39. Nazismo alemão

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Uma preparou um chá, a outra uma bacia com água e ervas calmantes para que Ana descansasse os pés. Carmen, carinhosamente, abraçou a jovem e deu início à infeliz história.

— Está mais calma? Acho que sei por onde começar. Ana, querida, olhe nossos braços – falou, enquanto levantava a manga comprida da blusa e erguia as pulseiras.

As outras ciganas fizeram o mesmo, deixando o pulso à mostra. Havia uma marca gravada, como se fossem animais.

— Gorro tem uma dessa! Perguntei o que significava e ele disse que era uma tatuagem de família.

As mulheres se entreolharam.

— Não é. O que temos são marcas de identificação. Fomos prisioneiros de nazistas alemães.

— Ai, meu Deus!

— Eu gostaria que você tivesse conhecido a nossa família. Um povo feliz, livre e que preservava com muito amor as tradições. Sempre fomos prestativos e nunca roubamos um. O pai de Gorro era Tarim, um bom líder. Talvez seja difícil de acreditar, Ana, mas o seu marido já foi a grande alegria do nosso acampamento. Gorro era um jovem muito sorridente, andava descalço e tocava gaita o dia todo. Lindo, hem? Muito mais bonito do que agora!

Todas sorriram.

— Um dia, a polícia chegou à Áustria e disse que nos daria uma terra desocupada. Acreditamos. Antes de nos prender em Dachau, mataram metade dos Rosenlonks. Muitos jovens foram assassinados porque era fracos para trabalhar como escravos. Tínhamos que ficar muitas horas em pé. Quem cansava morria. Passamos fome, frio e tortura. Gorro viu a mãe morrendo depois de um experimento. Abriram a barriga dela sem anestesia – a mulher chorou ao lembrar de tudo – Eu não quero continuar...

— Por favor, não continue! São lembranças muito infelizes mesmo – disse a jovem, muito abalada – Eu não fazia ideia desse sofrimento todo.

— Vimos a morte face a face. Todos os dias. Fomos resgatados por anjos ingleses que pretendiam libertar apenas uma família judia que, por sorte, apegou-se bastante a Zulka, que era só uma criança. Fugimos, mas o resto da família ficou para morrer lá. Acho que você deveria saber disso para entender um pouco a cabeça de Gorro. Chegamos aqui sem dinheiro nenhum, como mendigos. Ele, da noite para o dia, tornou-se responsável por todas nós. Um dia, o destino colocou a sua tia na nossa vida e ela veio com a maldita proposta. O alvo era uma alemã. Logo uma alemã! Gorro aceitou, pegou o dinheiro e o resto você já sabe.

Eu não sabia mais o que pensar quando ouvi essa parte da história. Mas não é incrível? A vida é muita complexa! Você pensa que a forma que vai criar seus filhos não interessa a ninguém, mas a verdade é que estamos todos entrelaçados. As minhas escolhas, por exemplo, podem afetar o seu destino para sempre. Você quer um exemplo? O casamento. Várias vezes eu me peguei olhando para meu marido e questionando, seja para elogiar ou para criticar, a educação que minha sogra deu. E os pais do presidente? Sabiam eles que o próprio filho influenciaria uma nação inteira? Ana de Luz também deveria ter pensado muitas coisas naquela noite, porque simplesmente pediu para dormir ali mesmo, a fim de evitar contato com Gorro, pelo menos naquela noite. 

Ana de Luz e o Circo da Alegria Onde histórias criam vida. Descubra agora