Duas peças de teatro. Foi tudo o que criei desde então.
A primeira delas é sobre um jovem e ingênuo pirata. Ao tentar se igualar aos personagens de suas histórias preferidas descobre um mundo sombrio, no qual grandes capitães são criaturas desprezíveis, egoístas, sempre prontos para enganar os amigos mais fiéis em troca de um punhado de castiços.
Desiludido, o protagonista começa a acreditar que o dinheiro é o único meio de crescer entre os piratas. Passa a almejá-lo, empenhando-se em esquemas inteligentes e engraçados para ficar rico. No final da história uma situação de injustiça faz com que lembre do que acreditava antes: inspirado, ele ajuda a aldeia de onde veio grande parte de seus tripulantes, colocando em risco toda a sua fortuna.
Ele quase perde tudo, mas no fim acaba rico e todos da aldeia o reverenciam, chamando-o de capitão.
A segunda também é sobre um jovem pirata, não tão ingênuo. Tudo o que desejava era fama, mas por onde passasse o confundiam com outras pessoas. Em cenas cômicas, ele é confundido com o padeiro e colocado para fazer pães. Ou então é confundido com o engenheiro e colocado para construir pontes. Ou ainda confundido com o rei e colocado para fazer leis.
Ele aceita todas as atribuições que lhe são dadas em uma tentativa tornar conhecido o seu nome, esforçando-se assim para assar os melhores pães, erguer as mais sólidas pontes e redigir as leis mais justas. Mas não importa o quanto afirme sua identidade (colocando a máscara dotada de olhos com todas as cores do arco-íris e longos cabelos brancos), os outros personagens simplesmente a substituem pelas faces (máscaras) de sua preferência.
Irritado, o personagem parte da ilha da história para fazer a sua história no mundo de fora. Nada mais é dito sobre ele, mas a fama de seus feitos atravessa os séculos, superando a de qualquer grande herói.
Fiz apenas uma cópia de cada peça.
Na contracapa da primeira, escrevi a seguinte dedicatória:
"Para Zenit, o pirata mais poderoso com quem já cruzei. Seria cruel demais ainda me recusar a chamá-lo de capitão? Seu destino é muito grandioso para alguém como eu, mas tenho certeza de que encontrará uma tripulação à sua altura. Por hora, fico satisfeito em considerá-lo um amigo. Estarei aqui, a espera de que volte do mundo de fora com histórias capazes de humilhar a débil imaginação de Lorde Tritão. Histórias de um pirata de verdade."
Na contracapa da segunda, escrevi:
"Para Tony Caleidoscópio, Anthony Nasa, filho de Netuno, que conseguiu em pouco mais de dez meses causar mais estrago à ordem mundial do que uma geração inteira de Mentirosos. Sua identidade é a mais autêntica que já conheci, e sua mãe sentiria inveja da aparência que foi capaz de criar. Agora que está livre das sombras do passado é a sua hora de brilhar. Não tenho dúvidas de que espalhará seu nome por todo o mundo, mas, de qualquer forma, asseguro: você jamais será esquecido."
Junto com cada um dos pequenos livros coloquei uma pérola que pedi para Thomas comprar com parte de nossa fortuna, o último presente aos meus amigos que, ao contrário de mim, ainda não haviam conquistado sua Vitória. Satisfeito, comecei a redigir a carta que os informaria de minha morte. Eu supostamente morreria doente, vítima de algum tipo de intoxicação. A carta também os convidava para vir encontrar Thomas e levar os poucos objetos que deixei para eles.
É claro que piratas como Zenit e Tony não têm endereço fixo, por isso tive que pagar para um grupo de confiança localizá-los e garantir que a mensagem alcançasse seu destino. O dinheiro seria pago em troca de cada carta contendo a assinatura do destinatário, como prova de que ele recebeu. Existem vários grupos em Arasmo especializados nesse tipo de serviço: uma vez que se tem acesso aos meios adequados, é um negócio que dá lucro.
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Prisma
FantasySobrevivente de um naufrágio, o navegador Romeo, introvertido e covarde, se vê perdido em uma ilha desconhecida. Sozinho, ele precisará encontrar os próprios meios de localizar seu irmão mais velho, de quem foi separado durante a tragédia. Entreta...