I
Garçons deslocavam-se apressadamente por entre as mesas do restaurante. Não era uma tarefa assim tão fácil impressionar a diversificada clientela de um dos locais mais frequentados por turistas e nativos da cidade.
La Pasta della Nonna era um restaurante típico de Trastevere, região de Roma, situada ao sul do Vaticano. Tradicionalmente, o cardápio consistia nas mais variadas opções de massa italiana. Embora eu seja suspeito para tecer elogios à culinária do meu país, não tenho dúvidas
da capacidade de acolhimento do Della Nonna (este é o apelido carinhoso adotado pelos frequentadores do restaurante). Raramente alguém deixava o local insatisfeito com o serviço ou com a qualidade das refeições. Exatamente por esta razão, naquela noite de julho de 1983, a cena que eu testemunhei atraiu a minha atenção.O desconfortável calor daquele fim de tarde deve ter suscitado nas pessoas um desejo coletivo de ocupar qualquer local que oferecesse um mínimo de conforto térmico, algo que o Della Nonna fazia com maestria. O resultado óbvio era que o Della Nonna se tornava rapidamente um dos primeiros restaurantes a ter sua capacidade esgotada em dias quentes como o daquele
domingo Aliás, seria desnecessário dizer que a sensação de abafamento dominava as rodas de conversa. Alguns comentários exagerados chegavam aos meus ouvidos.― Graças ao meu bom Dio que aqui tem ar condicionado. Pensei que fosse derreter! ― bradava uma senhora roliça com forte sotaque português.
― Vocês acreditam que o doido do meu irmão sugeriu que seria uma boa ideia pular no Tibre para se refrescar? ― divertia-se uma jovem italiana com ar de
universitária e que dividia com mais duas amigas a mesa em frente à qual eu havia sentado.― Devo ter bebido uns vinte copos de cerveja ― gabava-se um homem com uma voz cavernosa em uma mesa ao lado.
Sorri.
Fiquei pensando em como uma adversidade tão comum como aquela proporcionada por uma mudança climática era capaz de influenciar o humor alheio.
Talvez tenham decorrido somente uns dez minutos quando uma cliente perdeu as estribeiras por causa de um
pequeno atraso do seu pedido. Visivelmente preocupado com o escândalo, o garçom inclinou a cabeça e ouviu pacatamente os protestos que lhe eram dirigidos.Surpreendi-me ao notar que todo aquele destempero provinha de uma mulher, cuja aparência era
tão discreta que eu sequer havia percebido a sua presença no restaurante até aquele momento. Rapidamente culpei o intenso calor pelo momentâneo descontrole daquela bela e jovem mulher. Ela estava acompanhada de um homem jovem e igualmente discreto. Ele parecia incomodado com toda aquela cena vexaminosa e tentava a todo custo aplacar os ânimos da moça.― Calma querida! Não se exalte por tão pouco, Fiorela! ― dizia o homem enquanto segurava a mulher pelo braço e exibia um sorriso amarelo para o garçom.
Não demorou muito tempo para que a própria jovem caísse em si diante do escândalo do qual havia se tornado a protagonista. Enrubescida, ela desculpou-se
com o garçom e sentou-se novamente à mesa. A jovem
voltou sua atenção para o seu acompanhante e baixou o tom de voz para lhe dizer meia dúzia de palavras. Não pude ouvi-las.Obviamente deve ter sido algo bem sério, pensei naquele momento, pois, logo em seguida, ela pendurou sua bolsa no ombro e retirou-se do Della Nonna com cara de poucos amigos. Vendo-se ignorado por seus apelos, o homem chamou o garçom que os atendera, deixou algumas cédulas sobre a mesa e saiu do restaurante seguindo o rastro da jovem que o abandonara.
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Movimentos perigosos (COMPLETA)
Mistério / Suspense(...) ― Ganhar tempo? ― perguntei, ainda perplexo com o mistério feito pelo inspetor. ― Sim. Tudo indica que esta dama branca não estava lá junto à vítima por mero acaso. Fizemos uma busca no apartamento em que o jovem morava aqui em Roma e encontr...