Humanidade Suprema │ Feitiço Viral

Capítulo Quarenta e Um - Sentimentos em Chamas

As luzes da cidade de Suzano cintilavam na escuridão da noite, se misturando as estrelas no céu noturno. Sofia estava a caminho do armazém, local que foi palco da primeira - E inédita - derrota da caverna para o universo civil. A cada passo, uma crescente sensação de inquietação a envolvia. As últimas semanas tinham provado a ela que havia um outro caminho, além daquele que seus pais a haviam imposto. 

— Eu posso começar tudo do zero. — Ela repetia os pensamentos que inundavam sua mente. — Talvez, pelo que todos dizem... Há um motivo para meus pais terem sido exilados... Preciso saber o que aconteceu... 

Após Jeane mencionar que precisariam voltar ao local da derrota, Sofia soube o que deveria fazer, afinal, apenas seu irmão poderia dizer o que havia acontecido. Memórias há muito esquecidas, quando sua família ainda era unida, inundaram sua mente. Ela recordou os grandes jantares em Malrandir, sempre repletos de pessoas curiosas para vê-los. 

"A grande família Salastiel..." Sofia pensou. 

— Mas, a historia não bate... Se eles foram exilados quando nasci... — Quem havia contado essas histórias para ela foram seus pais e quanto mais ela pensava a respeito, mais inconsistente os fatos se tornavam.

Outras lembranças vieram à tona, como as visitas de seus pais a parentes distantes, que há muito tempo haviam abandonado tanto o universo de Claridea quanto o Supremo, seus descendentes não sabiam sobre nada além do universo civil. Os pais a levavam, sempre lembrando-a de manter segredo sobre o mundo que habitava. Lembrou-se também do tempo que passou internada no hospital, quando tentou despertar seus poderes ao se jogar do telhado de casa. Agora, aquela memória a fazia rir, mas, na época, a frustração com seu fracasso era imensa, assim como a incompreensão de Toni, que ficou ao seu lado durante todo o tempo no hospital.

Os pensamentos a levaram ainda mais ao passado, a uma véspera de Natal em particular, quando ela havia acabado de aprender a falar. Foi a noite em que Dick manifestou pela primeira vez seu dom para a magia, e a ansiedade dela em despertar o seu próprio cresceu, embora fosse apenas um bebê.

Mas, acima de tudo, Sofia recordou-se da noite anterior àquele Natal, ela tinha cerca de quatro anos, Dick tinha dez e eles viviam no mundo civil. Toni sempre os visitava, trazendo presentes de suas viagens. Mesmo com apenas onze anos, ele já agia como um adulto, emancipado aos sete por razões desconhecidas, mas que pareciam ter prejudicado a família, embora, naquela época, ainda conservassem algum prestígio no Elisio, o planeta natal da humanidade no universo supremo.

Até aquela noite.

Sofia havia saído de seu quarto para espiar os presentes sendo colocados sob a árvore. Ela nunca acreditou em Dick e nas histórias sobre o velho barbudo que trazia os presentes, naquele Natal ela estava determinada a descobrir a verdade. Passou pelo quarto de Dick, que na época estava doente, e paralisou, nos degraus acima da sala. Do quarto de Dick vinha a voz de Toni.

— O que aconteceu com você, afinal? — Perguntava Toni a Dick, com uma voz carregada de preocupação e ansiedade. — Você estava perfeitamente saudável desde a última vez em que te vi...

Sofia se aproximou em silêncio, querendo entender o que estava acontecendo. Na época, Toni era seu adorado irmão mais velho, que sempre trazia presentes e que cuidava dela.

Sofia passou silenciosamente pelo quarto, mas parou abruptamente depois de alguns passos, quando Toni assumiu uma voz estranha.

— Eu prometo sempre estar com vocês Dick. — Disse ele, sua voz transbordava de poder, Sofia pôde sentir do outro lado da parede que parecia se aquecer a medida que Toni se aproximava.

A garotinha correu para a sala de estar, se escondendo sob o pinheiro, neve falsa caiu em sua cabeça quando ela se esgueirou entre os galhos baixos, felizmente as luzes estavam apagadas. Minutos depois, Toni apareceu, acompanhado pelos pais, Belaia e Jânio.