Resort MTT

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NITCH

Não mencionei nada do que havia acontecido ao meu pai.

No dia seguinte, quase no fim da tarde, escoltei o rei numa visita à Alphys, que havia convocado-a para uma reunião importante sobre as almas humanas.

Porém, segundo Asgore, eu parecia abatido, e podia tirar o restante da noite de folga. Então fui convenientemente dispensado do serviço por algum tempo

O que veio a calhar… por que eu precisava esfriar a cabeça.

Ainda não acreditava que Karin havia mesmo tido a audácia de reaparecer em minha vida, depois de tudo que havia feito.

Por mais que eu realmente tivesse percebido seu arrependimento, a mágoa e o rancor que eu havia guardado, durante todo aquele tempo, não minguaria com simples desculpas. A última pessoa em que minha mãe havia confiado havia se desfeito de uma criança, e isso não era passível de perdão.

Tudo poderia ter sido diferente.

E Aayrine… diabos, por que ela não entendia? Depois de todos os conflitos, era de se esperar que aquela garota entendesse, melhor que ninguém, o quanto era complicado ter que lidar com os fantasmas do passado.

Podia culpá-la? Eu me sentia como uma bomba-relógio, lutando para não explodir por inteiro.

Estava voltando para casa, suspirante, quando percebi que estava passando em frente ao MTT Resort – a nada singela hospedaria de Mettaton.

Talvez por ter passado a maior parte do dia de jejum, sem qualquer apetite, o fato é que meu estômago roncava de fome naquele momento. Então decidi fazer uma visita à lanchonete do hotel.

O atendente sobressaltou-se quando entrei no Empório Burguer.

Era um gato alaranjado, trêmulo e ansioso, que arregalou o olhar em minha direção. O fato de eu estar de armadura, provavelmente, não ajudou o pobre monstro a se acalmar.

- Bem-vindo ao Empório Burguer da marca MTT – ele me cumprimentou, sorrindo de maneira forçada – lar do Glamburguer…. - pigarreou, piscando nervosamente – no que posso ajudá-lo, caro cliente?

Sentei diante do balcão, cabisbaixo.

- Um Starfait… por favor – pedi, desanimado.

O rapaz assentiu, começando a encher uma taça de Starfait para mim.

- Você parece bem mal, carinha – comentou, me encarando de soslaio, num tom de voz esganiçado.

Apanhei a taça que ele me inclinou, bebendo tudo num gole só. Distraído, pedi outra dose, conforme continuava a falar.

- E estou, colega – confessei, repentinamente desesperado para desabafar – minha vida anda uma loucura – funguei, virando mais um pouco da bebida na boca.

- Mulheres? Amigos? - sugeriu, erguendo a sobrancelha.

Bufei.

- Um pouco dos dois… eu diria.

- Eu te entendo, carinha – murmurou o jovem monstro, enchendo minha taça novamente – amizade é só outro nome pra escravidão, colega. E mulheres… - sacudiu a cabeça, arrepiado – são criaturas imprevisíveis. Quase sempre maldosas. Vá por mim… entendo um pouco sobre elas.

O garoto parecia o retrato do sofrimento. Estava lentamente começando a simpatizar com aquele rapaz.

- Parece ter passado por alguns perrengues também… - supus.

- Ah… pois é, carinha – nervoso, repôs mais um pouco de Starfait em meu copo novamente vazio – o que falo é por experiência própria.

Vi um laivo de solidariedade em seu olhar.

Foi o que bastou para eu, por alguma razão, confiar naquele atendente tremebundo. E contar à ele tudo que se passava em minha cabeça naquele momento.

Conforme eu desabafava, ia bebendo cada vez mais, sem perceber que o composto me deixava cada vez mais tagarela e desinibido, o que fez com que eu contasse até mesmo as coisas menos inesperadas.

Burguerpants – como descobri se durante a conversa, na qual ele também havia começado a se abrir – me ouvia atentamente, parecendo minimamente preocupado com o sétimo Starfait que me servia.

Num impulso irracional, retirei o elmo, sorrindo para meu novo amigo. Burguerpants pareceu surpreso, analisando minhas feições com curiosidade.

- Filho do rei, é? - ele riu fracamente – e essa Aayrine… - me encarou, pensativo – não é aquela loura bonitona da Guarda Real?

Ele corou, ficando ainda mais nervoso.

Por alguma razão, o modo como Burguerpants havia se referido à Aayrine me incomodou. Porém, graças à minha recém-adquirida embriaguez, percebi que seria indelicado mencionar isso.

- Ah… tecnicamente sim – concordei – ela… me confunde – as palavras saíam de minha boca sem que eu percebesse, já desconectadas do meu enfraquecido raciocínio – ela é forte… é corajosa… mas também é irritante… e um tanto… - franzi a testa – admirável….

- Admirável?

- É… - ofeguei, sacudindo a cabeça, sem conseguir pensar direito – é… i-incrível...

Nós dois nos assustamos quando a porta do Empório se abriu, dando passagem para uma forma familiar.

- D-droga…! – Burguerpants chiou baixinho.

Mettaton nos encarou com suas lentes quadriculadas, quase se revirando em sua rodinha de tanta raiva.

O Hotel já vai fechar! - vociferou – e tem a droga de um guarda bêbado no meu Empório! - virou-se para Burguerpants, que tremia de desespero – seu inútil! Vai ficar sem o pagamento desse mês! - acrescentou, sibilante – e vai fazer hora extra o resto do ano também…!

Aborrecido, apanhei a bolsa em minha armadura, tacando-a na caça do robô.

-V-você  disse… - grunhi, soluçando chorosamente - o quê? D-dê uma folga de uma s-semana para ele… - guinchei com a voz pastosa, vincando a testa - e t-todo esse dinheiro é seu, falou?

Mettaton só faltou ter um curto-circuito, assim viu todas as moedas de ouro que haviam dentro da bolsa que eu havia arremessado em sua cara robótica.

Ora… - sua voz tornou-se impressionantemente mais doce e carinhosa, o que me fez reprimir uma risada, enquanto Burguerpants o encarava embasbacado – e não é que o garoto tem razão? Talvez seja melhor ir para casa, queridinho… o que acha disso? - Mettaton arrulhou amavelmente  – feche tudo… e leve nosso amigo com você, está bem?

Assim que Mettaton deu as costas e saiu do Empório, senti o rapaz me agarrar num abraço eufórico.

- Obrigado, carinha! Obrigado!

- Ah… n-não foi nada… - falei, envergando a cabeça para o lado devido à tontura – a gente… p-pode ir agora…?

- Claro – nunca havia visto um monstro tão feliz na minha vida – já vamos, carinha… eu nem acredito!

Dali em diante, não demorou para que nós dois deixássemos o MTT Resort, tomando rumo em direção à casa dele em Snowdin. Recoloquei meu elmo, embora tivesse a bizarra vontade de me desfazer de toda a armadura.

- Obrigado… de verdade, carinha – ele não parava de agradecer, conforme caminhávamos – eu vou passar uma semana inteirinha em casa!

Eu já não ouvia metade das cosias que ele falava. A bebedeira havia sido demais para mim, fazendo com que tudo parecesse fora de sintonia, me deixando imprudentemente aéreo.

Acompanhei-o até que estivesse em sua própria casa, e comecei a fazer o caminho de retorno pelo bosque, mal conseguindo andar sem esbarrar nos troncos das árvores.

E, naturalmente, sem a lucidez que costumava ter quando sóbrio, não percebi que tinha uma companhia.







O Espadim e a Manopla - Uma História de UndertaleOnde histórias criam vida. Descubra agora