Senhor Sequestrador

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*6 meses antes*

Hoje está sendo um dia de merda.

O meu chefe filho da mãe pensa que eu sou um capacho.

Adam, faça 30 cópias coloridas desse documento.

Alan, pegue meu terno na lavanderia da esquina.

Alex, ligue para minha mãe e diga a ela que  chegarei atrasado para o jantar.

Arthur, vá até a cafeteria e traga meu Macchiatto de sempre.

Deus! Nem do meu nome ele se lembra!

Com essa última ordem, pego meu casaco que estava pendurado na cadeira e saio do escritório.

Trabalho como estagiário, há três meses, na Dalton's Advertising, a melhor empresa de Publicidade & Propaganda de toda New York. Conseguir um estágio aqui foi, ao mesmo tempo, a melhor e pior coisa que aconteceu na minha carreira – principalmente levando em conta que me formei há tão pouco tempo.

A melhor porque as experiências que posso vivenciar aqui complementarão tanto o meu currículo, que, futuramente, as empresas brigarão para me ter como membro de sua equipe.

A pior porque, bom, como vocês podem perceber, meu chefe é uma cadela.

A missão de vida dele é tornar a minha vida um verdadeiro inferno.

Que diabos! Como vou conseguir alguma experiência indo comprar o café preferido dele?!

Mas, tudo bem, não posso reclamar de tudo. O salário é uma maravilha e as reuniões de que participo são fantásticas.

É extraordinário ver como as propagandas são criadas totalmente do zero. Ver como, de repente, juntando ideias aqui e ali, uma campanha é formada. Isso é totalmente louco e maravilhoso.

Ao sair da Dalton's Advertising, ando quatro quarteirões até chegar a cafeteria. E, quando chego lá, olha que maravilha!, a fila está quilométrica.

Suspirando, faço meu pedido no balcão, pego minha ficha de espera e me sento na única mesa disponível que encontro, para aguardar meu pedido ser chamado.

— Desculpe, essa cadeira está ocupada? – ouço uma voz feminina dizer.

Ao olhar para cima, vejo uma mulher sorrindo para mim.

Linda.

É a primeira coisa que penso.

Jovem.

É a segunda coisa.

Solteira.

É o que percebo ao notar nenhuma aliança em sua mão.

— É que o café está completamente lotado e preciso de uma mesa para sentar. Tenho que terminar um trabalho de anatomia para entregar hoje.

Ao dizer isso, noto que está equilibrando um notebook, um livro e um café nas mãos.

— Claro – digo –. Quer dizer, pode se sentar, sim.

— Oh, obrigada. – novamente, ela sorri para mim.

Ela é alta, mas nem tanto quanto eu; magra, mas não como essas mulheres por aí sem nenhuma curva; tem uma pele linda cor de chocolate, cabelos cacheados que vão até um pouco acima de seus ombros e olhos castanhos bem expressivos.

Hum... gostosa.

Não dirige os olhos mais nenhuma vez para mim depois de sentar-se à mesa. Está completamente concentrada em seu trabalho, dividindo sua atenção entre a tela do notebook e seu livro.

Após 10 minutos, seu celular toca.

Ela olha a tela e solta um suspiro.

— Oi, Will. – escuta por um minuto – Não, não estou no trabalho. Hoje é a minha folga esqueceu? – mais um momento de silencio – Você sabe que não posso viajar com você esse final de semana. Tenho uma apresentação importante para fazer na segunda-feira, e um TCC para trabalhar – outro suspiro –. Será que não pode ver o meu lado só uma vez? Você já tem uma carreira construída. Deixe-me, por favor, correr atrás dos meus sonhos, do meu futurodessa vez o silencio demorou mais –. Sim, eu sei que você me ama. E eu também te amo, você sabe disso. Mas, às vezes, essa sua falta de compreensão acaba desgastando nosso namoro. Olha, façamos o seguinte: hoje à noite, quando eu sair da faculdade, passo na sua casa e conversamos direito. Podemos remarcar a viagem para o próximo final de semana, o que acha? – uma espera curta, e seu sorriso cresce no rosto – Ótimo! Eu te amo, muito! Tchau.

Ouço com atenção sua conversa.

Coitada, deve estar em um relacionamento difícil. Entendo completamente sua angustia: apesar de não estar em um relacionamento amoroso no momento, minha relação com meu chefe é completamente abusiva. Ele quer que eu esteja disponível 24 horas do dia, 7 dias por semana, para seus serviços. É totalmente desgastante!

E, ainda por cima, parece que o namorado tem total controle sobre suas decisões. Convenceu-a direitinho a fazer o que era de seu próprio agrado. Coitadinha.

— Senha 139, compareça ao balcão de entrega. – escuto uma voz eletrônica dizer.

Olho para minha ficha, e vejo que essa é minha senha.

— Com licença, mas essa é minha deixa. – faço graça e sorrio em sua direção. Mas ela nem ao menos olha para mim. Está sorrindo, olhando para uma mensagem que acabara de receber no celular.

Desmancho o sorrido e franzo o cenho.

Vou em direção ao balcão.

— São $ 10,90, senhor.

— Coloque na conta do senhor William Dalton, por favor.

— Certamente, senhor.

Antes de sair, olho novamente para a mesa onde aquela mulher está, agora novamente mergulhada em seu notebook.

— Não se preocupe, docinho, eu ainda te livrarei desse namoro abusivo e a tornarei minha.

E com isso, saio da cafeteria.

Bem me quer, mal me quer.Onde histórias criam vida. Descubra agora