Capítulo 16 - Organizando pensamentos

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Naquela noite, ao retornar ao meu apartamento, senti uma leve fraqueza no corpo. Preparei um sanduíche de queijo apenas para enganar o estômago, pois não sentia fome alguma. Suspeitando que meus sintomas eram compatíveis com os de um resfriado, apressei-me a tomar uma ducha fria para conter o avanço de uma possível febre. Dormi logo depois do banho.

Entretanto, minha prevenção não impediu que eu acordasse no dia seguinte com uma forte febre. Mal pude levantar da cama, e limitei-me a ingerir umas doses de vitamina C e antitérmico.

Aquilo me frustrou um pouco. Eu estava decidido a continuar investigando aqueles intrigantes casos de assassinato com os quais me envolvera casualmente. E, naquelas condições, dificilmente eu poderia sair de casa.

Aliás, eu sequer tinha forças para me debruçar sobre a máquina de escrever e dar início à introdução do livro que havia prometido ao Sr. Salvatore. Aquilo era irônico, uma vez que eu ainda não havia me resignado com a inflexibilidade do meu editor, que insistira em que eu mantivesse o estilo literário que prometera escrever: o livro de xadrez, abordando-o somente como esporte.

E, no entanto, embora meu amigo Langoli, que também havia assinado contrato com o Salvatore, tivesse me mostrado as evidentes razões financeiras e contratuais para a postura firme do editor perante a minha contraproposta, eu não conseguia me desvencilhar das ideias que fervilhavam em minha cabeça e que me induziam a preencher as páginas do meu livro sobre xadrez com um enredo de um romance policial.

Naquela manhã em que acordei febril, aqueles pensamentos pareciam ainda mais propensos a me perseguir. Como eu queria dividi-los com minha esposa Doralice! Estava tão cansado na noite anterior que apaguei pouco depois das nove horas da noite. Era possível que ela tivesse telefonado e eu não tivesse ouvido o telefone tocar na sala. Decidi que o melhor que eu podia fazer era organizar aqueles meus pensamentos de modo metódico e lógico em minha mente. Talvez eu pudesse notar algo que até então havia me passado despercebido.

Dois homicídios haviam sido cometidos em um intervalo de apenas dois dias. Coincidentemente, as vítimas eram dois jovens italianos. O que tornava o caso mais intrigante era a presença de peças de xadrez no bolso dos mortos em ambos os casos: uma rainha branca e uma torre preta.

Um deles, o Sr. Stefano Castini, era casado com a bela e discreta Fiorela Castini, uma jovem advogada que dava expediente em um escritório na região de Trastevere. O cadáver do Sr. Castini fora encontrado boiando à beira do Tibre na mesma noite em que o casal discutiu publicamente dentro do restaurante Pasta Della Nonna devido a um motivo aparentemente banal: o atraso de um pedido feito a um garçom.

Eu esquecera o fato por um tempo até que, no dia seguinte, depois de reencontrar o meu velho amigo Langoli, a Srta. Henriqueta, secretária do Sr. Salvatore, despejara nos meus ouvidos as suas opiniões a respeito da morte do Sr. Stefano Castini, o que despertou meu interesse em ler o jornal com o qual Langoli me presenteara momentos antes.

E assim aconteceu o meu encontro com o inspetor Carboni e o meu conhecimento a respeito de fatos não divulgados oficialmente sobre o crime. O Sr. Stefano Castini teve a garganta cortada antes de ser atirado no Rio Tibre. Em sua casa, havia sido encontrada uma carta anônima mencionando a vantagem obtida por um adversário ao capturar a rainha no princípio de uma partida de xadrez. E havia exatamente uma rainha dentro do bolso da vítima. O inspetor Carboni temia que aquele não fosse o único caso e decidiu preservar as pistas para não causar pânico generalizado na população. Por fim, ele propôs que eu o auxiliasse de modo extraoficial naquele intrigante caso.

Outra coincidência me fizera reconhecer o disfarce com que Fiorela Castini comparecera à delegacia. Arrependida, a viúva de Stefano Castini decidira me contar alguns fatos pessoais como as recentes discussões do casal, motivadas por um ciúme incomum por parte da jovem, e a iminente vinda de seus pais de Napoli.

Movimentos perigosos (COMPLETA)Onde histórias criam vida. Descubra agora