8- TOMAS

184 32 232
                                    



Acordei com um som repetitivo. Metal batendo em metal. Ouvi o vento, distante. "A dor passou", constatei, mas não sabia ao certo se deveria ficar feliz com isso. Já ouvi falar que uma pessoa sempre acorda na hora de morrer. Esperei alguns minutos, mas a morte não veio. Por isso abri os olhos.

Um teto de madeira, feito de tábuas escuras bem encaixadas, iluminado suavemente pela luz do dia. Paredes de madeira avermelhada sem nenhum tipo de acabamento especial. Uma janela quadrada, coberta por uma grossa cortina feita de lã castanha bem penteada. Era um quarto, mas havia algo de diferente nele. As paredes, a janela, a porta, o armário escuro na parede oposta, a cama na qual eu repousava, coberto de pesadas camadas de cobertores e peles, tudo era exageradamente grande. Não de maneira luxuosa, pois o espaço do quarto continuava pequeno. O tamanho daqueles móveis era inconveniente.

Virei para o lado e percebi o quão aconchegado eu estava no meio daquelas cobertas. Vestia um camisão de lã que batia nas canelas. O ar ainda estava um pouco frio, mas as peles que dificultavam meus movimentos me mantinham agradavelmente aquecido. Pensei em voltar a dormir. Talvez tudo aquilo tivesse sido um sonho. Talvez eu nem fosse Romeo, o navegador azarado. Talvez eu fosse apenas uma criança despertando de um pesadelo. Isso explicaria os móveis gigantes.

Essa hipótese foi descartada quando avistei Tony em uma cama ao lado, embrulhado em cobertores tão grossos quanto os meus. Dormia como um bebê, as bochechas rosadas e um fio de baba pendendo da boca aberta.

Me libertei dos cobertores com pesar e me preparei para pular no chão. Fiz um pouco de barulho ao encostar os pés na madeira fria. No mesmo momento, o barulho metálico parou e ouvi passos pesados caminhando em direção ao quarto. Me encolhi, envergonhado, enquanto a porta abria rapidamente. Ocupando praticamente todo o batente, havia um homem de quase três metros de altura. Ele não era apenas alto. Seus ombros eram largos, seus braços e pernas grossos e o corpo cheio. Usava roupas de couro e tinha cabelos escuros até a altura dos ombros, mas não parecia nem um pouco selvagem. As roupas eram bem-feitas, o cabelo limpo e o rosto livre de barba. Parecia ter cerca de cinquenta anos.

— O pequenininho acordou! — Falou com um sotaque estranhamente gracioso que eu nunca havia ouvido antes. Suas bochechas eram grandes como o nariz e levemente rosadas. — Vocês são malucos. Passear lá fora vestido assim! Quase congelaram.

Eu estava sem reação, ainda surpreso com o seu tamanho. Ele me olhou com ar de interrogação.

— Ah! — Levantou um dos dedos grandes e rechonchudos. — Você quer sapatos. O chão tá frio. Pode vir aqui comigo.

Virou as costas e começou a andar. Aquela figura simpática não parecia ameaçadora, por isso o segui através da porta para um cômodo maior. Também era feito de madeira, exceto por uma lareira de pedra em uma das extremidades, na qual estava acoplado um fogão a lenha. Era mobiliado com uma grande mesa e três bancos, além de estantes e armários com utensílios e comida e um grande sofá de couro, no qual estavam jogados mais dois cobertores. Haviam mais três portas no cômodo além da que acabávamos de atravessar: duas grandes e uma pequena, menor do que eu. Ele se adiantou para a lareira e indicou dois pares de calçados encostados no beiral.

— Devem servir, né?

— Obrigado. — Murmurei enquanto pegava um par de botas de couro surradas, um pouco grandes demais para os meus pés. Estavam secas e quentinhas.

— Faz assim. Leva os do outro lá. Daí quando ele acordar, já tem sapatos.

Obedeci. Depois voltei para perto do gigante, que havia sentado em um dos bancos de madeira e voltado a fazer aquele barulho, que descobri ser o som da colher se chocando contra a tigela de enquanto ele batia manteiga. Aquela cena me fez lembrar da minha avó, morta há alguns anos. Leite era um produto escasso em Canelo, e por isso nossa família aproveitava todas as suas partes. Eu não conhecia aquele cara, nem sabia a troco de que ele tinha salvado a nossa vida. Mesmo assim, me senti confortável o suficiente para subir no sofá e me enrolar novamente em um cobertor. Determinados lugares são aconchegantes por natureza, e a gentileza do gigante ajudava bastante.

PrismaOnde histórias criam vida. Descubra agora