CAPÍTULO IV

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A chegada de Otias

O tempo corria célere. Os preparativos já estavam prontos. A mansão sofrera
muitas alterações. Tudo quanto havia de moderno e luxuoso em Tebas fora
utilizado pelo nobre Pecos. O ambiente rebrilhava com um fulgor festivo. Pecos,
naquela manhã de sol, preparava-se com esmero. Deveria esperar pelos seus
parentes que, segundo o emissário da véspera, chegariam dali a poucas horas.
Ele pretendia encontrá-los na estrada, às portas da cidade, para oferecerlhes as
boas vindas. Estimava sinceramente seu velho tio, homem bondoso e honesto,
soldado, hoje dispensado pela idade avançada. Mas sua preocupação era mais
pela prima. Ele sabia que seu tio pretendia casá-los e até já haviam conversado
francamente a este respeito. Como estaria ela? Fazia oito anos que não a via, mas
recordava-se de que era uma linda menina. Deveria estar agora uma bela
mulher no esplendor das suas 18 primaveras.
A ele, não desgostava tal união, porque, além da estima que os unia, a grande
fortuna do tio unida à sua, torná-lo-ia invejavelmente rico. Depois, ele nunca
amara verdadeiramente e nem acreditava em tal possibilidade. Suas aventuras
haviam-no tornado experiente com as mulheres, mas nenhuma havia conseguido
impressioná-lo seriamente.
Esperava sinceramente que unindo-se à prima, a quem respeitava e estimava,
pudessem viver felizes e tranqüilos, realizando assim seu grande sonho de possuir
um herdeiro para seu nome e haveres.
Por vaidade, Pecos pretendia vencer a morte, continuando a viver através do seu
descendente. Como tantos outros, não refletia se estava preparado para ser pai,
ou se a mulher que escolhera para mãe de seu filho, exerceria bem essa missão.
Sonhava torná-lo rico, poderoso, dar-lhe todas as coisas que desejara ter e não
conseguira. Arquitetava planos para o futuro, sem indagar se seu filho seria feliz
em realizá-los.
Aprumado, vestido com sua túnica de gala, chamou Jertsaida, dando-lhe as
últimas ordens referentes aos hóspedes. Depois tomou de seu cavalo,
acompanhado por Tetânio e Martus, que àquela hora matinal regurgitava. Tebas
era uma cidade ativa e febricitante. As caravanas iam e vinham, descendo e
subindo o Nilo rumo a outras terras, negociando ervas aromáticas, tecidos,
especiarias, peles etc... Seu comércio era livre, somente devendo pagar em
espécie, ou seja, em mercadorias, o preço da travessia para atingir as cidades baixas. Tebas possuía um mercado, situado na praça de Nectéa, em um grande
pátio onde os mercadores expunham suas mercadorias que trocavam pelo que
necessitavam ou vendiam, mas em sua maioria preferiam peles ou gêneros. Era
um mercado curioso e alegre pelas suas bizarras e tradicionais figuras esculpidas
ao longo das paredes, simbolizando seres dotados de poderes estranhos, pela
variedade de cores dos tecidos e bugigangas para os enfeites femininos, pela
fumaça que envolvia o ar e até pela poeira que misturada com o odor das ervas
utilizadas em pequenas bombas, muito semelhantes aos cachimbos dos chineses
quando saboreiam ópio, eram aspiradas pelos homens daquele tempo com
imenso prazer. Também pela música enervante das fanfarras e os tipos curiosos
que se viam negociando.
Pecos e seus amigos seguiam indiferentes ao burburinho das ruas, habituados
com o aspecto sempre regurgitante da capital de um país que dominava o mundo
com seu poderio. Tebas, com suas graciosas e elegantes casas de pedra, de
mármore colorido no chão e nos pórticos, de ruas estreitas, mas simétricas, era
bem o resultado de um luxo que o povo ostentava pelo poder de seu país.
Pecos atravessava agora as enormes muralhas de pedras que fechavam a
cidade. Ele e seus companheiros haviam trocado poucas palavras. Estando
engolfado em pensamentos profundos, seus companheiros por sua vez o
imitavam. Caminharam por mais algumas milhas; depois, escolhendo um sítio
agradável, Pecos ordenou:
– Alto! Esperemos aqui. Os viajantes não devem demorar-se. Desmontaram e
assentaram-se à beira do caminho, sobre uma grande pedra a fim de aguardá-los
pacientemente. Decorridos longos minutos de expectativa, vislumbraram ao
longo da estrada um cortejo que avançava lenta, mas regularmente.
– São eles – bradou Pecos com alegria – à sela, meus amigos, vamos recebê-los!
Juntando o gesto à palavra, montou garbosamente de um salto seu animal e
depois de bem aprumar-se com elegância, dirigiu-se rumo aos viajantes, seguido
pelos companheiros.
Chegando mais perto, verificaram que à frente vinham alguns escravos, mais
atrás e montados, dois cavalheiros, sendo um moço e outro mais idoso,
respectivamente irmão e tio do nobre Pecos, ao lado de elegante liteira. Mais
atrás, a bagagem conduzida por muitos escravos e jumentos. Ao avistar os três
soldados, o cortejo parou a uma ordem de seu chefe. Pecos avançou para o tio,
sorridente e emocionado. Ao aproximar-se desmontou rápido, correndo a
abraçá-lo, pois que este também já estava no chão.

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