4- UMA BREVE VISITA

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Chegamos no barco e um dos tritões de Tony desceu o bote. Sem dar nenhuma explicação a ele, o capitão entrou e se acomodou em uma das tábuas, as pernas cruzadas para cima, apoiadas em um caixote que provavelmente guardava utensílios de pesca. Peguei dois dos quatro remos e lhe lancei um olhar significativo, mas não obtive sinal de que fosse me dar alguma ajuda. Sem pensar em nada melhor para fazer, olhei para minha bússola, para o lugar que ele havia indicado no mapa, e comecei a remar.

Meus braços já estavam um pouco cansados antes mesmo de terminar a volta na ilha. Eu havia passado muito tempo navegando em embarcações grandes e estava desacostumado a remar. Pousei os remos no chão por um instante enquanto alongava os braços para continuar, entretanto, me surpreendi ao encostar no fundo do barco para pegá-los de volta: a madeira estava quente como uma frigideira.

Afastei as mãos rapidamente em reflexo, derrubando os remos mais uma vez. Tony riu um pouco de mim, sem entender o motivo daquilo.

- O chão! - Avisei. - Está quente. Ele se esticou para olhar fora do barco e virou para mim com uma expressão péssima.

- Está fervendo...

- Como vou remar assim? Vai respingar na gente!

- Sei lá, acho melhor sairmos daqui o mais rápido possível. Tenta tomar cuidado e eu tentarei me proteger. - Seu altruísmo era impressionante.

Continuei remando, dessa vez mais devagar. Levamos alguns respingos de água quente, o que acreditei ser inevitável, mas fora isso não aconteceu nada grave.

Completei a volta uma hora depois e começamos a nos afastar da ilha. Na medida em que eu remava para longe, a sensação de calor foi passando, até o momento em que tive coragem de tocar o chão do bote e percebi que estava frio novamente. Tinha sido por pouco, apesar de que, a meu ver, cair no mar seria a morte de uma forma ou de outra.

As luzes da ilha se afastavam enquanto remávamos para longe. O capitão, que passara todo o percurso falando sobre trivialidades, foi ficando cada vez mais silencioso. O bote estava equipado com uma lanterna, que acendi para observar a bússola e o mapa. Além dessa fonte de luz, da lua quase cheia e das estrelas parcialmente cobertas pelas nuvens no céu, havia apenas a escuridão.

- Tony. - Pela primeira vez puxei assunto com ele. - Por que você anda com eles?

- Com eles?

- Com os peixes. E aquele polvo nojento...

- O Lorde Tritão. - Corrigiu ele. - Bem, por que eu não andaria com eles? São a minha tripulação.

- Você tá me dizendo que não vê problema nenhum? - Perguntei, indignado. - Ser o único normal no meio deles.

Tony riu da minha observação e deitou-se um pouco mais na sua parte do bote.

- Nem todo mundo pensa como você, Romeo. E, além disso, não posso me separar dos tritões. São como uma família para mim. O laço que tenho com eles está além das minhas escolhas...- "Uma família". Aquilo me abalou um pouco e permaneci em silêncio pelas próximas duas horas, até que a sombra de uma ilha cresceu no horizonte e começamos a nos preparar para a chegada.

- Você fica com o barco. - Falou assim que eu puxei o bote pra areia da pequena praia deserta. - Eu volto em.... Eu volto logo. Com certeza antes do amanhecer. Não durma.

Em poucos segundos já tinha desaparecido na escuridão. Eu estava com um pouco de sono, mas nunca dormiria sozinho em um bote. Esperei ali, olhando para a ilha e tentando evitar a imensidão do mar em minhas costas. O barco balançava com as ondas e, aos poucos, minha respiração passou a acompanhar seus movimentos.

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