_𝔻𝕖𝕫𝕖𝕤𝕤𝕖𝕥𝕖.

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Era manhã e um silêncio pairava na casa dos Houghlin. Tom não direcionou uma única palavra para as filhas, e essas por vezes suplicavam com olhos grandes para que a mãe tentasse amenizar o clima. Mas parecia impossível. Olívia já havia tentado começar assuntos leves e alegres, mas ninguém conseguia responder com a mesma energia e logo a falácia caía em mais uma tentativa fracassada de remediar o que não tinha cura.

Olívia é médica, e bem sabe que, muitas vezes, para resolver um problema interno é necessário abrir o corpo. E ela e o marido conversaram sobre como iriam seguir com esse procedimento. O corte deve ser preciso e causar menos dano do que o problema. Tom precisava ser um bisturi, e não uma britadeira que vá estraçalhar ainda mais a família, portanto decidiram deixar o dia passar em silêncio para que todos tivessem tempo de pensar.

E agora era o momento de agir.

— América? — ele chamou, e a filha estremeceu, mesmo que estivesse esperando desde o crepúsculo por essa conversa.

Kimberly também temeu pela irmã, e por si mesma.

A caçula foi até o pai, que estava de braços cruzados, rígido. Ela podia sentir a raiva dele, e como ele tentava despistá-la com gestos nervosos de tensionar os músculos e piscar com força.

Ficaram em silêncio, e Amy pensou que seria esmagada pela pressão do ambiente.

— Eu estou decepcionado com você, América. — o homem falou, olhando para a a filha. Essas talvez tenham sido as palavras mais difíceis que Anthony pronunciou em sua vida, e América as sentiu com força no coração. 

Ela abaixou a cabeça, chateada, mas levantou o olhar quando ouviu seu pai fungar. Notou então que ele tinha lágrimas nos olhos e aquela imagem aterrorizante de um pai que arrancaria a sua cabeça se distorceu, mostrando-lhe a realidade: ele era um homem, e como qualquer homem, Tom era vulnerável também. 

América não conseguia entender o que o atingiu com tanta força, mas algo indicava que era sua culpa, e aquilo a encheu de tristeza, e de seus olhos esverdeados também brotaram lágrimas. O homem respirou fundo, na tentativa de se recompor, e encarou os olhos marejados da caçula, voltando a falar:

— Mas eu fiquei com raiva. Com muita raiva. E isso foi errado. América, você... você é uma moça, logo será uma jovem adulta e suas decisões serão de sua responsabilidade. Só que, até o momento atual, você está sob nossos cuidados. Diga-me, filha, o que se passava na sua cabeça naquela hora?

Ela se remexeu. No fundo, seus pais só queriam entendê-la. Olhou para o lado, onde viu sua mãe e sua irmã completamente atentas à conversa.

— Ela pareceu legal. Bonita... e era uma festa.

Tom deixou uma respiração pesada escapar.

— Você já fez isso outras vezes? — ele perguntou seriamente. Ela apertou as mãos.

— Algumas.

— E em que ponto você costuma parar, América?

O temível silêncio aparece novamente. Aquela conversa não era confortável para ninguém, mas era necessária. América não consegue responder, então seu pai volta a ter a palavra.

— Veja... sua mãe e eu te amamos. Amamos vocês duas. E queremos o melhor para vocês. Que sejam saudáveis, que sejam felizes, que tenham... todos os dias de sua vida um motivo para levantar da cama. — ele olha pra Olívia por um instante, confirmando se o que dizia fazia sentido e se estava dentro do roteiro que os dois prepararam no dia anterior. Ela sorri, confirmando que seu trabalho estava se saindo de forma aceitável, e ele volta a olhar para a filha com uma pitada a mais de confiança. — E nós nos preocupamos com vocês justamente por isso. Queremos conhecer as pessoas com quem vocês estão se relacionando. Seus amigos, nossos futuros genros. Ou noras. Mas é bom que tenhamos, como pais, essa certeza de que vocês estão rodeadas de pessoas boas, responsáveis, íntegras... Ou se não estiverem, ter a certeza de que vocês conseguem manter a cabeça no lugar...

Terra Nova - ᴀᴘᴘʟʏ ғɪᴄOnde histórias criam vida. Descubra agora