Alguns dias depois, na sala da casa dos Hendrik, Jullian e Benjamin findavam uma conversa regada a taças de vinho e do som do crepitar da lareira como música de fundo. O inverno já havia se instalado nos arredores, e do lado de fora da casa a neve caía em flocos finos, delicados, cobrindo de branco o jardim e o caminho de pedrinhas que levava ao pequeno portão de ferro. O interior da casa, entretanto, era confortável e aquecido, acolhedor em sua totalidade, e mesmo que as dores dos acontecimentos vividos dias antes ainda se mostrassem em carne viva, a quietude e o conforto de um lar, mesmo que provisório, serviam como poderosos remédios.
—Eu acho que já vou indo, senhor Hendrik – disse Jullian, levantando-se da poltrona ao sentir-se sonolento. – Estou um pouco cansado, olhos ardendo. Preciso recuperar as energias.
—Oh, é claro, Jullian – Benjamin concordou, também deixando o assento macio. – Está ficando tarde e também preciso dormir. Podemos continuar a nossa pesquisa amanhã.
Ao lado deles, espalhados por banquetas e móveis de centro, uma dúzia de livros exibiam suas capas de títulos distintos e cores variadas. Utilizando-se de sua influência, e com a ajuda de Thadeus, o pesquisador, Benjamin recolhera todos os exemplares que conseguira encontrar sobre portais entre mundos, sobre projeções infernais e também sobre vampirismo. Com a ajuda dos textos antigos e complexos, cuidavam de Romani e de seu ferimento causado por uma Súcubo – a vampira demoníaca que até três dias antes habitava naquela mesma moradia – e buscavam, incessantemente, por qualquer tipo de método que pudesse levá-los até George, onde quer que estivesse.
Despedindo-se, o padre deixou Benjamin sozinho e alcançou o corredor dos quartos, mas antes de rumar para o seu, parou diante do de Romani e bateu três vezes, anunciando sua presença. Ouviu um "entre" abafado pela barreira da porta, e rapidamente girou o trinco e abriu a passagem, encontrando um aposento suavemente iluminado, exibindo um foco de luz maior bem ao lado da cama através do cone de um grande abajur. Sob a luz, recostada aos travesseiros enquanto lia um livro qualquer, Romani observou a entrada do padre e largou o exemplar de lado, sorrindo para ele enquanto se aproximava.
—Achei que já estaria dormindo – disse ele, sentando-se na beira da cama.
—Passei o dia inteiro dormindo, não estou com sono agora. Decidi ler um pouco para me distrair e não ficar apenas deitada abraçando o tédio – ela respondeu com delicadeza, a voz ainda fraca e em recuperação.
—Está se sentindo melhor?
—As dores estão diminuindo aos poucos, mas a mordida ainda coça e arde o tempo todo. Acho que é todo este alho que está causando essa reação.
Com uma expressão desgostosa, Romani disparou olhares por várias direções do quarto, encontrando incontáveis coroas de alho espalhadas pelos móveis, penduradas na parede e nas janelas, largadas ao chão ao redor da cama.
—O alho serve como proteção e desacelera qualquer transformação de alguém que foi atacado por um vampiro, era o que dizia um dos livros que encontramos. Não sei se é algo sobrenatural ou puramente científico, mas não custa nada tentar.
—Mas justamente alho? Que tal alguns pêssegos ou algumas flores? Parece-me pura maluquice.
—Maluquice ou não, estava nas pesquisas e temos de seguir tudo o que encontramos. Amanhã nos encontraremos novamente com Thadeus para saber se ele descobriu mais alguma coisa. Mas estamos indo muito bem. Você está ótima e vai se recuperar antes que perceba.
VOCÊ ESTÁ LENDO
In Nomine Patris 3 | Tenebris Hibernus
FantasyCarregando nas costas o peso das terríveis ações de Irvine Aurish, Jullian Bergamo deixa para trás as cinzas e os destroços de sua vida e parte em uma missão de caça à maléfica feiticeira. Pelo caminho, seguindo pistas e sinais deixados pela mulher...