França, 1885
- Querido, será que posso saber o que lhe deixa tão pensativo nesta quarta-feira cinzenta?
Perséfone aproxima-se de seu marido, sentado defronte à mesa de seu escritório onde se podia ver uma pena com a tinta já seca e alguns papéis espalhados, tocando-lhe suavemente o antebraço. O moreno fitava a janela, claramente perdido em suas ideias. Qualquer preocupação que tivesse, entretanto, não o impede de sorrir, apaixonado, para sua esposa.
- Apenas tentando imaginar se meu irmão vai tomar juízo num futuro próximo.
A risada da filha de Deméter era como o bater de asas de uma borboleta.
- Ah, querido, já desisti de esperar atitudes puramente sensatas dos homens desta família. Vocês são muito... passionais.
O primogênito de Jaques levanta uma das sobrancelhas e ofega, como que ofendido e surpreso, mas em verdade aquela fala muito lhe divertira.
- Olha, não sei se existe alguma outra pessoa neste mundo que me definiria como "passional". Poseidon eu até entenderia, com seu temperamento forte e a dramaticidade que ele mesmo adora pintar em sua profissão, mas eu? Costumam me classificar como "quieto" ou até "soturno", sabia?
- Mas isso é porque eles não te conhecem como eu.
O repuxar de seus lábios era tão doce que lhe conferia um aspecto quase angelical.
- Senhora Perséfone Garth Legrand, não sei o que fazer com você, sabia?
- Pois eu até tenho uma ou duas ideias, senhor Hades Edgard Legrand...
O sorriso até então contido do mais velho espalhou-se por todo seu rosto e ele não perdeu um segundo sequer para conferir com o canto dos olhos se a porta do gabinete estava fechada e então puxar sua esposa para si, fazendo-a sentar em seu colo.
- Estou começando a achar sua linha de pensamento deveras interessante, ma petite rose. Elabore mais.
A jovem soltou uma risadinha excitada e acomodou-se melhor por sob as coxas masculinas, enquanto tocava-lhe os cabelos escuros – compridos o suficiente para exibirem pequenos cachos – e sua outra mão traçava um caminho descendente, em direção os primeiros botões de sua camisa.
- Nada muito complexo, lhe asseguro. Inclusive acho que talvez eu seja melhor em demonstrar do que falar.
Hades podia afirmar que não havia nada no mundo que se comparasse com aquele leve rubor que lhe tomava as faces delicadas, deixando-a ainda mais parecida com um precioso botão de flor rosado num jardim primaveril.
- Então não vamos perder mais tempo, ma chérie. – Lábios afáveis quase tocavam os seus quando ele acrescentou uma última frase – Sou todo seu.
E era mesmo.
Que todas as divindades que já pisaram no mundo comprovassem, mas cada pulsar daquele corpo masculino pertencia àquela mulher. Os cabelos escuros lhe caindo pelos ombros como uma cachoeira viva e fresca, a luxúria despertada por sua pele que ressentia à romãs, com seu exótico dulçor. Tudo o que sabia era querer provar daquela fruta, lambuzar-se da sorte e do amor que lhe eram oferecidos naquela promessa do "para sempre". Desfrutar das seis pintas que ele sabia repousarem próximas a seu seio esquerdo, como que sementes da sedução plantadas ali com o único propósito de fazê-lo enlouquecer e sucumbir às potentes sensações que ela despertava em seu âmago.
Perséfone sentia-se florescer diante daquele olhar de ônix. Podia ter sido um dia muito pura e recatada, mas cada hora compartilhada com o homem que aprendeu a amar enchia-lhe de uma euforia crescente. Queria tudo que ele estivesse disposto a dar-lhe e ainda sempre mais. Mesmo ali, enquanto sentia os laços de seu vestido serem desfeitos e as mãos – sempre muito frias, é verdade – tocando-lhe intimamente, a mera lembrança da cadência apaixonada de quando ele lhe tomara pela primeira vez ou ainda quaisquer célere carícia que houvessem compartilhado no canto escuro de um baile qualquer, quando tinham certeza de que não havia ninguém vendo, lhe roubavam o fôlego. Nenhum tempo ao seu lado jamais seria suficiente, então não deviam haver mais preâmbulos: se Hades a tratava como uma rainha, ela reinaria imperiosa por cada um dos domínios do prazer.
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Amarras
DragosteMadeira é o destino de Poseidon. Duro, seco, oco. Pérolas são as aparências que Atena e os Hugh insistem em manter. A altiva frieza e distância que ela colocou entre si e o mundo. Conchas são um presente singelo e significativo. É a quebra de barrei...