Capítulo 20 - No Pasta Della Nonna

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I

Rebecca deixou o hotel dizendo que encontraria Milena, mas não fez questão de dizer para onde seguiria. Permaneci sentado na poltrona do saguão por um tempo, absorvendo o significado do que eu acabara de descobrir.

Milena e Bartolomeo estavam apaixonados. Por serem primos, os dois sofreram a oposição dos pais de Bartolomeo, especialmente por parte da mãe, a Sra. Adelaide. Plenamente justificável em função dos dogmas religiosos dos italianos. Em seguida, o casal passou a se
encontrar clandestinamente no clube de xadrez de Veneza. Novamente descobertos, houve a sugestão de que toda a família viajasse para Roma. E a sugestão havia sido dada por Rebecca, a tia de Bartolomeo e de Milena.
Por que ela e não a Sra. Adelaide, que sempre se mostrara contrária à união dos dois primos? Qual era o interesse da Srta. Rebecca em aparentar uma falsa união daquela família em passeios turísticos em Roma? Qual era o sentido daquilo tudo?

Parece que a iniciativa desgastou a vontade de Bartolomeo em insistir no relacionamento amoroso com Milena. Afinal de contas, Milena não escondeu o
ressentimento que teve com o flerte do jovem com uma jovem norueguesa do hotel. Será que era essa a intenção da Srta. Rebecca ao sugerir uma cidade como Roma? Queria Rebecca mostrar a Bartolomeo que Milena não era a única mulher que existia no mundo? Era possível, uma vez que Bartolomeo não parecia ter a mesma personalidade decidida de Milena.

Absorvido por esta hipótese, uma frase dita pela Srta. Rebecca ressurgiu em minha mente: "Que mal sabe falar italiano direito. Talvez sequer seja encontrada
novamente". Rebecca havia falado sobre Helga Flink, a turista jovem norueguesa que encontrou o corpo de Bartolomeo no Coliseu e que, por coincidência, estava hospedada no Constantino Palazzo Hotel.

Levantei-me da poltrona e dirigi-me até o saguão para conversar com Beatrice, a recepcionista que tinha facilidade em reconhecer as pessoas. Ela estava sozinha na recepção.

― Preciso que a senhorita me responda a mais uma pergunta.

― Se eu puder ajudá-lo, senhor...

― É sobre aquela norueguesa que deixou o hotel anteontem ― Fiz uma pausa e indaguei: ― Sabe se outras mulheres nórdicas se hospedaram aqui desde sábado?

― Desde sábado? ― espantou-se Beatrice. ― Eu posso pesquisar para o senhor.

Seus dedos deslizaram por uma pilha de fichas cadastrais.

― O senhor procura por jovens nórdicas, não é? ― Ela disse astutamente. ― Há uma dinamarquesa no primeiro andar... Mas essa aparentava uns setenta anos.

Ela continuou pesquisando silenciosamente o registro de hóspedes.

― Também encontrei uma belga, duas russas, uma alemã e uma australiana. Mas eu me lembro de cada uma delas. São todas senhoras de meia-idade, beirando os sessenta anos. Não são nórdicas, mas também eram loiras como a Srta. Helga Flink. Não é por ela o seu interesse?

― É sim. Você tem uma percepção muito boa e parece uma ótima fisionomista ― elogiei-a.

― Eu passo boa parte do dia inteiro olhando diversos rostos que entram e saem pelo hotel. Acho que desenvolvi esta minha habilidade de reconhecer rostos como forma de transformar algo que poderia ser monótono em algo mais dinâmico. Rostos possuem traços comuns e podemos classificá-los. A Srta. Helga Flink já foi localizada?

― Infelizmente, ainda está desaparecida ― lamentei.

A outra recepcionista retornou à recepção e eu me retirei do hotel, não sem antes agradecer mais uma vez à Beatrice.

Helga Flink era a única jovem norueguesa hospedada no Constantino Palazzo naquela semana. Helga Flink era uma jovem que, de algum modo, ameaçou o romance entre o jovem Bartolomeo e a temperamental Milena. Helga Flink era a única testemunha do assassinato de Bartolomeo. Helga Flink era uma jovem desaparecida há três dias e que mal fala italiano direito.

Movimentos perigosos (COMPLETA)Onde histórias criam vida. Descubra agora