Kenji/Vulto

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Nuvens cor de rosa estavam por toda parte. A linha do horizonte se findava e ainda era possível ver. Mas os pés que caminhavam estavam firmes. Sentiam o solo. O olhar atento do menino depois de um tempo em deslumbre, percebeu: Eram flores de cerejeira. Milhões de flores cor de rosa em um imenso jardim de cerejeiras. A beleza se tornou alucinante. Estava tão claro. O tempo todo era claro. Não existia tempo. O menino caminhou e apressou os seus passos e começou a correr e a gargalhar. Dava pulos e caia sobre as flores que deixavam a queda macia e gostosa. O aroma misturado ao ar era a mais pura perfeição. O menino notou  algo cinza, concreto. Passou a mão descobrindo algo do qual não podia imaginar. Um túmulo. Sakura kan. O nome era conhecido. O doce nome de sua mãe. Não havia mais sorriso e  nem pulos para dar. Percebeu outro túmulo ao lado com o nome Tashi kan. Sim, seu pai. O menino suspirou e em um acesso de raiva começou a espalhar as cerejeiras revelando outros túmulos. Miuki Kan. Sua avó. Ele segurou a respiração. Aquela senhora representava a sua própria vida. Tudo o que ele sabia sobre amor, ela que o ensinara.  Continuou seu serviço de revelar o que as cerejeiras escondiam. Túmulos. Mais túmulos. Muitos túmulos de pedra. Frios. Com nomes que ele não conhecia. Estava em um cemitério. Mas não chorava. Não sentia seus sentimentos, estava frio como o concreto e tão morto quanto os cadáveres ali enterrados pelas flores de cerejeira.

Kenji acordou.

A casa amanheceu triste. Ninguém tinha notícias da colega desaparecida. Só que era uma escolha dela. Kenji não compreendia como alguém poderia fugir de algo tão bom. Um lar. Uma família. Estava com saudades de sua avó e até mesmo de ir a escola, mas se sentia em casa. Em família e isso era mais que suficiente.

Aprender a se tornar um herói não era fácil. Kenji jamais imaginaria que salvar gatos das árvores, ajudar senhorinhas bem velhas, ou até mesmo impedir acidentes necessitava de tanto treinamento. Eram horas de simulação com Kendra, lutas com César e com os outros amigos. Nem percebeu quando começou a emagrecer. Até aumentou de tamanho, mesmo que não fosse só alguns centímetros. Estava crescendo.

Com imensa saudades de sua avó, Kenji conseguiu permissão para visitar a senhora. Estava ansioso. Tão ansioso que ignorara  por completo o estranho sonho que teve. Já vivia o mais belo de todos os sonhos se tornando um herói.

O bairro japonês estava lindo! O  cheiro de pastel fazia o estômago de Kenji roncar. Queria também comer Yakisoba. Mas o preparado por sua avó. O sabor era inigualável.

Desceu a rua de sua casa. O portão estava aberto. Estranhou. Sua avó sempre deixava tudo fechado. Repetia o tempo todo que a cidade era perigosa. "Deve saber que vim" — pensou. Para a senhora Miuki, Kenji estava em um internato sendo preparado para ser alguém muito importante. Ela não devia imaginar as simulações malucas de Kendra. O japonês riu. Subiu as escadas, mas não sentiu o cheiro de comida no fogo. A mesa estava servida com o Yakisoba da feira.

— Vovó? — Nada em resposta. Caminhou para o quarto e lá estava ela. Deitada na cama. Kenji correu para seu lado. Suas mãos estavam frias.

— Kenji. — disse a velha com a voz fraca.

— Vovó! O que aconteceu. — começou a chorar.

— A vida é efêmera. Meninos se tornam velhotes. — Tossiu.

— Me perdoa por ter te abandonado. Vou ficar aqui agora. Eu prometo.

— Você não me abandonou. Não estou largada, menino. Estou velha! Só isso.

— Mas está sozinha. — sentiu a mais profunda culpa. Não suportava falhar com alguém que o amava tanto.

— Kenji para com isso. Chega de lamúrias. Ainda estou viva. A bolsa que você recebe em sua nova escola está me ajudando muito. E não estou sozinha. — Quando Miuki falava daquele jeito tudo tomava outro sentido. A velha de cabeça dura, não gostava de chorinhos. Ensinará Kenji a ser um homem, forte e destemido.

Vol. 1 Heróis do Amanhã - NOVA ERA   Onde histórias criam vida. Descubra agora