de Albus o incitando a andar para frente. Os dois cruzaram o espaço entre os bruxos barulhentos -agora, Scorpius notava, o assunto era eles dois-, alguns tentando voltar às conversas de antes e outros mal escondendo a curiosidade sobre os dois.
Querendo ou não, eram famosos no meio bruxo.
Minerva se inclinou sobre a mesa e sussurrou:
-Fiquem alerta, seus pais chegarão em breve, por enquanto somos só nós. -ela olhou de esguelha para os homens e mulheres às costas de Scorpius, então suspirou. -Por favor, esqueçam oque eu disser assim que saírem dessa sala. -seus lábios mal se moviam, e seus ombros estavam tensos, como um gato analisando a água pela primeira vez. -Nem todos são confiáveis.
Ela voltou a se sentar adequadamente na sua cadeira. Os dois garotos ficaram confusos momentaneamente, mas contornaram a escrivaninha e sentaram nas cadeiras conjuradas pela diretora sem objeções.
O murmúrio era intenso entre os bruxos. Scorpius quase esqueceu de Susan, eram tantas informações para se adaptar que a família Martin quase se tornara um objeto na sala da diretoria. Eles já estavam sentados novamente, Susan dividia a poltrona com a mãe, que acariciava seus cabelos enquanto sussurrava algo para ela.
Por baixo da mesa, a mão de Albus se esgueirou até a de Scorpius. Seus dedos se entrelaçaram buscando apoio, e Scorpius era disposto, como sempre, a dá-lo todo o apoio que pudesse. Até deixaria que ele também dividisse a cadeira consigo se isso lhe deixasse melhor, mas a julgar pela frase da diretora, não podiam ficar tão relaxados.
Scorpius varreu a sala com o olhar, e parou perto da penseira, onde uma dupla conversava, o homem vestia vestes verdes esmeralda. Correntes prateadas pesavam no seu pescoço. A barba bem aparada emoldurava seu rosto, mas na cabeça estava ficando calvo. Ele conversava com uma mulher asiática, ela usava algo tão velho quanto o modelo das capas, usava um kimono vermelho, com desenhos dourados. Lembrava a Scorpius uma gueixa, embora ele duvidasse muito que aquela mulher se renderia a "servir" a alguém. Gueixas eram serventes, aquela bruxa parecia um tigre, com cabelos loiros puxados para trás sem um fio faltando e olhos delineados de preto.
Ela assentia para oque o homem dizia, ele parecia tentar lhe contar um segredo, ao contrário dela, o homem de verde tinha varias expressões. Sorria com facilidade, franzia a testa e revirava os olhos com oque ele mesmo dizia. Ela o induzia a falar com frases pequenas que Scorpius não ouvia, mas via seus lábios se mexerem. Haviam vários pares assim no salão, mas na maioria das vezes, eles se comportavam como o homem, conversando algo e cheios de razões. O tumulto se calou com o estalido da lareira. Foi alto, pedacinhos de carvão voaram queimando pela diretoria. Os bruxos abriram caminho. Minerva se levantou, permitindo uma pose mais elegante, não parecia mais tão tensa.
Um grupo estranho emergiu da lareira, um atrás do outro. Primeiro foi Hermione, a ministra, então Draco Malfoy, Neville Longbottom e Por fim Gina Potter.
Scorpius sentiu os dedos de Albus tensionarem sobre os seus, não sabia por quem ele estava mais nervoso, a mãe, os tios, ou... bem, seu sogro. Scorpius segurou um sorriso ao pensar nisso, afinal, era mesmo oque Draco era, não tinha escapatória.
-Chega. -a voz de Minerva ecoou, calando os demais. A varinha estava apontada para a sua garganta, assim como fazia em jogos de quadribol. -Obrigado. Creio que já saibam oque esta acontecendo.
-Sim. -respondeu um homem dando um passo à frente, tinha sotaque russo, cabelos pretos e vestia roupas pesadas para o frio. Estava com raiva, isso era óbvio nas suas narinas dilatadas. -Espero que tenham uma boa resposta para isso.
-Ministro Chernoff, -chamou Hermione. -Os chamamos aqui justamente para termos certeza. Espero que mais ajude do que julgue nossas atitudes.
  O ego dele pareceu ir desinflando. Scorpius ouviu o ruído vindo de Albus, parecia segurar um riso. Isso o confortou, estava com medo de Albus entrar em pânico com toda aquela atenção voltada para ele.
  -Bem, -prosseguiu Minerva. -Que sejamos educados então. Hermione Granger, Ministra de Londres, vai explicar a situação, espero que todos ouçam antes de falar.
  Todos permaneceram em silêncio.
Hermione deu um passo à frente para a meia lua aberta entre os bruxos em direção a escrivaninha.
  -A alguns dias, nosso departamento de Aurores vem recebendo notícias sobre bruxos desaparecidos.
  Um nó se fez no estômago de Scorpius, e ele supôs oque estava acontecendo com Susan, ele se lembrava de ela mencionar uma irmã. Sentiu as mãos ficando geladas.
  -Todos entre a faixa etária de quinze a vinte anos. Até então são quinze jovens desaparecidos; Reino Unido, Irlanda, Hungria, África, Grécia, Itália, Brasil, México, China, Rússia, Austrália, Japão, França, Índia e... se não me engano, Peru. -informou Hermione. Isso explicava o porque de tantos estrangeiros naquela reunião, e Scorpius começava a suspeitar o motivo de Albus e ele estarem presentes.
Hermione levou a mão para dentro do terninho que usava, tirou de lá um rolo de pergaminho novo e enrolado, lacrado com uma fitinha vermelha. Agora todos prestavam atenção. Scorpius viu com o canto do olho Albus se mexendo desconfortável, mas seus dedos negavam a soltar os seus.
  Alguns bruxos se inclinaram para frente, buscando ver algo a mais. Hermione tirou a fita e desenrolou o pergaminho. Limpou a garganta, então começou a ler.
  -"Saudações Ministra, soubemos dos ataques recentemente. Sentimos muito pelo que está acontecendo, tememos que nossos alunos também estejam em perigo. Nós da MACUSA, pedimos auxílio com esse caso. Queremos manter um perímetro de proteção dos nossos jovens. Portanto, pedimos que qualquer atualização dos casos nos seja passada. Já delimitamos um toque de recolher em todo o país. Espero que possamos ajudar com oque for possível. Agradecemos, MACUSA." -quando ela terminou, um murmúrio correu pelos bruxos como uma onda. MACUSA era como era conhecido o Ministério da Magia dos Estados Unidos.
  Scorpius estremeceu, conhecia o nome e sabia oque estava por vir. Isso porque lhe fora avisado antes, só não esperava que acontecesse daquela forma. Draco lançou um olhar para Scorpius que ele não soube decifrar, não era preocupação, mas também não estava o repreendendo por nada. Seus olhos cinzas, idênticos ao do filho, lancearam um olhar para além da varanda. Lá fora a noite estava tão densa, que era de se pensar que podia-Se esticar a mão e seus dedos ficariam sujos de tinta preta cintilante. 
  Hermione já estava com a boca parcialmente aberta quando Draco a interrompeu, dando um passo à frente.
  -Me desculpem... ministros. Mas alguém poderia me explicar a necessidade da minha presença? -disse Draco. Scorpius se inclinou para frente, era uma pergunta que também responderia as suas dúvidas.
  -Chegaremos lá, Malfoy. -disse Minerva, ríspida.
  Como um ex-aluno, Malfoy se calou sem reclamações. Acenou com a cabeça para Hermione como um pedido de desculpas e incentivo para que continuasse.
  -Como eu dizia, recebemos essa carta hoje mais cedo. Por isso a reunião de emergência.
  -Não poderia ter sido a tarde? -sugeriu um homem de turbante azul e vestes prateadas. Ele parecia realmente muito cansado, com olheiras que pareciam ter sido esculpidas em seu rosto de meia idade. -Me Desculpe, mas estava quase amanhecendo no meu país.
  -É muito urgente, ministro. -Hermione o repreendeu. -E só recebemos essa mensagem a poucas horas. A reunião seria amanhã, mas o desaparecimento de Sarah Martin foi o nosso gatilho.
  Ouviu-se um soluço cortar o ar no silêncio tenso dos bruxos. Susan estava abraçada a mãe, com os ombros tremendo novamente. Scorpius queria fazer alguma coisa para conforta-lá, era sua amiga, mas não podia deixar Albus e também estava curioso sobre o assunto. Lembrava-se do último "conselho" que havia participado, foi minutos antes de Albus sumir com Delphi, e foi a última vez que o viu são das memórias. Scorpius entendia como era perder alguém, a alguns anos tinha perdido a mãe, depois Albus se esqueceu sobre eles dois, então seu pai iria se casar para o deixar ainda mais na mão do que já estava. Scorpius inconscientemente suspirou. Debaixo da mesa, Albus deu um aperto nos seus dedos, perguntando-o silenciosamente se estava bem. Scorpius balançou a cabeça dizendo que sim.
  -O que pretende fazer, Ministra? -perguntou o homem de azul que conversava com a Garota-Tigre, como Scorpius havia a batizado. Ele tinha um sotaque levemente espanhol, mal podia se notar, Scorpius supôs que ele fosse o Ministro do México, já que era o único país mencionado que falava espanhol. -Já sabemos que isso tem algo a ver com oque aconteceu ano passado, sobre a filha de Voldemort.
  A lareira explodiu em chamas, lançando mais finas camadas de carvão queimado no ar. Houve um exclamação alta de todos. Scorpius viu um homem repreender o Ministro do México, e logo depois um movimento inquieto passou por todos. Scorpius e Albus não conseguia ver quem entrava na sala, mas isso incomodava muito os demais, menos três pessoas; Hermione, Minerva e claro, Draco.
  Abrindo espaço entre os bruxos ministros, um casal em vestes negras entrou na sala. A mulher estava tão loira quanto o marido, e os dois carregavam uma elegância que também era vista na postura de Draco. Narcisa e Lucius pareciam confusos em ver tanta gente, mas as vezes erguiam as sobrancelhas reconhecendo alguém e a outra pessoa logo desviava os olhos. Scorpius de levantou imediatamente ao ver os avós, estava surpreso, e lá do fundo, a angústia que sentia por saber como terminaria aquela reunião sumiu. Estava feliz por vê-los e que eles sorriam para ele, de verdade, daquele jeito que ilumina o rosto. Como pais deveriam sorrir para os filhos.
   Ficou um silêncio mais tenso ainda na sala. Scorpius sentiu a mão de Albus por trás da sua perna, pedindo-o para se sentar. Scorpius sentou, mas manteve os olhos nos avós.
  -Boa noite, para vocês. -disse Lucius, rapidamente, Scorpius pode ver a arrogância que tanto taxavam ao seu avô, ele realmente olhava os demais como vermes em um para-brisa. -Viemos ver nosso neto, não esperávamos uma... reunião.
  -Tem certeza disso, Malfoy? -perguntou Chernoff, ele sorriu com desdém para Lucius. -A marca não está ascendendo?
  -Chernoff. -chamou Minerva, a voz alta mesmo sem precisar de feitiço. O homem atendeu, mas a olhava com desprezo. Scorpius imaginou que se olhasse para ela assim algum dia, viraria um sapo. -Por favor, minha escola, não permito grosserias com meus convidados.
  -Obrigado, Minerva. -respondeu Narcisa.
  Draco também parecia confuso, mas a expressão logo se apagou do seu rosto.
  -O que querem falar com Scorpius? -quis saber.
  -Assuntos nossos. -cortou Lucius, com um sorriso que não era do seu feitio.  
Os Malfoy não pareciam incomodados por estarem interrompendo uma reunião, ao contrário, estavam ali como se estivessem participando desde sempre. A marca no antebraço deles chamava atenção. Até mesmo Scorpius olhava as marcas de vez em quando, para se lembrar de que os avós haviam sido pessoas ruins, assim como o seu pai, e que era isso que deveria evitar na vida. Ser mau não era genético. Scorpius podia ser diferente.
O crânio de boca aberta, deixava uma serpente escorregar pelo braço dos Malfoy adultos, era apenas uma cicatriz pálida em cada braço, mas ainda era visível. Albus se remexeu, aparentemente a pressão sobre ele estava aumentando.
  -Fiquem para o conselho, -convidou Hermione. -Quanto mais opinões, mais isso poderá ser resolvido. -Hermione decidiu em um tom calmo. -E sim, Ministro Cortez. É sobre Delphini que viemos falar.
-Ela que está roubando nossas crianças? -perguntou a Garota-Tigre.
-É oque suspeitamos.
-Então isso é trabalho do ministério inglês. Vocês criaram esse monstro, cuidem dela. -chiou um senhor com uma espécie de toga grega de seda amarela. Scorpius não entendia essa preferência por seda e cores fortes dos bruxos. Ele chutava que o homem era ministro italiano. Poderia ser o ministro grego, mas esse Scorpius já reconhecia, pois ele usava o mesmo estilo de toga, mas com desenhos de letras gregas na barra. -Essa Delphini é perigosa.
  Hermione olhou com desprezo para ele. Fios soltos do coque feito de última hora, agora voavam pelo o seu rosto o acariciando.
-Sim, Andreani. -ela concordou. -Perigosa é um adjetivo que cabe bem a ela. Porém, não é nossa culpa o descontrole da garota.
  -E de quem é? -perguntou ele.
  -Pergunte ao pai dela. -ironizou Gina. Estava calada até o momento, mas a raiva daqueles ignorantes estava sufocando-a.
  Scorpius viu a hesitação entre os bruxos, sobre falar oque pensavam ou não. Ele mesmo estava temendo a tia e a mãe de Albus. A Garota-Tigre foi quem deu o primeiro passo, literalmente. Ela sorriu simpaticamente para as duas e gesticulou com a mão para que continuassem.
  -Nos contém seus planos, Ministra. O Ministério de Magia da China está ao seu dispor.
  Uma pessoa inteligente, pensou Scorpius. A atitude foi notada às carrancas, mas aos poucos eles foram cedendo e logo todos pareciam dispostos a ouvir. Luna Lovegood, que até então estava quieta e parada ao lado de Neville observando a situação, limpou a garganta e sorriu. Chamava atenção por ser ela mesma, com tranças nos cabelos loiros, e vestida com uma macacão jeans cheio de broches, por dentro uma camisa rosa vibrante. Ela caminhou até ficar ao lado de Hermione e juntou as mãos na frente do corpo.
  -Ministros, o plano que formulamos consiste em...
  -Uma armadilha.
  A voz que interrompeu Luna assustou Scorpius, pois não foi nenhum dos ministros, mas Albus. Ele estava tão quieto, apertando seus dedos sob a mesa, mas agora algo despertava nele, algo que Scorpius não conhecia. Lembrou-se do Albus temeroso ao falar durante a reunião de família na sua própria casa, dizendo que era melhor calado. Algo de diferente acontecia, ou ele estava tão incomodado que só não suportava aquilo.
  Seus olhos vermelhos brilhavam na direção de Luna. Não estava mais tentando esconde-los, talvez o objetivo fosse mesmo que os ministros ficassem tão incomodados quanto ele. Scorpius não os achava feios, lhe lembravam Delphi, mas definitivamente estava os achando mais charmosos nos últimos dias. Quando Albus o prendeu na grama mais cedo, seus olhos vermelhos fitaram o rosto de Scorpius, brilhantes e felizes. Lembravam a Malfoy um lobo, um animal entre as folhagens durante a noite, sombrio e interessante. Feroz.
  Albus se ergueu da cadeira. Soltando os dedos de Scorpius automaticamente.
  -Querem fazer uma armadilha para Delphi. -continuou Albus.
  -Por Merlim, rapaz. -exclamou Fernando. -O que aconteceu com os seus olhos?
  Albus se limitou a um sorriso estranho. Como se caçoasse da ignorância do ministro.
  -Aconteceu oque esta prestes a acontecer com todas essas crianças desaparecidas.
  -Albus... -chamou Gina.
  -Não, mãe. -ele a interrompeu. -Estou duvidando dessa visita aos Estados Unidos desde o início. Querem nos usar de isca, não é?
  Hermione ficou pálida, seus lábios se apertaram numa linha.
  -Albus, planejávamos contá-los logo. Só não tivemos tempo.
  -Sabe como isso poderia dar errado? Quantas maneiras? Poderiam até matar duas escolas inteiras por descuido. -a voz de Albus ecoou na sala. Scorpius pensou nunca tê-lo visto tão ousado. Tentou bloquear esses pensamentos, mas eles fluíam assim que olhava para o namorado.
  -Do que ele está falando, Ministra? -perguntou Chernoff, ouvir que algo planejado por ela iria dar errado parecia agradá-lo.
  Quem respondeu foi Minerva, com o nariz erguido.
  -Planejávamos levar os alunos de Hogwarts para Ilvermorny. Assim como trouxemos ano passado alguns alunos para cá. Existe um perímetro de segurança assim como nós temos, eles estariam seguros.
  -O garoto diz que não. -Chernoff continuou. -Acabou de dizer que não queria ser usado de isca.
  -Ministro, -disse Albus virando-se para o russo, que parecia entretido com Hermione sendo contrariada pelo sobrinho. -Eu nunca disse que não queria.  
  Todos pareciam confusos, franzindo a testa. Scorpius decidiu que não deixaria o namorado ser taxado de louco sozinho. Queria ir embora, e queria que a decisão fosse tomada de uma vez por todas. Dependendo dos ministros, passariam a noite ali brigando. Ele se ergueu entre Albus e  Minerva. Seus avós olharam confiantes para ele, diferente de Draco que pareceu enjoado.
  -Antes de sumir Delphi me disse que algum dia nos entraríamos novamente, em MACUSA. Não sei se ela se referiu ao prédio em si, ou ao país que o Ministério governa. -disse Malfoy, odiava atenção em excesso, ter tantos olhos em si era incômodo.
  Albus suspirou. Não parecia cansado, mas aliviado. Talvez porque Scorpius também tinha decidido se levantar como ele.
  Scorpius continuou.
  -Ela ainda precisa de nós, talvez todos nós, não sei para que. Se formos até lá, ela virá até nós. -ele hesitou em prosseguir, pois não queria chamar mais atenção tanto para si como para Albus. Mas devia isso a outras crianças. -Os Agouros, ou augoreiros, de Delphi, têm uma tatuagem do pássaro Agouro, na nuca. Se são eles que estão sequestrando essas pessoas... não vai ser tão difícil de encontrá-los.
  -Além de que eles têm olhos... bem, vermelhos. -Albus completou.
  Os bruxos de mexeram inquietos, agora todos fincavam os olhos em Albus, alguns com expressões desconfiadas. Scorpius queria derrubar aquela mesa sobre eles, como poderiam achar que Albus era um Agouro? Suas mãos abriram e fecharam em punhos nas laterais do corpo. Queria socar um dos ministros, em especial, Chernoff.
  -Então... estão se oferecendo para serem as "iscas"? -perguntou o Ministro do México, Cortez.
Albus e Scorpius trocaram um olhar rápido, não precisavam de muito tempo para decidir. Um olhar era suficiente, assim como um toque sob a mesa. Scorpius sabia oque Albus queria, não era ajudar as crianças desaparecidas, mas vingança contra Delphi. Um mal que levaria ao bem, totalmente necessário.
Os dois balançaram a cabeça concordando. Scorpius achou ter visto Hermione suspirar aliviada, mas devia ter sido coisa da sua cabeça. Chernoff no canto direito da mesa de Minerva, riu sem ter nenhuma graça. Scorpius já não simpatizava com o homem, também achava que não era o único. O ministro olhou de Hermione para Scorpius, então enxugou uma lágrima no canto do olho.
-Pode me dizer a graça, Ministro Chernoff? -Scorpius perguntou antes que Hermione se pronunciasse. O sorriso de Chernoff foi desbotando ao encarar a expressão séria de Scorpius.
-Me surpreende você ser um Malfoy. -ele cruzou os braços e virou-se para Lucius. -Seu neto me parece mais honroso do que você. Porém, não nega que é um de vocês.
-Pare com isso, Chernoff. -sugeriu a Garota-Tigre, revirando os olhos entediada. -Não é hora para desavenças antigas.
-Está completamente certa, Ministra Akame. -concordou Lucius. -Está na hora de decidirmos planos futuros, oque será feito para evitar desastres maiores.
  -Devia ter tentado evitar os desastres maiores que você causou. -As narinas dele estavam dilatadas novamente.
  Ele tentou ir até Lucius, mas dois outros ministros o seguraram pelos ombros e o arrastaram de volta para o seu lugar.
  -Soltem-me. -ordenou, e os dois homens se afastaram
  Talvez fosse algo Malfoy gostar de ver os outros fracassando, pois os quatro tinham os cantos da boca curvados levemente. Scorpius voltou a atenção para Hermione, que olhava o relógio e batia nele com o canto da unha. Seus olhos se encontraram quando ela ergueu o rosto, e uma comunicação breve passou silenciosa entre eles.
  -Então, já que está decidido que atrairemos Delphi para os Estados Unidos... todos podem declarar que estão de acordo?
  Várias mãos se ergueram no ar indicando que estavam de acordo. Porém, Akume quis dar uma última palavra. Olhou para o chão pensativa e então desviou para Scorpius e Albus.
-Vocês tem certeza? Digo, vocês foram capturados da última vez, se não me engano.
-Foi um descuido, pensei que eu poderia lidar com ela sozinho. -Albus respondeu, forçando para manter a voz calma, Scorpius acreditava que ele era o único a perceber isso. -Não posso ainda. Vai chegar o momento em que vou encontrar ela de novo, espero que eu e Scorpius tenhamos ajuda suficiente dessa vez.
-Estamos dispostos a ajudar. -disse Cortez em nome de todos.
-Obrigada. -Hermione disse, realmente parecendo grata. -A todos. Damos nossa reunião por encerrada.
Minerva deu um olhar de esguelha para os garotos, com um sorriso de canto orgulhoso. Scorpius gostou de estar fazendo a coisa certa, embora fosse perigosa. Teriam que enfrentar Delphi, de um jeito ou de outro, ela ainda não tinha acabado de destroçar eles. Ela queria mais, e Scorpius não ia deixar que ela tivesse. Estava decidido a isso.

Stigma - ScorbusOnde histórias criam vida. Descubra agora