A pior das memórias

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"Quem é você?!"

"Para onde está me levando?"

"Me solta!"

"Não! Por favor! Não!"

Durante o sonho, eu não havia revivido o momento, não por completo. 

Tudo estava escuro e a única coisa que eu escutava eram gritos, os meus gritos. A pequena América de dez anos gritando e chorando, arrastando as unhas pelo chão.

Eu não via nada, eu não sentia nada. Eu só escutava as preces e os pedidos de socorro.

Até que eu despenquei no vazio.

~~

Eu acordei num pulo, já me sentando na cama e pronta para bater em qualquer um que aparecesse na minha frente.

— Ou! Ei! Ei! — disse alguém. Minha visão estava conturbada e eu não conseguia identificar nada. Minha respiração estava acelerada e meus braços chegavam a pregar um no outro por causa do suor. Pisquei os olhos várias vezes e quando enfim os abri direito, vi uma cabeleira loura que eu reconhecia muito bem. 

Dei um longo suspiro.

— Lee.

O garoto colocou uma mão sobre a minha.

— Você está bem agora. Está segura na enfermaria.

Olhei ao redor, como se realmente precisasse de provas que estava na enfermaria. Então me lembrei de tudo, do escorpião, da picada, do veneno. 

Da sensação de morte e do sonho. A pior das memórias sendo revivida. A única que eu fazia questão de esquecer.

— Você vai ficar com uma cicatriz legal. — Disse o loiro dando as costas para ir até um dos armários. — Parece um sol mais estilizado, como se estivesse derretendo.

— Massa — resmunguei. — um sol para a filha da deusa obscura, muito legal.

Lee se virou para mim com um leve sorriso.

— Você está bem agora, América. Não deu tempo do veneno tomar conta de você por inteira.

— E Percy e Annabeth? — Perguntei — eles estão bem?

O filho de Apolo desviou o olhar enquanto caminhava até mim e me entregou um pote de ambrosia.

— Come um pouco mais, você está pálida.

— Eu sou pálida.

— Não era quando morava aqui — ele retrucou torcendo a boca — a Inglaterra te deixou pálida.

Depois de engolir a ambrosia e sentir uma dose de adrenalina percorrendo meu corpo, fitei os olhos do loiro.

— Onde estão Percy e Annabeth? — insisti.

Lee passou a língua pelos lábios.

— Ainda desaparecidos. Você só apagou por uma hora.

Pulei tão rapidamente da maca que minha visão chegou a ficar turva.

— Então o que é que a gente tá fazendo aqui ainda? 

Lee piscou os olhos várias vezes.

— Bom, eu tô cuidado dos feridos, já você era um deles.

— Exatamente, Fletcher — falei apontando o dedo para seu peito — eu era

Então sai correndo para a porta, gritando um "Tchauzinho" assim que passei por ela.

Corri até a floresta, tentei achar o exato local em que eu havia visto Percy e Annabeth pela última vez e para minha surpresa, não só eles estavam lá como também praticamente todo o Acampamento.

Fui me aproximando devagar, sem chamar atenção.

—  É verdade! —  Escutei Percy exclamar — Estávamos sendo atacados por três escorpiões e nos escondemos nas rochas, só nos ausentamos por um minuto.

— Vocês estão desaparecidos — falei em voz alta, a multidão se assustou com minha presença e abriu caminho para que eu caminhasse por entre eles até que finalmente pudesse ver o filho de Poseidon. — Há mais de uma hora. O jogo já acabou.

Clarisse deu um passo a frente e troquei um leve sorriso com ela. Annabeth encarou nós duas com atenção.

— Isso definitivamente é novo —  falou ela, então se virou para Quíron. — Nós caímos num buraco e...

— Um buraco? —  Interrompeu o centauro, batendo os cascos traseiros no chão.

Annabeth respirou fundo e olhou para os outros a sua volta.

— Quíron, talvez devêssemos conversar isso na casa grande.

O diretor de atividades assentiu e seu rosto se tornou sério, como se estivesse pensando em algo e tivesse que se concentrar muito para isso.

Clarisse suspirou.

— Vocês acharam, não foi?

Isso chamou minha atenção. Observei enquanto as duas garotas trocaram um olhar e Annabeth mordeu o lábio.

— Eu... sim. Encontramos.

Os campistas começaram a fazer perguntas e murmurar. 

Foi então que percebi. As rochas, o buraco, Percy e Annabeth desaparecidos por uma hora mas pensando que foram apenas alguns minutos... eles encontraram uma entrada, encontraram uma forma de entrar no labirinto.

—  Essa noite não é  momento, e tampouco este é o lugar certo —Disse Quíron olhando para as rochas como se estivesse acabado de perceber como eram perigosas. — Todos vocês, de volta para seus chalés. Durmam um pouco. Foi um jogo bem executado, mas já passou a hora de vocês se recolherem!

Houve murmúrios e queixas, mas os campistas se dispersaram, conversando entre si e lançando olhares desconfiados para Percy e Annabeth.

—  Isso explica muita coisa,— disse Clarisse enquanto caminhávamos para perto deles — Explica oque Luke esta procurando.

Oh, Luke. Olha no que você se meteu.

—  Esperem um segundo — pediu Percy— O que vocês estão dizendo? O que foi que encontramos?

Annabeth voltou-se para o garoto.

—  Uma entrada para o labirinto, uma rota de invasão saindo direto do coração do acampamento.

Se dissessem para a América de onze anos que Luke Castellan trairia o Acampamento, se tornaria general de Cronos e planejaria invadir o Acampamento Meio-Sangue através do Labirinto de Dédalo eu diria que essa pessoa está louca.

Mas aqui estou eu, vivendo tudo isso e ainda assim não conseguindo odiar Luke por completo.

O que foi que ele fez comigo? 

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Como esse capítulo foi curtinho, de noite vou postar o próximo!

When Worlds CollideOnde histórias criam vida. Descubra agora