Capítulo 26 - Lar, doce lar

28 8 33
                                    

Ela estava de volta.

Aneline caminhava pelo campo gramado de Vale Laguna. O grande livro velho pesava embaixo de seus braços. Ela tomou cuidado para não deixar que caísse e que aquelas páginas se abrissem. Não queria ser sugada para o Mundo das Bizarrices novamente.

Passou ao lado do parquinho, onde algumas crianças menores brincavam. Mais a frente, pessoas perambulavam ao longo da clareira, entre os comércios feitos de madeira. Uma fraca brisa vinha da floresta, acompanhada do assovio do vento. Os raios alaranjados do pôr-do-sol rasgavam as altas montanhas em volta do vale. Já escurecia.

A garota seguia para a floresta. Passou por alguns troncos postos sobre riachos. Ela tomou muito cuidado para não deixar o livro cair. As folhas secas estalavam com as pisadas de Aneline.

Ela ouvia risos. Passou a ter aflição disso, principalmente após ter enfrentado a Princesa de Corações Floridos, dona da risada mais fofa e maléfica. Aneline se deu conta de que vestia a túnica de elfo, ainda suja de sorvete. Olhou para o lado e notou Taruska, sua rival da escola. A menina de cabelos azuis, juntamente com as amigas puxa-saco, ria da aparência de Aneline.

— Parece uma bruxa feiosa! — zombou Taruska, de nariz empinado. Gargalhava com as amigas, referindo-se à túnica roxa, livro velho, e aparência largada de Aneline.

Ane pensou em mais de mil respostas para ela, mas achou melhor não dizer nada. Agarrou-se ao livro e seguiu para seu barraco no meio da floresta.

Chegando lá, bateu na madeira úmida da porta antes de abri-la. Caso contrário, seu pai, que ficava imerso no computador, acabaria tomando um grande susto. A habilidade de se assustar facilmente era um dom de família.

— Oi, Ane — ele a recebeu, sem tirar os olhos da tela do computador. Seu tom era triste, e sua postura era de quem tentava manter o foco.

Para ele, apenas algumas horas haviam se passado. Coisa comum. Ane ia a biblioteca constantemente e sempre voltava no horário correto. Era 17h52. Ela havia voltado antes das 18h como combinado, e ganharia o macarrão que seu pai prometeu. Mas naquele momento, a garota derramava lágrimas. Para ela, não foram algumas poucas horas, e sim vários dias. Estava com muita saudade de seu pai.

— Papai! — Ane deixou o livro sobre a mesa e correu para abraçar o homem de sua vida. O agarrou pela cintura, já que ele não saiu da cadeira do computador.

Hector achou aquilo curioso. Estranhou o carinho repentino da sua filha. Isso o fez esquecer da tristeza por um instante. Levantou-se e a abraçou.

— Como vai, querida? — ele foi sereno, enquanto a tinha nos braços. Percebeu que havia se sujado com algo, então se afastou. Era o sorvete da roupa da garota. Hector também percebeu que ela vestia uma túnica roxa e que não estava com seus óculos. — Aneline, cadê seus óculos?!

A garota não esperava por isso. Até mesmo temia levar uma bronca.

— Teve um... desvio. Eu não achei livros muito interessantes na biblioteca e comprei essa fantasia na loja do Seu Valmir... Sabe... O personagem que estou representando não usa óculos, então eu o guardei... — A garota sorriu amarelo. Não esperava que sua história fajuta soasse convincente.

— Eu te permiti ir para a biblioteca, e você acabou indo para a loja de fantasias e também comprou sorvete? — ele apontou para o sorvete escorrido na roupa dela. Também lamentou por sua camisa social que se manchou completamente.

— Sim. Foi isso — a garota respondeu temerosa.

Hector suspirou, e então fitou os olhos molhados da garota.

— Tudo bem. Conversamos sobre isso depois. Já é hora do jantar! — concluiu o homem de bigode volumoso.

A garota se afastou por um instante. Foi até a mesa e pegou o livro. Então o guardou em uma estante capenga em frente a sua cama. Ela arranjou um espaço ali para pôr o Mundo das Bizarrices. Ane olhou em seu baú e pegou uma das poucas roupas que haviam ali.

Mundo das BizarricesOnde histórias criam vida. Descubra agora