28. Apneia

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[LUANA]


Eu precisei de muita força para encarar a aula no dia seguinte.

A véspera do ENEM foi sufocante. Os professores só falavam nisso. Alguns faziam piada, outros tentavam dar força. Alguns outros, desesperados com o fraco interesse da turma - que já estava cansada de falar no vestibular, lançava no quadro mais e mais questões dos anos anteriores - na pequena tentativa de nos ajudar.

Chegar em casa foi um alívio, apesar de me lembrar que, no dia anterior, tinha assistido aquela briga dos meus pais. Não sei o que houve após a minha saída, mas o clima estava mais ameno. Ninguém me incomodou no meu quarto. 

Fui ao banheiro e tranquei a porta. Arranquei o uniforme e o joguei no pequeno cestinho de roupas ao lado da pia. Liguei a água quente. Logo o vapor inundou o ambiente. Entrei contudo no chuveiro. Não sei quanto tempo estive embaixo d'água, mas tinha a leve sensação de que estava limpando minha alma.

Saí do banho enrolando o cabelo na toalha e vesti meu pijama mais confortável - daqueles velhinhos e surrados - e me senti renovada. 

Decidi me desligar do celular. Se a intenção era relaxar, não me ajudaria em nada passar mais uma noite pregada nos aplicativos, além de excitar sem necessidade o meu cérebro, que se contorcia dentro de mim só de pensar na ideia de relaxar e dormir. 

A casa estava tão silenciosa que parecia estar sozinha. Não sei quanto tempo fiquei jogada na cama, mas só me dei conta de estar cochilando quando a porta do meu quarto abriu. Me levantei, sobressaltada, com o barulho inesperado. Era minha mãe.

- Lu, fiz uma janta bem leve para você.

- Obrigada, mãe, não precisava.

- Claro que precisava. Bem - disse ela, colocando o prato em cima da minha escrivaninha -, se alimente e durma. Você vai precisar desse tempo de sono e descanso.

- Pode deixar.

Mordi o lábio na tentativa de não deixar escapar nenhum comentário sobre a briga. Minha mãe deu um sorriso forçado e saiu do meu quarto antes que eu pudesse falar. 

Ela tinha razão. O frango grelhado com vegetais caiu como uma pena no meu estômago. Devorei a comida, escovei os dentes e deitei na cama. Antes de tentar fechar os olhos, conferi o despertador dez vezes. Ajeitei o som, coloquei vários alarmes em horários diferentes e conectei o celular à tomada. Não tinha como não despertar.

Quando o relógio despertou às oito eu levantei elétrica. Não conseguiria nem cochilar. Escolhi uma roupa confortável e casaco. Meu pai me entregou um saco de guloseimas para comer no tempo de prova. Havia tantas coisas dentro que me perguntei se eu realmente conseguiria dar conta. 

- A sua ansiedade falará - disse ele, sorrindo.

Talvez eu tenha conferido umas vinte vezes o endereço da faculdade onde faria a prova, juntamente com meu cartão de identificação e minha identidade original. 

Quando o relógio marcou dez e meia da manhã, eu já vestida e almoçando.

- Luana, você não deveria comer com calma? - perguntou Rafa, rindo ao me ver comendo como uma esfomeada.

- Rafael, o meu maior medo é ser uma das pessoas atrasadas do ENEM. Já pensou se eu chego tarde e me filmam desmaiando na porta da faculdade? Você não sabe o que é desespero! - disse eu, rindo.

Meus pais me deixaram no portão às onze e quarenta da manhã.

- Tem certeza que não quer que a gente fique com você, Lu? - perguntou meu pai.

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⏰ Última atualização: Nov 21, 2018 ⏰

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