No dia seguinte estou no quarto junto com o Will. Ele fala e fala, mas minha cabeça está em outro lugar. Lá fora a tarde está clara e calorosa.
- Ei! - ele joga o travesseiro em mim.
- Ah...desculpa.
- Você passou o dia inteiro assim...meio desconectado com o mundo...o que foi?
- Nada não...só estou pensando.
Ele levanta e me puxa da cadeira. Segura meus ombros e me olha nos olhos.
- Você pensa demais - sussurra.
Aquilo me deixa desconcertado.
- Ah...eu...
- Tive uma ideia! Vamos lanchar alguma coisa, fora.
- Eu não...
- Não aceito não como resposta...vamos!
Nem tento discutir. Visto um suéter e vamos. Ele nos leva para a feira que fica em um cais. Pessoas caminham animadamente por aqui e por ali. Comidas nas mãos, conversando ou com sacolas de compras.
- Espera aqui. Te trago já o melhor cachorro-quente de toda Costa Leste.
- Isso eu quero ver.
Não tenho costume de comer fora, muito menos de vir a essa feira livre todas as terças. O Will tá me ensinando a viver.
Vou até a cerca de proteção do cais. Lá embaixo o lago é como um espelho. Vejo meu reflexo. Óculos, sardas, cabelo ruivo. Será que alguém um dia já sentiu atração por mim?
Um rosto aparece ao meu lado.
- Oi? - ele fala me olhando pelo reflexo.
Não consigo evitar e sorrio.
- Oi!
- Como você está? - pergunta Rafael.
- Muitíssimo bem.
- Isso é muito bom.
Alguém joga algo na água, destruindo os reflexos.
- Oi David - Rafael olha para mim - o que te trás aqui? - ele tenta segurar o sorriso.
- Nossa, essa é velha...estou só dando um passeio.
- Com a namorada? - ele pergunta inquisidor.
- Você sabe muito bem a resposta.
Ele parece envergonhado.
- Ontem fiquei me perguntando o por quê de eu não ter pego seu número...claro, pra poder te ligar e você me mostrar as maravilhas da cidade.
- A única maravilha da cidade está a minha frente - falo entrando no seu jogo.
Meu Deus! Estou flertando com um garoto.
- Nossa, me sinto até importante.
- Oi? - fala o Will com dois cachorros-quentes na mão.
- Uau! Que cara grande - fala Rafael, mas Will não ri.
- Will, esse aqui é o Rafael...um amigo.
- Hmmm. Vamos David?
- Nossa! - fala Rafael - acho que atrapalhei total o encontro.
- Encontro de quê hein? - fala Will entre dentes.
Rafael levanta as mãos.
- Não Will...deixa pra lá, Rafael foi um prazer ver você de novo...
- O prazer foi meu - ele sorri, mas vejo mágoa em seus olhos.
Depois que ele se vai me sinto horrível.
- Vamos no parque? Gosto muito de lá, eu e a Sue...
- Eu e a Sue, eu e o time, eu, eu e eu! O mundo não se resume a você William! - grito - Você chega na minha casa, quase toda tarde e fala, fala e fala, sobre sua vidinha de popular e de com é ruim estar fora do time. Eu cansei sabia! Eu também tenho uma vida.
- Eu...
- Não! Chega de "eu".
Ele me olha sem piscar. Os cachorros-quentes na mão.
- Olha, eu vou pra casa - falo respirando.
Quando começo a caminhar olho para trás, ele ainda está ali parado, me olhando. No meio do caminho me lembro que não dei meu número para o Rafael.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Neve sobre o Ébano (Romance Gay) - Concluído
RomansDavid é um garoto simples que passa seus dias estudando e no trabalho de meio expediente em uma lanchonete, para ajudar a mãe com as despesas, mas que vê tudo desmoronar a sua volta quando surge uma ordem de despejo na sua casa e ele é demitido. Wil...