Capítulo XL - ZECA

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Eu não sei o motivo, mas não consegui pregar os olhos naquela noite. Já tinha rolado para todos os lados possíveis e o sono não parecia estar muito a fim de mim. Foi quando ouvi uma voz na minha cabeça. Uma voz adoravelmente familiar.

- Zeca? Você está acordado? - chamou a Malu.

- Estou? - respondi, levantando-me imediatamente. – Aconteceu alguma coisa?

- Não, eu só preciso conversar...

- Me espera aí – disse, enquanto vestia uma camiseta.

Em menos de um minuto eu já estava lá fora. Ela estava sentada na calçada, de cabeça baixa. Usava uma jaqueta enorme com capuz e, assim que sentei ao seu lado, desejei que eu também estivesse vestindo uma. Estava muito frio.

- Você veio aqui sozinha? É perigoso.

- Na verdade, não é – tornou. – Se alguém quiser fazer alguma coisa comigo, eu apenas o convenço do contrário. Você já sabe que eu sou uma ótima persuasora.

Sorri, pois ela tinha razão. Eu já tinha sentido na pele todo esse poder de persuasão e garanto: foi assustador!

Permanecemos alguns minutos em silêncio. Ela estava distante, pensativa, encarando o chão, o que me levou a crer que alguma coisa tinha acontecido.

- Eu quero muito acabar com eles, Zeca - começou, ainda sem olhar para mim – Eu sempre quis, na verdade. Mas agora é diferente. Eu quero ver aquele lugar ruir.

- Eu sei. É o que eu mais quero tam...

- Não. Você não sabe - interrompeu-me, encarando-me com uma expressão sombria. – Eles acabaram com a nossa infância, mas o Bruno... Eles acabaram com a vida dele.

Percebi que ela estava tremendo, mas não era de frio. Era de raiva. Uma raiva tão grande e tão violenta que me assustou. Eu nunca a vi desse jeito.

Então ela me explicou brevemente sobre o que o Bruno lhe contara. E, mesmo conhecendo e odiando com todas as minhas forças aquela gente, fiquei chocado. Eu nunca tinha parado para pensar por essa perspectiva.

- Até hoje eu não sei porque nós dois fomos separados, mas se algo diferente tivesse acontecido, poderia ter sido eu, Zeca. - continuou, com a voz embargada. – Eu quero que cada um deles pague por todo o sofrimento que nos causou.

Eu estava chocado com tudo o que eu ouvi, mas ela estava destruída. Ela não parava de chorar e soluçar, abraçando as próprias pernas e vê-la naquela situação me partiu o coração. Abracei-a de forma meio esquisita mesmo, e com um pedaço de braço a menos, meus abraços normalmente não são muito diferentes disso.

- Nós vamos fazer eles pagarem por tudo isso - disse, tentando acalmá-la. – Eu prometo.

Levou um tempo até que ela finalmente se acalmasse, mas enfim ela voltou ao normal. E com normal, quero dizer que ela já estava tagarelando sobre um monte de assuntos. Ela falou sobre o trabalho, sobre nosso plano, sobre as noites mal dormidas e sobre mais coisas que eu nem ao menos me lembro. Isso, porque depois de um certo tempo, eu estava com tanto frio que parei de prestar atenção no que ela dizia.

- Você está tremendo! - exclamou.

- Não... é... - tentei argumentar.

- Por que não avisou antes? - tornou, fingindo não ter me ouvido.

Ela tirou um braço da jaqueta e colou do meu lado. Então, antes que eu pudesse negar, ela já estava vestindo a outra manga em mim.

- Essa jaqueta é do Bruno – sorriu. – Não vai servir perfeitamente, mas vai quebrar um galho.

Na verdade não serviu nem de longe! Ficou esticada e tivemos que quase ficar um de costas pro outro, para que ela ficasse com uma manga no meu braço direito e a outra no braço esquerdo dela. No final das contas, ficou tão ridículo que acabamos caindo na gargalhada e, para minha surpresa, descobri que rir esquenta.

- Já está amanhecendo – bocejou. – Acho que é melhor eu ir nessa, antes que me descubram aqui.

- Pois é...

Tirei a minha manga da jaqueta e levantei da calçada. Quando ela levantou, a jaqueta parecia ainda maior nela, o que a deixava engraçada.

- Tem uma coisa que eu queria te falar há um tempo, mas antes você estava namorando e eu não sei se isso soaria bem, mas nós somos amigos há tanto tempo... - começou ela, toda sem graça, encarando o chão.

- Uma coisa...

- Na verdade é um convite que eu queria te fazer. - Ela estava corada, o que eu achei engraçado.

- Convite?

- Você quer sair pra comer um pastel comigo? - perguntou, tudo de uma vez só.

Acho que ela estava tão sem jeito, que se não falasse tudo de uma vez só, acabaria desistindo. Eu achei tudo isso muito engraçado e acabei rindo dela, que não gostou nada da minha atitude.

- Você está rindo?

- Você está toda engraçada! - defendi-me.

- Estou nada! - resmungou, colocando as mãos na cintura. – Mas e aí? Você quer ou não?

É claro que eu queria. Eu não sou nenhum idiota. Mas como eu ia entrar numa lanchonete maltrapilho desse jeito? E se me deixassem entrar – o que já seria um milagre – como eu pagaria? A Malu que me perdoasse, mas eu não tinha a menor condição de ir.

- Eu já sei no que você está pensando. - Lançou-me um olhar acusador. – E eu já pensei em tudo. A gente não precisa comer na lanchonete, se você não quiser. Tem uma pracinha bem lá na frente e é bem legal.

- Você sabe que eu não tenho dinheiro, Malu.

- Deixa de ser chato, Zeca! - ralhou, revirando os olhos. – Eu pago. Aceite isso como um pagamento irrisório por tudo o que você fez por mim até hoje. E eu não aceito não como resposta. - Ela virou as costas e seguiu pela calçada até a esquina. – Amanhã à tarde eu te espero. Lá em casa. E nem sonhe em não aparecer.

E foi embora antes que eu pudesse dizer qualquer coisa.

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Só eu estou sentindo cheiro de shipp no ar? Será que finalmente Zelu vai concretizar?

Capítulo de quinta postado!! :D

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