POMBOS

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Embora o dia esteja fazendo um frio miserável, o céu na cidade de Pombos, está com sol a pino e sem nuvens pelo horizonte.

A cidade de Pombos fica aproximadamente uns cem quilômetros de Recife e segue pela BR-232, a mesma estrada que leva à cidade dos bonecos de barro em Caruaru.

A Construtora Minerva Corporações, vem trabalhando a todo vapor na cidade Pombos, comprando terras e as vendendo separadamente... Em lotes.

A última aquisição são dez hectares de terra, comprados à uma família que tem seu único filho viajando pelo mundo, iguais aos ciganos que andam com ele.

Os tratores e máquinas vão chegando na imensa casa toda costruída em alvenaria feita de materiais importados.

— Nelson! — Luciano grita à procura do engenheiro chefe, que está tomando conta da obra, por trás de dois tratores imensos.

— O que é Luciano? — Nelson grita abusado de volta. — Por que essa gritaria toda?

— O senhor poderia me acompanhar até dentro da casa?— Nelson vai caminhando apressadamente no sentido do caminhão, que se encontra perto de Luciano. Então ele para e pergunta:

— Porra caralho! Eu preciso ir até lá para que? — Luciano não se surpreende mais com o temperamento do engenheiro, e responde calmamente:

— Seria bom o senhor mesmo dá uma olhada no local, antes de passarmos os tratores por cima da casa.

— Luciano, você achou um tesouro? Por que caso não tenha achado um seu porra, pode passar as maquinas por cima de tudo!

— Chefe quando derrubamos uma parede, ela caiu abrindo um fundo falso, e apareceu um fosso... Muito fundo.

— Pelo Nosso senhor... Quantas delongas para contar uma coisa tão simples!

— Acho que vi um corpo. — Luciano dispara a novidade sobre o olhar cheio de dúvidas do engenheiro chefe. — Digo, parece um pé, mas está escuro. As lanternas não estão chegando lá em baixo.

— Um corpo? Um pé? Porra Luciano, se as lanternas não estão chegando lá embaixo, como você viu? — O olhar de Nelson para Lucianos o está quase fuzilando.

— Sim, acho que sim... Pode ser um manequim também, haja vista, pelo que ouvi, os antigos donos da propriedade são proprietários de uma grife de roupas.

— Na verdade, os pais dele. Eles já voltaram para Europa depois que fizeram negocio comigo. O filho deles, o mais velho, que era o dono, juntou-se a uma trupe de Hipies e fugiu pelo mundo à fora.

— E largou tudo? — Luciano pergunta sem acreditar que ainda existam pessoas assim no mundo atual.

— Abandonou a fortuna... Pelo menos, foi isso que contaram. Mas, fiquei com uma pulga atrás da orelha agora. Leve-me até o local!

Os dois homens saem caminhando apressados, devido a distância de cinquenta metros que há, entre o local que eles estavam e onde a casa foi construída.

A residência vai aumentando, crescendo seu tamanho quando vão chegando mais perto.

Eles sobem as escadas de madeiras, atravessam a sala, saindo na cozinha e descem até uma pequena área de serviço, próxima uma piscina com bordas infinitas, feitas de mármore preto.

— Sério chefe, — Luciano interrompe o silêncio. — É um desperdício derrubar tudo isso!

— Se fosse para morar, sim. Mas, não esqueça que vou lotear todo o empreendimento, e vender separado. Mas, onde é o local?

— É logo ali, onde existia a residência do caseiro.

Luciano sobe numas metralhas sem dificuldades, enquanto, Nelson vai fazendo o mesmo caminho com cuidado para não cair.

Nelson e Luciano, chegam perto do buraco que está cercado por mais uma duzia de trabalhadores, que tentam ver o que há lá embaixo.

— Vamos, se afastem! Depois cai um lá embaixo, e lasca tudo! — Grita Nelson para os homens que não se afastam do local. — Cadê a laterna? — O engenheiro pergunta já com a mão direita estendida.

Um trabalhador entrega à sua e Nelson joga a luz dentro do foço. — Merda, não dá para ver nada! Mas, não é um pé... Isso tenho certeza! Luciano, peça para os homens continuarem trabalhando e podem enterrar com tudo que há aí embaixo!

— Chefe, os homens daqui são superticiosos! Fechar um buraco com a possibilidade de ter um pobre coitado enterrado como um pagão... Eles não vão fazer isso!

— Então vamos contratar outros trabalhadores. — Sentencia Nelson!

— Nelson, pense um pouco... Se esse homens sairem daqui, vão espalhar que essas terras estão amaldiçoadas, por que enterram um indulgente sem direito nem à uma missa... É o tipo de boato que não podemos ter.

— Merda! — Nelson reclama, quase jogando a lanterna no buraco. — Então vamos logo descer um homem para acabar com essa falação de merda.

— Sim senhor. — Luciano passa pelo lado de Nelson, chama um dos homens, enquanto o restante prepara o guincho para descê-lo.

Com cuidado, o homem vai sendo colocado dentro do buraco.

— O que você está vendo? — Pergunta Luciano.

— Nada ainda! — Responde Claudemir.

— Ele é cego? — Nelson, vira-se e pergunta baixinho para o mestre de obra.

— Calma Nelson! Assim só atrapalha... Os homens estão apreensivos!

— Calma um caralho! Eu deveria ter enterrado tudo lá embaixo mesmo, vai que é a porra de um pé mesmo... Vão embargar a obra.

Luciano coça a cabeça e diz:

— Fé, tenha fé! Não há de ser nada!

— Se for, pode esquecer seu emprego! — Nelson o ameaça bufando de raiva. — E aí infeliz? O que tem aí embaixo?

Claudemir ilumina o local, e vê vários manequins.

— Chefe! — Grita o homem. — Não tem nada aqui não! São manequins mesmos!

— Eu te falei! — Esbraveja Nelson. — Veja quanto tempo precioso perdermos! Quase a manhã toda, por causa dessa bosta!

— Pelo menos não é nada! — Justifica o mestre de obras.

Claudemir, vira-se para a parede em sua frente, puxa a corda, pedindo para iça-lo.

— Podem me subir!

A perna do trabalhador entra toda na parede que está deteriorada, fazendo assim uma alavanca, que joga em Claudemir tijolos, restos de cimentos, muita poeira e pedaços de um corpo carcomido, que se abraça ao corpo do infeliz trabalhador.

— Claudemir! — Grita Luciano. — Que merda está acontecendo aí embaixo?

Nelson aponta sua lanterna de volta, mirando dentro do buraco, para ver Claudemir brigando com uma carcaça de ossos que está abraçada com ele.

A Língua de Deus - COMPLETO - 30/10/2019 - +18 Anos. SEM REVISÃO Onde histórias criam vida. Descubra agora