21- ZENIT (Parte II)

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Limpamos e assamos todos os peixes, tomando o cuidado de deixá-los inteiros e com a cabeça intacta. Depois disso, destruí parte da velha rede de pesca que Zenit usara para me tirar do ar até obter uma boa quantidade de barbantes grossos, com os quais prendi os peixes através de um lais de guia. Então foi a vez de Zenit fazê-los flutuar de modo que, no fim, obtivemos nove balões comestíveis, os quais amarramos forte em uma haste de madeira, pesada o suficiente para impedi-los de sair voando.

Aquele pequeno grupo de crianças foi tudo o que precisamos para chamar a atenção da Ilha toda. Em poucas horas, dezenas de pessoas ocupavam a praia a espera do segredo prometido. Foi quando descemos do navio com nossos peixes voadores e vendemos cada um deles pelo preço exorbitante de cinquenta modestos.

O povo se divertiu. Zenit fez com que todos aqueles que tivessem experimentado da carne disponível para degustação flutuassem pelo menos durante alguns segundos, seu carisma lhe garantindo bons motivos para tocar nos alvos do encantamento. Com o dinheiro obtido compramos comida para nós e isca para os peixes. Durante a noite nos afastamos da Ilha para simular outra expedição, e repetimos o show no dia seguinte.

Vendemos doze peixes. A partir do terceiro dia, entretanto, as vendas começaram a declinar. Os peixes voadores já não eram novidade e muitos perceberam que se tratava de algum tipo de truque. No quinto dia de empreendimento, quase ninguém parou para nos dar atenção, e decidimos partir na manhã seguinte, em busca de novos espectadores. Foi quando conhecemos Lari.

A jovem chegou de fininho, pegou um pedaço do peixe que oferecíamos e recuou alguns passos para trás, ainda segurando a comida cuidadosamente entre os dedos. Quando julgou estar longe o suficiente, mastigou e engoliu. Eu e Zenit estávamos desanimados com a falta de movimento, e no começo não demos importância, julgando ser apenas mais alguém querendo comer de graça.

— Que estranho. — Seu comentário chamou a minha atenção. — Não estou voando. Será que funciona em todos, exceto em mim?

Cutuquei o ombro de Zenit e ele logo se adiantou em direção à moça. Ela tinha a pele mais bronzeada que a minha e longos cabelos negros que escorriam até a cintura. Tão logo Zenit estendeu a mão para cumprimentá-la, ela recuou alguns passos com agilidade, permanecendo fora de seu alcance.

— Não precisa ter medo. — Resmungou Zenit, surpreso com a situação. — Não vou fazer nenhum mal.

— Tenho certeza que não. — Ela respondeu com um sorriso. — Mas antes de colocar as mãos em mim, que tal me explicar o porquê de não funcionar?

— Você precisa deixar o corpo leve. — Zenit se aproximou em uma segunda tentativa. — Deixe-me ajudá-la.

A moça fugiu mais uma vez, agora em minha direção. Tinha um rosto muito belo e a expressão inteligente, mas algo em suas mãos esguias, de dedos longos e compridos, fazia com que a figura esbelta fosse um pouco assustadora. Correu para o meu lado e puxou uma de minhas mãos ao redor de sua cintura com agilidade.

— Seu amigo é apressado, hein? — Cochichou para mim.

— Se você não se concentrar, nunca vai conseguir. — Protestou Zenit.

Nesse momento consegui finalmente reagir à aproximação e me desvencilhei do abraço. Recebi um empurrão indignado em resposta.

— Talvez você tenha razão. — Ela continuou a conversa ignorando nosso desentendimento. — Mas há outra possibilidade: talvez os peixes não sejam mágicos, você é!

— O que você quer? — Derrotado, meu capitão verbalizou meus pensamentos. A moça deu uma gargalhada:

— Que tal um almoço? Por minha conta. — O tom de voz não deixou dúvidas quanto a sua intenção. Para falar a verdade, tudo aquilo era bem compreensível. Zenit era jovem, bonito, e dominava a magia.

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