02. Hard to get used to

537 39 4
                                    

Narrado por Joe.

Não acho que vá chegar um dia da minha vida que simplesmente eu vou ter superado. Não me imagino esquecendo o que passou.

A vida depois do acidente ainda era algo que eu estava aprendendo a lidar. Aprendendo a viver. Depois de treze anos convivendo com Colin, sem exceção de um dia, para em questão de horas perde-lo, é algo difícil de me acostumar. Eu e Colin sempre fomos uma coisa só. Sempre colados, sempre um do lado do outro, apesar das inúmeras diferenças. Colin era bom! Não que eu seja uma pessoa má, mas Colin era muito melhor que eu. Melhor do tipo que dava aulas voluntárias em orfanatos, e reforços de matemática –também de graça- em bairros menos favorecidos. Melhor do tipo que se declarou apaixonado para a garota que ele conhecia há uma maldita semana!

Perto de Colin eu era apenas o amigo mulherengo e engraçado, enquanto Colin era o rapaz que merecia suspiros orgulhosos e sorrisos junto com frases do tipo "Colin é um ótimo rapaz". Não que isso me incomodasse. Eu sempre gostei de ser o lado negro da força. Colin sempre brincou que éramos como Yin-Yang. Repetindo, não que eu fosse uma má pessoa, mas eu sempre tive um jeito mais... Ousado.

Sorrio ao lembrar das inúmeras vezes que Colin nos descreveu como Yin-Yang. E logo depois, com o sorriso se desmanchando, vem novamente o pesar no peito. Era gradativo e constante. Já faz dois meses de sua morte, e não há um dia que isso não aconteça. Eu tento ao máximo não pensar nele. Tento ao máximo não pensar na situação, mas é difícil. Sempre penso, e sempre sinto o mesmo pesar. Isso quando não estou no meio de algo muito legal e penso por dois segundos algo como "Preciso contar para o Colin", e então a situação me atinge como um soco no estomago. Não posso contar para o Colin. Não posso nem mais ver o Colin, depois de treze anos em que passamos colados.

Ainda tenho pesadelos onde vivo novamente aquele acidente. Ainda acordo no meio da noite e perambulo pela casa, sempre parando na varanda e encarando a casa do lado. A casa que parecia abandonada, mas que já foi cheia de vida. Já foi o lugar para muitos churrascos, festas na piscina, maratonas de filmes, tardes de videogames e de muitas risadas.

Pensar na casa me faz pensar em Demi e novamente sinto meu peito pesar. Ainda lembro da sua reação no hospital. Ainda lembro do seu estado no enterro. Ainda lembro, principalmente, nas últimas palavras de Colin, poucos segundos antes dos aparelhos começarem a apitar e de Colin dar seu último suspiro. "Cuide de Demi" ele disse.

Cuide de Demi. Cuide de Demi. Cuide de Demi.

Eu cuidaria se a doida não tivesse sumido sem nem avisar. Tive que saber por Bob que ela estava em Londres com o pai e a madrasta. Ok que eu e Demetria não temos um convívio muito amigável, mas tínhamos um convívio! Resumidamente, ela era uma chata que só implicava com qualquer atitude minha. Enquanto Colin tinha paciência com as burradas que já cometi, Demi guardava tudo em um arquivo imaginário chamado "Mancadas do Joe" e adorava jogar na minha cara quando achava uma oportunidade. E acreditem, a maldita sempre achava uma oportunidade. E eu adorava irrita-la, já que isso era a coisa mais fácil que existia.

Ainda lembro da primeira vez que eu a vi. Com o rosto vermelho, um belo decote e segurando a risada, enquanto eu e duas amigas nos divertíamos um pouco em uma cama, num quarto de fraternidade na faculdade. Isso é outra coisa que eu adoro usar para irrita-la. Demi, mesmo invocada, ainda morre de vergonha por causa da situação que me conheceu. Ainda acho impagável a cara que ela fez quando Colin nos apresentou.

- Tudo bem, Joe? –ouvi e pulei, focando meu olhar novamente na atendente do bar que eu estava-

- Sim. –respondi e forcei um sorriso antes de erguer meu copo e tomar mais um gole da minha cerveja-

- Quer mais uma? –ela perguntou apoiando os cotovelos no balcão e sorrindo educadamente-

- Não, boneca. Acho que vou para a casa. –eu respondi e suspirei-

Era para essa noite ser uma daquelas noites para espairecer. Queria sair para beber, me divertir, e conviver novamente com o mundo fora da minha casa. Queria ser o antigo Joe de novo. O Joe que não havia perdido o melhor amigo. O Joe que realmente sabia se divertir. Acontece que ter reencontrado Demi na farmácia me deixou meio perdido. Vê-la tão quebrada, sem nem disfarçar o quanto estava sofrendo me fez pensar no quanto eu estava fingindo. E pior ainda, me fez lembrar que eu deveria cuidar dela. Devia isso a Colin.

Mas, o que mais roubava meus pensamentos no momento, era o teste de gravidez que Demi havia comprado. Uma parte –pequena- dentro de mim, pensava que seria legal Demi estar grávida. Seria uma parte de Colin eternizada em nossas vidas, e eu ajudaria Demi a cuidar do bebê. E sim, eu tenho uma imaginação bem fértil. Mas enfim, a outra parte –a maior- deseja que Demi não esteja grávida. Ela não teria capacidade emocional para criar um filho de Colin. Eu não teria capacidade emocional para ajudá-la. O bebê viveria em torno de duas pessoas quebradas.

Uma vez Demi e Colin começaram a falar sobre filhos enquanto eu e Zoey, amiga de Demi, preparávamos umas bebidas. Lembro que eu falei para eles que ficaria com a criança caso eles morressem. Óbvio que eu estava brincando, já que a ideia de não conviver com eles era algo surreal na minha cabeça. Lembro de Demi fazer uma careta e negar prontamente, enquanto Colin ria e concordava. Sorrio ao lembrar de Zoey dizendo que ela e Bob não deixariam eu ensinar coisas erradas para a criança.

- Mas é tão cedo. –ouvi novamente sua voz e voltei a encara-la, saindo dos meus devaneios. Devaneios esses que eram muito frequentes nos últimos tempos-

- Pois é. –falei, mas me levantei, tirando minha carteira do bolso da calça e lhe entregando alguns dólares- Até mais, boneca. –falei sorrindo-

- Não suma por tanto tempo, querido. –ela falou e eu apenas acenei saindo do bar-

Dirigi cuidadosamente para minha casa. Outra coisa que havia mudado depois do acidente. Eu não estava dirigindo no acidente, e sim Colin. Ele estava na velocidade correta, e dirigia com cuidado também, mas a pista estava escorregadia e chovia muito. E eu, que sempre dirigi sem muita paciência para leis de trânsito, agora era o motorista mais correto que Chicago já viu. Isso depois de quase um mês sem chegar perto do meu carro, apenas por medo. Traumas. Estava sendo difícil me acostumar.

 Estava sendo difícil me acostumar

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

****

Espero que estejam gostando. Obrigado pelos votos e comentários! Até o próximo capítulo. <3

Stay with me [JEMI]Onde histórias criam vida. Descubra agora