Capítulo 18

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- Cristina! Onde é que tu tava?
- Calma, amiga. Tava com o Olavo.
- Me poupe dos detalhes. Amiga... eu tô preocupada... Acho que o mesmo cara dos bilhetes acabou de me mandar um recado na Novo Porto. E se tiver alguma ligação com o assalto? Eu tô muito assustada...
- Joana... eu entendo teu nervosismo, entendo a tua tensão, mesmo... mas assim, também não coloca isso na cabeça como uma certeza. Pode ser que seja um cara inocente, mas pelo que tu tá me dizendo, é bom ficar de olho.
- Não sei se consigo dormir em casa sozinha hoje. Sei lá. Pensar numa possível ligação desses dois fatos me deixa meio fora de órbita. Eu tô assustada...
- Não pode ter sido o William? O que tu acha?
- Não, acho que não. Ele não me mandaria uma mensagem assim. Saiu daqui com cara de que nunca mais queria me ver na vida, mas não era um maníaco. Era só grosso mesmo. Daquele tipo que ladra mas não faz mal pra ninguém.
- Bom, se tu tem certeza, então se acalma. Vamos pensar juntas em como resolver. Eu passo aí pra te buscar, vamos pra aquele barzinho que a gente sempre vai, tu precisa dar uma espairecida.

Joana queria registrar uma ocorrência, mas não tinha nada de consistente além dos bilhetes. Aceitou o conselho de Cristina de que era melhor não se desesperar tanto.

Cristina não demorou a chegar e, Joana, que tinha concordado de primeira com o passeio, foi do jeito que estava mesmo. Não sem antes passar um batom leve e prender os cabelos. Embora sempre fosse muito forte, o ocorrido da noite anterior e todos os seus desdobramentos tinham dado uma balançada na empresária.

Já no barzinho, Cristina olhou para Joana:

- Tá um pouco abatida, amiga. Mas, ainda assim, parece melhor que ontem. Tô certa?
- Tá sim. – disse, olhando para o copo e depois para Cristina – É mais ressaca moral de tudo isso aqui, sabe? Nunca tinha sido assaltada, chorei tudo que tinha pra chorar ontem. Hoje já tô mais preocupada em me cuidar melhor, reforçar a vigilância sobre as coisas.
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- Eu sei. Tu é dura na queda. Sempre foi. Mas não te culpa por se sentir raiva ou tudo mais pelo que aconteceu. Tu tem esse direito. Eu te dou.

Joana não respondeu. As amigas ficaram em silêncio um pouco. Joana continuava um pouco cabisbaixa. Cristina retomou:

- E Rodrigo? Como é que foi a conversa com ele?
- Rodrigo foi a pessoa mais importante da minha vida, Cristina.
- Impressão minha ou usamos a conjugação no passado aí?
- Foi intencional. Quando digo que ele foi é porque tudo que foi importante nesse grau ainda tem algum rescaldo depois. O Rodrigo que veio me ver foi o Rodrigo de Milonga. Preocupado, educado, que realmente parecia se importar comigo. E eu tava com saudade dele. Mas sei que isso mudou muito nos últimos tempos. Ele veio pra uma situação extrema.
- Mas não aconteceu absolutamente nada enquanto vocês conversavam e falavam mal de mim e do Olavo?

Joana riu, constrangida. Cristina riu também e disse que tudo bem.

- Até ensaiou rolar um clima. Mas logo passou. Logo que a realidade e o contexto voltaram pra minha cabeça, eu entendi que não era boa ideia.

Cristina percebeu que a amiga estava se animando, ainda que fosse para falar de algo triste.

- Você acha que já esqueceu ele?
- Não esqueci. Mas acho que vou. Ontem eu limpei algumas mágoas dele, alimentei outras. Fiquei feliz pela preocupação, de ter deixado a namorada pra vir me ver.
- ELE DEIXOU A NAMORADA PRA TE VER?
- Ele disse que não era namorada, disse que tava aqui perto, mas o Rodrigo mente muito mal. Eu peguei de primeira que ele simplesmente despencou aqui pra ver como eu estava. E isso foi muito fofo.
- E o que te deu ódio então?
- Fiquei me perguntando por que precisou eu ser assaltada pra ele voltar a me tratar assim...

Rodrigo estava lendo no quarto quando Max entrou com uma mala direta nas mãos.

- Ô, cabeção, cara, esqueci de mostrar que veio essa mala direta pra ti essa semana.
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O envelope trazia uma informação da faculdade em que Rodrigo se formou. Uma bolsa seria sorteada entre os egressos de ciências humanas para uma especialização com duração de um ano nos Estados Unidos. Era uma especialização que ele sempre quis fazer, mas nunca tentou por achar que Joana não suportaria a ausência dele por um ano, não apenas afetivamente, mas também pelo impacto financeiro que tudo isso geraria, mesmo que a bolsa fosse conquistada.

Nunca mencionou seu desejo para Joana.

Agora, Joana não existia mais. Embora o ocorrido da noite anterior tivesse mexido muito com seu coração, Rodrigo estava decidido a tentar dar outro rumo para a vida. Seu Reinaldo o perdoaria. Morar com Max vinha sendo uma boa experiência. Maria lhe ensinou coisas em poucas semanas que ele não aprendeu em anos de relação. Apesar de todo o sofrimento, a vida de solteiro estava gerando bastante aprendizado.

Se assustou quando viu que o prazo para inscrição no sorteio era aquele domingo mesmo.

Gritou meia dúzia de xingamentos a Max pelo atraso na entrega, ouviu outros tantos de volta e o que se ouviu na sequência foram risadas no quarto e na cozinha.

Apesar de hesitante, Rodrigo pegou o computador às 23h50min e decidiu que participaria. Como todo sorteio que participava na vida, era impossível ganhar. Mas se visse o ganhador e soubesse que não tinha nem feito inscrição, lamentaria.

Fez a inscrição e clicou em “enviar”. O relógio virou meia noite e, na tela, uma mensagem de erro. Foi uma atualização confusa e ele não entendeu se tinha conseguido ou não, mas isso não importava muito. O que valeu foi a intenção de sair da inércia.

Ao mesmo tempo, no bar em que estavam Cristina e Joana, um jovem de cabelos enrolados e com óculos de armação circular se aproximou com uma rosa na mão e um sorriso no rosto.

O celular de Joana tocou simultaneamente.

Era a polícia.


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