Prefácio

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Prestes a explodir de ódio subo as escadas e invado a sala de reuniões, depois de uma curta e inútil conversa com meu pai, continuo aos gritos perdendo a pouca paciência que me restava.

— Eu não sei qual é a porra do teu problema comigo. — Xingo e passo a mão na testa de nervoso.

— E eu não sei o porque acha que vou aceitar essa tua ideia idiota. — Meu pai consegue ser insuportável a todo o tempo que quiser, sem o mínimo esforço e hoje tinha tirado o dia pra me testar mais que o normal.

— Eu sou o próximo da linhagem, nada mais justo do que me incluir nos planos a partir de agora, você incluiu dois estranhos, então porque não eu?

— Você está certo, é o próximo da linhagem, então só vai liderar quando todo mundo, inclusive eu, morrer. E pode ter certeza que vou fazer de tudo pra que isso não aconteça tão cedo.

Puxo ar para os meus pulmões a fim de pensar numa reposta educada, mas falho e chuto uma das cadeiras vazias da sua sala.

— Quando qualquer um de vocês morrer eu entro, não tem nada que possa fazer e as regras estão ai pra te provar, até lá, vou trabalhar com os outros e não quero ver tua fuça me chamando pra trabalho nenhum, não importa o que seja. — Aponto um dedo no seu rosto e ele ri levantando as mãos.

— Sem os trabalhos do clã vai fazer o que? Se entupir de bebida no teu bar?

— Vou tirar umas férias e acho melhor não vir atrás de mim. — Antes que ele responda saio dali, bato a porta com força e desço as escadas daquela maldita mansão.

— Pelo visto ele disse não. — LH me encontra na saída, está encostado no carro enquanto fuma, mas joga o cigarro no chão assim que me vê sair transtornado.

— Não quero saber, estou cansado dessas merdas, já tenho vinte três anos e continuo obedecendo regras desses três velhos. — Entro no carro e ele se junta a mim.

— Jeff não te apoiou nessa?

— Ficou calado e de canto o tempo todo, não me surpreende e Michael, como quase sempre, não estava.

— Ele gosta de você.

— Gosta mais do meu pai, pelo visto. Devem se comer nas folgas do trabalho. — Comento e Lewis ri.

— E o que vai fazer agora? — Ele liga o carro.

— Vou dar um tempo dessa merda, entro no jato direto pra Inglaterra amanhã.

— Que? Fazer o que naquele lugar?

— Férias, preciso relaxar.

LH não concorda, das últimas vezes que tirei um tempo pra mim, voltei com problemas nas costas, mas agora não ligo pra isso, contanto que não fique perto daquele filho da puta não ligo pra nada. Estou cansado de seguir ordens, fui treinado pra ser um assassino e vender todas as drogas que consigo. Mas, participar de uma máfia nunca foi o que quis, trabalho melhor sozinho e estar num tipo de equipe com meu pai sendo o principal líder foi a pior ironia do destino, tinha dezesseis anos na época e esse era o meu mundo, se não aceitasse o que teria acontecido comigo? O que seria de mim se dissesse não? Entre matar a qualquer custo ou talvez morrer, o que deveria ter escolhido? Tinha que seguir seus passos.

No dia seguinte sai sem avisar mais ninguém, peguei o jato e desci em Londres.

É a primeira vez que venho pra essa cidade, sempre tive vontade de visitar por um motivo, na verdade, por uma pessoa, mesmo que não possa a encontrar mais aqui. Aluguei um apartamento simples no centro, perto de onde ela morava, infelizmente sua casa está ocupada por uma família que jamais a conheceu. Poderia ter comprado, mas isso levaria tempo pra falsificar documentos, ou pra arquitetar um plano pra dar sumiço em todos e ocupar a casa, o que seria a última coisa que vim fazer, trabalhar.

Planejo ficar no apartamento por uma semana, adianto uns pagamentos que tinha que mandar, mas passo a maioria do meu tempo indo a bares e pubs na cidade.

Hoje, no meu último dia aqui, decido andar pelas ruas. Cheguei a comprar um carro pra usar, mas o tempo não está ensolarado como nos outros dias, na verdade, um vento gelado entrou pela janela do apartamento e vi que poucas pessoas estariam na rua, só assim fiquei mais confortável pra sair.

Uso uma blusa preta quente de gola alta, um casaco grande de pele de animal por cima e botas de couro. Não estou acostumado com temperatura, o tempo daqui é completamente diferente, mais gélido e calmo, diferente Utah, onde fica minha casa, o inverno é insuportável lá, mas sem comparações, aqui fumaça sai quando as pessoas falam e as calçadas ficam congeladas, não suportaria ficar mais de uma semana.

Andando pelo centro vejo um grupo de pessoas paradas em frente a uma faixada pendurada em um tipo de restaurante sendo reconstruído, estreito os olhos pra poder enxergar o que tanto observam, mas desisto e atravesso a rua pra passar despercebido por eles e seguir meu caminho.

Minha cabeça latejava, o frio poderia ser a causa se as palavras do meu pai não estivesse em replay na minha cabeça. Sem dúvida, viajar para longe foi uma escolha que me traria uma paz temporária, nunca consigo ficar mais de dois dias perto daquele cara e quando estamos cheios de missões fico mais irritado e impaciente que o normal. Não posso negar, precisava de um espaço, colocar a cabeça no lugar e repensar meus próximos passos para reverter minha situação entro do clã.

Seguir no clã ou me rebelar e seguir sozinho?

Tenho que pensar também em quais seriam as consequências de qualquer escolha, porque elas viriam um dia ou outro.

Não me surpreendi por ele não me permitir ser membro dos líderes do clã, mesmo com toda raiva já esperava essa decisão, mesmo que a cada vez que ele me nega algo ou me rebaixa sinto como se fosse uma sensação nova e um ódio genuíno, porque no fundo uma parte de mim espera uma resposta diferente, mas nunca a tenho, nunca.

Por isso vim para Londres, minha mente está mais leve longe de todas aquelas confusões e ordens, sinto que consigo respirar por estar longe de todo mundo. É complicado levar a vida que tenho, poucos sobrevivem, literalmente. E mesmo que seja bom no que faça, uma hora sua mente cansa e pede um tempo.

Enquanto tento bolar um plano para reverter minha situação atual, observo a cidade. Percebi que aqui as pessoas mesmo não te conhecendo não te julgam, nem mesmo te olham. Ficam cada uma em seus cantos, seguindo suas vidas, lendo seus jornais repletos de artigos que falam mal do governo ou de como a moda esta revolucionada, sempre com seus cafés nas mãos, encolhidas nos seus casacos horrorosos de não sei quantas peles de animal. Elas são elas, e eu sou apenas eu aqui.

Ando olhando para os meus sapatos e quando reergo o olhar algo bate contra o meu corpo, já estava preparando minha resposta repugnante e grossa contra ao idiota distraído, mas então ouço uma voz fina num gemido de dor e só solto um pequeno palavrão.

— Me desculpe! — A garota tem um sotaque forte britânico e junto dele pares de olhos azuis fortes, ainda mais realçados pelos seus cabelos pretos que me prendem por um momento, mas não a respondi e apenas sigo em frente. Quase na mesma hora uma outra garota aparece correndo em minha direção gritando algo, eu não a conheço, mas por algum motivo foco nela. Seu cabelo castanho escuro está invadindo seu rosto e seus lábios a cada passo dado, como em um ensaio fotográfico ou comercial de TV inútil. Mas, ela não está cheia de maquiagem ou com uma roupa brega no corpo, na verdade ela está corada do frio e quase sumindo dentro do seu casaco de lã marrom, de uma forma-procuro uma palavra que a defina e consigo encontrar apenas uma- ela está incrivelmente angelical.

— Megan, me espera. —Ela grita ofegante e passa por mim rápida o bastante para se quer me notar, na mesma hora sinto uma fragrância tão forte, tão boa que perco a noção de tempo e espaço. Então, depois de me virar e vê-las caminhando para longe de mim percebo que me meti em problemas, porque ali decidi que passaria mais um tempo nessa cidade, porque naquele instante decidi que era ela quem eu queria.

Sweet SyndromeOnde histórias criam vida. Descubra agora