Epílogo

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5 anos depois

A mala de Ana Júlia estava lotada de roupas amassadas que tinham sido jogadas ali de última hora – não que ela não soubesse da viagem há semanas, mas por ter muita preguiça naquele corpo que não tinha nem 25 anos mas já sentia-se como uma idosa de 70 (consequência de trabalhar como uma escrava).

Mesmo que tivesse se passado exatas duas semanas daquele convite (ou convocação) inesperada, Anajú ainda não tinha trabalhado sua mente suficientemente para não surtar. Achava que por ser uma mulher de quase vinte e quatro anos ela já teria maturidade para reencontrar seu passado perturbador, mas a vida mostrava mais uma vez que nada é do jeito que ela queria, ou planejava. Naquele momento, olhando as várias peças de roupas espalhadas pela cama de casal do seu apartamento minúsculo e uma mala com alguns vestidos e calcinhas todas reviradas, ela se sentia mais uma vez uma garotinha de dezessete anos que se aventurava pela noite com sua melhor amiga enquanto tentava esquecer o ex-namorado.

Despreparada. E com muito medo do que o futuro lhe ofereceria dali para frente.

Ela vestiu uma calça jeans que a deixava com as pernas extremamente bonitas – devido ao peso que conseguira ganhar naqueles anos de extrema luta para frequentar academia e comer bem por conta de um garoto que namorou durante a época da faculdade e que fazia educação física. O namoro não tinha dado certo, mas pelo menos a força de vontade de malhar ainda habitava aquele corpo algumas vezes na semana. Vestiu uma blusa de manga comprida e depois um moletom por cima porque o clima de São Paulo não estava nem um pouco quente como o que ela fora acostumada por anos morando no Rio de Janeiro.

Ana Júlia já morava na capital paulista que nunca dorme há um ano e meio devido a uma proposta maravilhosa de emprego, mas ainda sentia falta durante todos os segundos de sua vida de morar a minutos da praia, do calor que fazia durante as vinte e quatro horas do dia e, principalmente, da sua família. Se o emprego pelo menos valesse a pena ela poderia ficar um pouco mais feliz com a distância, mas o salário extremamente alto não condizia com as expectativas que ela tivera ao se formar.

Achava que iria trabalhar na ONU (ou em qualquer organização em prol dos direitos humanos), por isso fizera ciências políticas com mestrado nas áreas sociais. Mas agora se via presa em dar aula para adolescentes mimados e insuportáveis e não estava nem perto de alcançar seu sonho de poder trabalhar com garotas que sofriam ou sofreram qualquer tipo de abuso.

Por esse motivo estava tão desesperada para viajar. Por isso mesmo quando surgiu aquele convite ela aceitou sem pensar nas consequências.

Mas agora, quatro horas antes do horário do voo, caia em cima de Ana Júlia várias dúvidas, incertezas, inseguranças, medos e as possíveis consequências daquela atitude impensada.

Ela não via Mozart há um pouco mais de cinco anos e agora estaria indo reencontrá-lo do nada. De um dia para o outro estava indo para o país que ele morava desde aquela despedida do aeroporto. E eles iam, finalmente, se encontrar.

Parecia uma coisa natural que os dois se reencontrassem depois de anos, mas não existia nenhuma naturalidade naquela situação.

Depois que Mozart viajou para fazer seu mochilão com os amigos, eles ainda mantiveram contato. Algumas vezes o ruivo mandava mensagem contando um pouco mais sobre as cidades que conhecia e mandando algumas fotos para que ela vivesse aquele momento um pouco com ele. Mas Mozart decidiu não voltar quando o dia da viagem de volta chegou. Ele estava se dando bem de diversas maneiras e preferiu estender um pouco mais aquela aventura. De seis meses ele estenderia para um ano, mas um ano viraram cinco. Deixou no Brasil sua família morrendo de saudades e junto uma garota que o amava intensamente, que sofreu muito durante o primeiro ano.

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