CAPÍTULO XI

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Quem planta, colhe

A aragem do tempo varreu as areias dos últimos acontecimentos, na grande viagem da vida terrena. Muitas coisas se modificaram envolvendo os personagens desta história.

Era tarde. Um calor sufocante torturava os habitantes de Nínive, a bela e suntuosa capital da Assíria. Nínive, cidade dos obeliscos, das grandes estátuas de madeira guarnecendo castelos decorados em cores vivas e bizarras. Sua gente,
menos pacata de natureza do que os de Quinit, preparava-se para novas
conquistas após haver escravizado a Palestina e o Golfo Pérsico. O

Império Assírio estendia suas armas sobre o mundo civilizado da época, numa ânsia incontida de conquista e de poder.

No magnífico palácio onde vivia Salil com a filha, a vida continuava
normalmente.

Apesar de hebreu, Salil ocupava alta posição diplomática junto ao imperador, que soubera conquistar graças a sua inteligência maneirosa e sutil. Salil viera com seus pais a Nínive, por ocasião da ocupação do seu país de origem, mas apesar dos preconceitos raciais que conservava intimamente, sua personalidade servil o fizera progredir muito mais do que em tais condições se poderia esperar. Aliás, o imperador, ciente de que a melhor maneira de dominar o povo hebreu era a de angariar-lhe a simpatia, anistiou todos aqueles nobres que se declarassem publicamente cidadãos assírios. A minoria que se havia recusado a tal, fora escravizada barbaramente.

Entretanto, o povo hebreu, embora aparentemente estivesse servindo o novo imperador, com a astúcia que lhe era característica, continuava a tramar, tendo organizado às escondidas uma sociedade secreta pró-libertação de seu povo. Salil
era um dos chefes do movimento, embora nem mesmo a filha soubesse.

Na casa de Salil, os escravos eram tratados com rigor e a tolerância não era conhecida. Aplicavam os castigos mais bárbaros para justificar os escravos faltosos. Porém, um escravo existia lá, tratado muito pior do que os demais: Pecos. Aqueles dois anos tinham-no mudado consideravelmente. Seu físico já bem desenvolvido, mais se robustecera no trabalho árduo e grosseiro, porém, seu rosto humanizara-se, o que aumentara seu carisma natural, tornando-o mais atraente. Fora encarregado de fazer os mais duros serviços domésticos e ainda
era obrigado a atender os caprichos numerosos de Nalim. Orgulhoso, procurava desempenhar bem todas suas tarefas, não dando oportunidade a que ela o castigasse.

Apesar disso, ela não perdia oportunidade de humilhá-lo e escarnecê-lo na presença dos demais.

Pecos, porém, embora ferido profundamente em sua vaidade de soldado conquistador e de homem, calava-se e embora o fizesse, em seus olhos Nalim não via a derrota, mas desdém e indiferença.

Isto a exasperava tornando-a mais rude, agressiva e caprichosa, provocando-o desejosa de uma reação violenta que não acontecia. Apesar de estar de novo em casa, Nalim não era feliz. Vivia nervosa e insatisfeita. O tédio invadia-lhe a alma. O pai, amoroso, solícito, proporcionava-lhe um ambiente de luxo, de esplendor, de festas, a fim de contentá-la. Porém, nada conseguia modificar seu estado de espírito.

Tudo para ela era inexpressivo. A vitória que conseguira, possuía um sabor diferente do que imaginara. Não se arrependera do que realizara. Estava satisfeita por ter o orgulhoso senhor de outrora à sua mercê e por haver ferido Otias, a quem odiava gratuitamente. Porém, desejava que Pecos sofresse, e a resignação do rapaz a exasperava, tornando-se uma obsessão. Não conseguia pensar em outra coisa a não ser em atingi-lo.

O resultado era que amiúde o chamava, encarregando-o de pequenos serviços desnecessários, que ele procurava realizar com infinita paciência. Muitas vezes, ela, zangada pela indiferença dele, procurava tentá-lo disfarçadamente com atitudes de abandono e languidez.

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