Miri mal pregou os olhos durante a noite. Revirava-se na cama pensando nas fotos e nos vídeos que vira na noite anterior, no celular de Kate. Seriam mesmo Aaron e Ester seus pais de verdade? Por que mentiram por tantos anos? Se fosse verdade, seria prima de Kam, e casamentos entre primos não eram proibidos, mas não eram bem-vistos. Seria essa a razão? A moça levantou-se cedo, tão logo amanhecera. Ao longe, o W desenhado pelos sóis e pela lua de Lar pareciam diferentes. Foi à janela e ouviu o cântico dos pássaros da manhã, que sempre considerava um bom agouro. Viu, ao longe, seu pai caminhando em direção à casa, sem Abram ao seu lado. Não teria melhor chance de falar-lhe a sós.
– Pai, precisamos conversar antes que entre – disse a moça, saindo pela porta da frente.
– Sim, minha filha. Mas não podemos perder muito tempo, você sabe que a ameaça...
–Eu preciso saber se sou sua filha, pai. Sua filha de verdade.
– Mas por que isso agora, Miri? Você já conhece essa história...
– Eu sei a história que conheço, mas acredito não saber a verdade! – afirmou a moça, interrompendo-o.
– O que faz você pensar assim, Miri?
– Ontem, vi uma máquina da Terra chamada celular, que grava imagens de pessoas, e vi os pais de Kate. São como o senhor e minha mãe. Considerando que sei que os pais de Mike são como Abram e Sara...
– Você acha que somos também? – perguntou, resignado.
– Sim!
– Miri, os antigos nunca gostaram de casamento entre primos. Diziam que seus filhos nasceriam doentes. Mas quando você nasceu, sonhei com um anjo. E ele me disse que eu deveria prometê-la ao filho de meu irmão. E, de fato, quando Ester ficou doente, logo após seu nascimento, e Abram deixou sua casa e seu filho recém-nascido para me ajudar, considerei justo atender ao pedido do anjo.
– Nós sempre fomos criados como irmãos – disse Miri, pensativa. – Mas se quiséssemos ficar juntos, o casamento entre primos não é proibido!
– Miri, Kam nasceu sob um presságio. No dia do nascimento do rapaz, bem no leito de Sara, uma coisa muito estranha aconteceu. Ester, que estava para ter você, até hoje se arrepia quando fala disso. A janela do quarto onde estavam se abriu sozinha e pudemos ver, ao longe, o nascer do sol de Lar. Os sóis e a lua se alinharam de tal modo, que o brilho dos dois sóis, um atrás do outro, recaiu sobre Sara. Pássaros carregando ramos de flores foram até o leito de Sara, que parou de sentir dor. Kam nasceu sem dor. Um aroma incrível pôde ser sentido no quarto, lembrava flores do campo, quando ela o deu à luz. Sabíamos que ele seria o soberano de nosso povo, nosso líder militar, um dia, independentemente de nascer homem ou mulher. E ele nasceu homem.
– Então, eu e Kam somos primos. Você e Ester são...
– Sim, Miri, somos seus pais de verdade. Abram entende que o povo ainda não deve saber disso, por isso não falamos nada.
– Pai, esse anjo com que o senhor sonhou... Como ele era? – perguntou a moça, trêmula, sem saber ainda o porquê.
– Lembro como se fosse hoje – sorriu. – Vestia um manto branco, tinha cabelos e barba longos e compridos, olhos da cor do céu.
– Mestre... – pensou Miri. – E o que mais ele lhe disse?
– As outras coisas que ele me disse serão contadas no tempo certo, minha filha! – afirmou Aaron, que se aproximou da filha e lhe deu um beijo na testa. – Agora, vamos acordar os outros...
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Os Sóis de Lar
خيال علميO que acontece se o seu reflexo no espelho não for uma ilusão, mas realidade? Kam é um alienígena humano que vive com seu povo em exílio no planeta Lar, dominado por invasores, os luciferianos. Acidentalmente ele volta dois mil anos no passado e lá...