Retorno +16

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A morte é dolorosa no primeiro instante, mas nada dói como viver um dia após ao outro. A morte faz bem.

É um tanto clichê esse início. Porém, eu me chamo Hector Watterson. Tinha 19 anos e, com minha mãe, aprendi a cozinhar. Afinal, tinha uma irmã mais nova e, por conta disso, aprendi tão cedo a cuidar dela e da casa. Eu aprendi de tudo um pouco.

E na Páscoa, junto a outros de minha idade, fazemos um evento na rua e que, muitas vezes, causava-me arrepios. Ao final da rua, é como se não houvesse vida ou parecia que o mal habitava ali. Além disso, havia crianças...

Não sei se posso chamar aquelas projeções de demônios de crianças. E bem que minha irmã não fazia questão de se enturmar; todavia, não sabia que crianças podiam ser tão cruéis e inocentes ao mesmo tempo.

Então, já que falei tanto sobre minha amada irmã, vou te dizer que ela mesma causou meu fim: crianças doces feito algodão e amargas feito fel.

Eu tinha feito, junto a minha mãe, cinquenta ovos médios de Páscoa e embalamos todos. Cada um tinha um bilhetinho preso com fita e marquei de encontrar-me com os demais para escondermos os ovos pelo bairro, pois, após o jantar, todos sairiam à caçada.

Sabe quando aquela sensação ruim bate e você sente medo sem saber o porquê? Senti-me assim quando escondi o último ovo. Levantei com um mal-estar e Jason e Victória me seguraram, senão, teria me esborrachado ao chão.

— Ué! O que houve?! — perguntou Vic.
— Nada, só uma tonteira... Deve ser fome. — equilibrei-me e soltei-me deles.
— Então, "bora" comer. — Falou Jason.

Caminhamos até o salão da igreja, onde era feito um jantar coletivo. Então, vi Catarina com aqueles sujeitinhos. Ela, depois, dizia que nunca ia se misturar com eles... Como minha mãe ousou deixar isso acontecer?

Fui até ela, pisando fundo, e sentei-me à mesa entre eles. Como crianças de oito anos podem ser tão grosseiras? Minha sensação de poucos minutos atrás havia retornado. Catarina fechou a cara para mim. Ela nunca tinha feito isso!

— O que você faz aqui?! — perguntei "calmamente".
— Estou comendo, não consegue ver? — retrucou.

Assumo que isso me deixou irado, essa má-criação repentina.

— Saia dessa mesa, tio! — falou o moleque. Eu o ignorei.
— Catarina, eles não são boas companhias. — Alertei.
— E quem é você para me dizer o que fazer?! Me deixa em paz. — As pessoas começaram a olhar. Revirei os olhos e saí com desgosto.

Comecei a ter medo desde aquele hora. Eu suava frio e tremia muito. Jason me deu uns calmantes que estavam na bolsa da mãe dele, mas não resolveu muito. Então, às 21:30, vestimo-nos com nossas roupas.

— Não posso negar, essa data pós-Quaresma me dá arrepios.
— Não se sinta único. — falou Peter, que também ajudava nesse evento.

Minhas roupas eram uma cabeça de coelho e um terno preto, meio século XVIII. Algumas vezes, eu usava uma túnica. Comecei a guiar o grupo em que estava meu primo de doze anos, só que Jason pediu para trocar comigo. Por que fiz isso, meu Deus?!

No outro grupo, estavam minha irmã e sua trupe, que tinha garotos de oito e treze anos, ela e mais duas meninas pequenas, para meu azar (sim, ficou pior). Eles correram e tive que deixar as duas meninas menores com Vic, correndo atrás daqueles pequenos marginais.

Vi-os entrando em uma casa ao final da rua: sim, aquela mesma casa que me causa arrepios. A sensação de medo aumentou e comecei a querer vomitar meus bofes. Droga, droga...

Entrei na casa. E então...
Levei dois fortes chutes na canela com risadas e, logo, uma pancada forte na nuca. Como?

Acordei e tinha uma forte luz que queimava minhas retinas. Elas lacrimejavam, tentando acostumar-se com aquela luz. Tentei levantar-me, e vi que estava fortemente preso a uma cama.

[— Catarina, a faca, por favor. — Ouvi a voz infantil dizer.
— Ah! Pelo amor de Deus! É sério isso?! — falei entre dentes. Estava puto com aquela brincadeira de mau gosto.

Isso até a faca atravessar uma de minhas mãos e eu urrar de dor. Logo, enfiaram-na na outra. Ainda estava com a máscara, então ficava meio difícil de ver com clareza com aquela maldita luz em meus olhos.

— Nícolas, a chave de fendas. — O quê?! Caralho! Como? Como podem ser tão ruins meras crianças?!

Só... Só adverti minha irmã e ela deixa isso acontecer! Essa porra! Se eu viver, vou matar cada um desses demônios e exorcizá-los da Terra com dor e agonia. Malditos! Desgraçados!
Eles começaram a quebrar osso por osso de minhas pernas. Eu ouvia minha irmã cantarolar:
"Hector, Hector, mau menino, mau menino! Ganhou má surpresa do Coelhinho."

E minha vida foi levada naquele dia; só que, como o destino é cruel, eu voltei. Sim e sim! Voltei. Mais vivo que antes e mais cruel.

E então, nesta data, voltarei e não só aqueles doces demônios irão morrer, assim como qualquer outra criança desobediente. Irei fazer de sua Páscoa um mar de torturas.
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Criancinha, criancinha! Menino mau, menina má. Ganhou má surpresa do Coelhinho."
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Seja bonzinho. No próximo ano, estarei aqui... Eu sempre retorno.

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