A Concorrência

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 Nos mudamos no fim da semana, quando finalmente atinjo os oito meses de gestação e me pergunto se é possível que a minha barriga cresça mais. Enquanto Tom, Sara, Harrison e Eli descarregam as poucas caixas com meus pertences, minha melhor amiga me obriga a sentar meu traseiro enorme no sofá com um pacote de palitos de cenouras, e assisto com os pés para cima enquanto os outros se matam para carregar as minhas tralhas, a cabeça de Tessa repousando sobre as minhas pernas.

 Quando eles terminam, Sara olha ao redor com um beicinho, mas acaba por sorrir para mim. Quando a abraço após esta estender os braços em minha direção, ela me faz prometer visitá-la toda semana.

 Agora, quase uma semana depois, estou sentada no meu canto favorito da casa, enrolada numa manta enquanto tento entender a matéria das últimas provas e finalizar mais um trabalho acadêmico. Apanho a xícara de chá sobre a mesa e bebo um gole, sentindo o vapor contra o meu rosto me deixar um tanto sonolenta... Inclusive, o sono se tornou um problema nos últimos tempos, porque o esforço de carregar uma barriga alta, comprida e perfeitamente arredondada contribui e muito para que uma dorminhoca natural se torne ainda mais preguiçosa. Agora, some isso ao fato de duas crianças lhe chutarem dia e noite como se pudessem abrir caminho para fora através dos pés!

 Volto minha atenção para o documento aberto no computador, me esforçando para ler as letrinhas que parecem me dar ainda mais preguiça. Refaço o coque nos meus cabelos, agora curtos, e pisco algumas vezes na tentativa de entrar em alerta, mas tudo o que consigo é me frustrar ainda mais por não me tornar um descendente de Albert Einstein de repente.

 Sem pensar direito, abro um documento em branco e começo a digitar.

 "Quem foi que disse que seria fácil? Quando você conhece um cara num bar de universitários, ele não vem com um manual de instruções. Não é como se viesse com um botão escrito "aperte aqui e ganhe dois bebês", muito menos como se logo abaixo tivesse um aviso em letrinhas miúdas dizendo "de brinde, você levará uma multidão de fotógrafos e fãs alucinadas em suas redes sociais".

 Às vezes me pergunto o que eu tinha na cabeça naquele tempo. Outras, pergunto se teria feito algo diferente.

A resposta é não."

 Me recosto na cadeira com um suspiro, acessando o documento do trabalho por fim. Digito uma conclusão vaga, rezando para que a professora não note minha falta de interesse, e confiro todos os tópicos para garantir que está tudo nos conformes.

 Alguém se apoia nas minhas pernas e encontro Tessa debruçada sobre elas, os olhos escuros fixos em mim antes dela começar a farejar minha barriga, como sempre.

 — Fala, garota. — digo, esfregando sua cabeça antes de enviar o documento. — Tom encheu sua tigela, não? Não?! Morda as canelas dele!

 — Não posso virar as costas por dois minutos que já começam a falar mal de mim... — ouço-o na sala de estar, me fazendo conter o riso.

 Me viro a tempo de vê-lo colocar a cabeça para dentro do escritório e estreitar os olhos para nós, fazendo Tessa latir. Enquanto ela corre em sua direção abanando o rabo, não consigo deixar de notar o piano atrás dele, o que me faz desviar o olhar. É impressionante como minha relação com o instrumento é instável; tendo dias que não consigo me levantar dele e outros que mal consigo encará-lo.

 Apanho a xícara mais uma vez, bebendo todo o restante do conteúdo enquanto ouço passos atrás de mim. Tom então aperta meus dois ombros, me fazendo gemer e pender a cabeça para trás.

 — Como vai o trabalho. — questiona, e contorço meu rosto numa careta que o faz rir. — Tão ruim assim?

 — Levou o restante da minha sanidade, paciência e autoestima. — murmuro, fechando os olhos e soltando um suspiro de alívio quando seus dedos continuam a pressionar meus músculos. Quando reabro, faço minha melhor expressão de cachorrinho abandonado. — Acho que mereço um descanso da Yoga hoje.

All My Life | Tom Holland ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora