O clube de xadrez ficava em uma rua estreita a dois quarteirões da Fontana di Trevi. A fachada do
pequeno sobrado que abrigava o clube era de um cinza insípido e discreto. Se Fiorela não me tivesse passado o endereço, confesso que dificilmente eu notaria a minúscula placa de bronze que encimava o topo do portão de ferro da casa. A inscrição "Scacchiera", que em italiano significa "xadrez", sugeria claramente que se tratava de algo relacionado àquele jogo.Bati de leve no portão. Mas não houve resposta.
Uma senhora idosa de aparência frágil que varria a calçada de uma pequena loja de antiguidades ao lado do clube me abordou gentilmente e disse:
― Não se acanhe ― disse ela em tom de voz bem baixo e arrastado. - Basta puxar o trinco por dentro. Eles devem estar muito concentrados. É sempre assim.
― É aqui que funciona um clube de xadrez? ― Procurei me certificar usando o mesmo tom de voz baixo.
Os lábios da pequena senhora se entreabriram em um sorriso:
― O senhor está interessado em apenas jogar xadrez?
Estranhei a pergunta daquela senhora de quase noventa anos. Ela estaria insinuando algo ou estaria gagá?
― É o que se faz em um clube de xadrez, não é? ― Respondi educadamente, sem alimentar aquele comentário.
― Per Dio! Depois dizem que eu pareço uma velhinha inocente ― queixou-se a senhora, que voltou a varrer a calçada e se afastou dali.
Entrei.
O interior do sobrado destoava da imagem discreta sugerida pela fachada acinzentada. Aliás, algo que não me surpreendeu tanto. Faz parte da tradição dos italianos não valorizar a fachada das residências; o que lhes importa é cuidar do interior. E aquilo se aplicava perfeitamente àquele clube de xadrez. Após passar pelo estreito vestíbulo que unia o portão de ferro ao salão principal, pude constatar a sutil criatividade do arquiteto que planejou a construção do interior do clube. O piso era revestido por azulejos de mármore preto e branco como se representassem as casas de um tabuleiro de xadrez. As pilastras em estilo neoclássico davam um toque aconchegante ao ambiente. Dispostas em uma simetria milimétrica, oito mesas redondas com tampo de mármore bege ocupavam o salão. Em quatro destas mesas, pude observar pares de oponentes duelando concentradamente em partidas de xadrez.
Eu me preocupei em caminhar fazendo o menor ruído possível. No entanto, o grau de concentração dos presentes era tamanho que deve ter restringido a audição daquelas pessoas somente ao som emitido quando uma peça era movida no tabuleiro de xadrez. Minha presença era totalmente ignorada.
Sentei em uma mesa vazia próxima da entrada do salão. Então percorri o olhar mais atentamente pelas quatro pessoas que estavam sentadas de frente para mim. Nenhum rosto me pareceu familiar. Eram todos homens de meia-idade. Dois deles eram obesos. Os outros dois, cadavéricos de tão magros. Pelo que pude depreender dos jogadores que estavam de costas para o meu campo visual, tratava-se de dois homens e duas mulheres. Um dos homens, o que parecia mais jovem, vestia uma camisa cinza um pouco larga e tinha a cabeça coberta por um boné da mesma cor.
Permaneci ali por um tempo, pensativo. E, por mais que eu pensasse, não conseguia encontrar um motivo plausível para os receios externados na história contada por Fiorela Castini. Eu não conseguia imaginar como a máfia italiana se infiltraria em um local como esse.
É claro que isso seria possível se uma daquelas pessoas fosse um membro da máfia disfarçado rastreando os passos de alguém sob o comando de ordens
superiores. Sim. Isso era possível. Mas, para isso, eu teria que me aproximar mais do grupo. Eu teria que disputar uma partida com um deles. Embora pudesse soar como a busca de uma agulha em um palheiro, ao menos, em tese, eu já sabia qual era o palheiro.
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Movimentos perigosos (COMPLETA)
Misteri / Thriller(...) ― Ganhar tempo? ― perguntei, ainda perplexo com o mistério feito pelo inspetor. ― Sim. Tudo indica que esta dama branca não estava lá junto à vítima por mero acaso. Fizemos uma busca no apartamento em que o jovem morava aqui em Roma e encontr...