O italiano e a pantaneira

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Capítulo V – O italiano e a pantaneira

O amor dos pais de Ana era proibido, porque as famílias eram de realidades diferentes.

Lakina de Luz morava com a mãe e os irmãos numa casinha humilde à beira do Pantanal. Era ainda bastante moça e usava roupas muito gastas. O pai dela, Antônio de Luz, era o peão mais antigo da fazenda São Francisco e passava dias fora de casa, servindo à família Villela.

Confesso que não sabemos detalhes desta história - nem eu nem Ana -, mas o fato é que o filho mais novo do fazendeiro foi atacado pelo próprio cavalo, e seu Antônio o salvou de uma tragédia. O herói, porém, ficou bastante ferido.

Os Villela, transbordados de gratidão e compaixão, assumiram o compromisso de cuidar do peão até que ele ficasse bom. O jovem Matheus, que foi poupado, fez questão de tratar o homem como um rei. E, pela primeira vez, seu Antônio pôde dormir num quarto que era quase do tamanho da sua casa e comer as três refeições do dia no horário certo. No entanto, esses privilégios não o deixavam a vontade, pelo contrário, como era orgulhoso, sentia vergonha. Um dia, até chegou a ouvir uma conversa um tanto desagradável:

- Tudo bem que ele salvou o menino, mas não vocês não acham que estão exagerando nos cuidados com o velho? - perguntou um amigo da família.

- Então o senhor acredita que minha vida vale menos do que uma cama e alguns pratos de comida? - questionou o rapaz.

As regalias não pararam. A família de seu Antônio foi convidada a visitá-lo, com direito a passar as tardes na fazenda. Dos filhos, apenas Lakina sabia se comportar com discrição. Os irmãos eram absolutamente inconvenientes: falavam alto e gargalhavam sem modos. Todos os dias ficavam na sombra fresca do terraço, sendo servidos pelos empregados da casa e comendo frutinhas - seu Antônio não via a hora de receber alta.

Durante esse tempo, houve uma festa para comemorar o aniversário da senhora Villela. A casa ficou cheia de hóspedes, incluindo a família Zancolleoni, uma das mais tradicionais.

Você já deve imaginar o resto da história. Enzo, o primeiro herdeiro, conheceu Lakina, enquanto caminhava sozinho pela fazenda. Ele ficou fascinado com a beleza e simplicidade dela. Bastaram alguns dias de encontro, próximo a lavanderia da casa, para que ambos tivessem certeza de que poderiam ser felizes juntos. O rapaz tomou a iniciativa de contar aos pais, mas eles repudiaram a ideia. Os Villela ficaram tão preocupados com o escândalo que pediram para que seu Antônio conversasse com a filha, a fim de que ela não aparecesse mais na fazenda.

O velho se sentiu traído. Ele esperava reclamações contra os dois filhos preguiçosos e bagunceiros, ou até mesmo contra a esposa, mas jamais da preciosa Lakina, a menina dos seus olhos. E lá estava ela: em queda livre com o filho de uma das famílias mais arrogantes que havia conhecido. Que humilhação!

Eu não sei o resto da história, mas acredito que seu Antônio tenha voltado para casa antes de se recuperar, frustrando as tardes de vadiagem da família na fazenda dos Villela. Quanto a Lakina, ela fugiu com Enzo.

No trem, podia-se ver um jovem casal apaixonado e cheio de esperança, deixando para trás todo o nó que ataram. A moça teve medo, mas não chorou, deitou a cabeça no ombro do companheiro, descansando na certeza de que ele era forte: mental, moral e fisicamente.

Capítulo VI – A disputa

Refugiaram-se em Pedacinho do Céu, decisão de Enzo, que conhecia aquele lugar como a palma da mão, pois havia passado muitas férias de verão, na infância, com os tios Edmondo e Ofélia, donos da poderosa fábrica de chocolate.

Apesar da fábrica carregar o sobrenome dos Zancolleoni, as tradicionais receitas da Cioccolato Zancolleoni era da família de Edmondo e não de Ofélia - mas isso não vem ao caso. O que importa saber é que os tios de Enzo eram ricos e influentes na cidade, e tinham apenas um filho, Lorenzo.

Ana de Luz e o Circo da Alegria Onde histórias criam vida. Descubra agora