Capítulo XIII (Parte V)

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- Eu... eu tenho comido muito e engordei um pouco ultimamente – Anahí declarou com firmeza, olhando Lira nos olhos. – De hoje em diante vou entrar num regime, para emagrecer os quilos que engordei.

Para seu alívio, o sorriso da mocinha desapareceu, sendo substituído por uma expressão de desapontamento. Rapidamente ela voltou para a cozinha, para dizer a Cris que o que pensavam não era verdade.

Reconfortada pelo pensamento de que agora mais nada ameaçava a futura felicidade de Alfonso, Anahí preparou-se para ir para a cama e sentou-se numa cadeira ao lado da janela, onde ficou observando o jardim, até bem depois da meia-noite. Recusava-se a deixar que a ideia de que teria que viver sem o homem que amava tomasse conta de sua mente, contentando-se em fazer planos para o bebê, que seria criado na casa de seu pai, pois era para lá que pretendia ir assim que seu divórcio fosse concedido.

Quando o silêncio do quarto, que estava às escuras, foi quebrado por um leve ruído, ela nem mesmo se deu ao trabalho de virar a cabeça, descartando o barulho como produto de sua imaginação. A voz grave que soou às suas costas causou-lhe um choque tão grande, que a imobilizou da cabeça aos pés.

- Cris me disse que você não estava se sentido bem para descer para o jantar desta noite, "Annie", e como amanhã eu já estarei longe, quando você acordar, resolvi vir verificar se, desta vez, a sua doença é real ou puramente imaginária.

Sentindo-se totalmente mole pelo choque, Anahí levantou-se e virou-se, dando de frente com uma boca zombeteira e dois olhos verdes, que brilhavam por trás das pálpebras semicerradas. Em torno do pescoço, Alfonso usava uma corrente de ouro e, observando o modo como sua musculatura se movia por baixo do roupão de seda, ela percebeu que aquilo era tudo o que ela usava.

- Eu não estou doente, só cansada – murmurou, dando um passo para trás, pois ele a intimidava com aquela atitude alerta, que o tornava parecido com um animal selvagem, pronto para atacar.

- Cansada demais até para passar com o seu marido uma última noite, antes de uma ausência prolongada? – Seu tom de voz descontraído era desmentido pelo modo como ele apertava os punhos, enfiados com força nos bolsos do roupão.

- Você tinha Belinda para lhe fazer companhia, por isso pensei que não fosse sentir a minha falta – Anahí explicou. E continuou apressadamente, quando viu que Alfonso havia se zangado com sua observação: - Mas eu comprei um presente para você, uma lembrança de Karios.

Ele ficou tão surpreso que, quando Anahí colocou a borboletinha em sua mão, não soube o que dizer, trazendo à mente dela a figura de um garotinho recebendo seu primeiro presente, com medo de que, se mostrasse muita gratidão, ele lhe fosse tirado.

- Você comprou isso para mim? – ele repetiu com voz rouca, passando os dedos ao longo das asas.

- Por que está tão surpreso? – Ela forçou uma risada trêmula. – É só uma coisinha sem valor, que comprei num dos bazares, uma réplica das criaturas que você acha tão atraentes: as borboletas, que são capazes de dar tanto prazer e que podem ser facilmente esmagadas, quando se tornam aborrecidas. Além disso, existem tantas delas, que sempre há a possibilidade de se trocar a que se tem no momento por outra mais colorida...

- Anahí!

Quando ele deu um passo para ela, Anahí afastou-se, deixando-o completamente perdido. Mas desviou os olhos, incapaz de contemplar a humilhação daquele grego orgulhoso.

- Você nunca fez isso antes – Alfonso acusou, com voz emocionada. – Pelo menos, eu acho que nunca fez... se bem que é difícil para um homem cego, saber quando está sendo enganado. Diga-me, "Annie", - ele estava completamente imóvel, a não ser por um músculo que só contraía violentamente em seu queixo – o que vai acontecer conosco, se por acaso eu não conseguir o que vou buscar, amanhã? O que vai nos acontecer, se por acaso o cirurgião não souber manejar o bisturi com perícia?

Como lhe parecia altamente improvável, até mesmo impossível, que o marido empregasse um advogado que fosse incapaz de ganhar uma simples causa de divórcio, Anahí respondeu, um pouco confusa:

- Já que você tem tanto a perder, tenho certeza que vai contratar o melhor profissional do ramo.

O ruído de seu penhoar, quando ela se moveu, e o aroma de seu perfume foi suficiente para indicar sua posição exata. Com uma velocidade chocante, ele avançou, agarrando-a com brutalidade pelos ombros.

- Você realmente sente nojo da minha cegueira, não é, Anahí? Faz tempo que desconfio disso, e agora quero que me diga a verdade. Vamos, fale! – Ele a sacudiu, sem piedade. – Deixe-me ouvir a verdade de sua boca! Sua crueldade rompeu a barreira de calma que ajudara a conservar a sanidade, e a pressão de seu corpo despertou nela uma emoção profunda, que quase a forçou a cair de joelhos, implorando para ser amada. Só a lembrança do beijo que ele havia trocado com Belinda e da mágoa que latejava seu corpo, desde o momento em que soubera que eles iam deixar a ilha juntos, ajudou-a a lutar contra a vontade traiçoeira de cair nos braços do marido, revelando-lhe todo o seu sofrimento.

Desesperada, agarrando-se à tábua de salvação que Alfonso lhe havia fornecido, Anahí concordou por entre soluços:

- É verdade, eu sinto nojo da sua cegueira! – Histericamente, começou a bater no peito dele, com os punhos fechados, e mentiu, quase aos gritos: - Eu odeio quando você me apalpa, às cegas... Detesto seus carinhos grosseiros!

A Substituta (Adaptada)Onde histórias criam vida. Descubra agora