Capítulo 61: Enterro.

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Boa leitura, xoxo

 A R I A

 No dia seguinte, era um dos dias mais tristes que iríamos presenciar na nossa terra. 

 Toda vez que voltávamos de uma guerra, existiam os enterros e celebrações para os mortos. Tínhamos perdido um número consideravelmente pequeno de guerreiros, mas isso não diminuía a dor da perda, principalmente quando Ruby estava no meio deles. Ela morreu de uma forma tão injusta. Sabia que seu sonho era morrer lutando, de forma digna e isso foi tirado dela sem mais nem menos. 

 Não podia fazer qualquer coisa, nem ir atrás de Zayn, como era a minha vontade, sem antes enterrar Ruby. A mente do meu parceiro estava... quieta demais. Não deveria estar tão pacífica e por várias vezes me perguntei se ele estava apagado, mas não sabia dizer. No momento, porém, não poderia focar nisso.

 - Cada guerreiro, cada fêmea e macho illyriano que lutou ontem, lutou com honra e dignidade. Nenhum deles morreram em vão. Cada um, cada um, ajudou para conseguirmos sair vitoriosos ontem. - Encaro o meu povo, que tinha expressões mistas no rosto. Estavam felizes pela vitória, mas tristes por suas perdas. - Sem eles, nosso mundo como conhecemos, agora mesmo, estaria um estrago completo. Eu, nós, não conseguiríamos vencer sem o esforço de cada soldado que lutou e ás suas famílias, eu digo o meu muito obrigado. Aos que partiram, eu desejo uma boa ida, que o Caldeirão os tenha e que a Mãe os receba. - Era uma frase antiga que tínhamos que sempre era usada para se despedir dos mortos, mesmo que agora o Caldeirão tenha tomado outro significado. - Cada um de vocês foram importes, descansem em paz agora. 

  Não sei para quem eu digo essa última parte, mas um sinto um calor no peito e um arrepio na pele. Espero que todos estejam fazendo um bom caminho de ida agora. Fazendo o sinal da Corte Noturna para respeito, que era colocar a mão direita no ombro esquerdo e se curva, vejo o meu povo imitar o movimento e desço, indo me juntar a minha Corte para enterrar Ruby. 

 A pior parte do dia estava apenas começando. 

 *

 Nunca tememos a morte, por acreditarmos na vida-além. Nosso espírito não morria, apenas trocava de corpo, dimensão, realidade ou o que quer que fosse. Mas ainda assim, não tornava as coisas mais fácies quando acontecia na nossa frente, com alguém próximo. 

 Diferente dos humanos, como eu ouvi dizer, não enterramos nossos mortos na terra. Nossa mãe e nossa casa eram as montanhas e agora mesmo estávamos marchando para dentro de uma, o corpo de Ruby descansando em um caixão levado por Emerald, Amethyst, Sapphire e Niall.

 Os túneis de Akaholly, como era chamada essa montanha, eram totalmente o oposto do da Prisão. Enquanto a Prisão era frio e escuro, mantínhamos esse caminho o mais brilhante e aconchegante que podíamos, para as almas sempre que quiserem visitar ou se despedir partirem de forma feliz, não mórbida, apesar de tudo. 

 Várias pessoas atrás de nós param nas "cavernas" destinadas a sua família, enquanto nós seguíamos para o andar mais baixo, onde membros da linhagem real e a sua Corte era enterrados. Ruby estava indo ocupar o seu lugar e eu estava tentando o máximo não chorar o meu caminho inteiro até lá. Sabíamos que lamentar e sofrer apenas os prenderiam aqui conosco, enquanto quanto mais aceitássemos, melhor seria a sua partida e eu não queria dificultar isso em nada para ela. 

 Os intermináveis degraus passaram como um borrão e quando chegamos na base da montanha, estávamos sozinhos. Todos os outros tinham ficado em lugares antes do nosso e agora era isso. O fim da linha. 

 Aguentar de forma intacta enquanto cada um se despedia foi algo que eu não consegui. Estava me debulhando em lágrimas em cada palavra que saia da boca de cada um que se despedia de uma amiga, de uma companheira, de uma irmã. 

 Quando é a minha vez, não sabia se iria conseguir, mas o conforto da mão de Louis no meu ombro e os olhos de todos me fazem tirar forças para me despedir da minha amiga. Eu não me perdoaria se não fizer isso. 

 - Eu nunca esperei ter que me despedir de você, Ruby. - Seu rosto estava tão sereno, agora que estava limpo e trataram os ferimentos. - Você era a única, única, que eu sentia no fundo do meu coração que nunca iria se apagar. Você era doida, você era alegre, você era viva. E vai continuar sendo, só que agora, apenas em nossos corações. Você fará uma falta absurda e eu espero que seja lá onde você esteja, esteja bem e feliz. Adeus, minha amiga, minha irmã. 

 Todos nos sentimos quando o fogo da sala fica mais quente e vibrante. Sabia, no fundo, que isso era o seu jeito de nos dizer adeus. Ainda chorando, ajudo a colocar seu caixão no local na pedra e com uma última olhada, nos despedimos em definitivo da pessoa que mais viveu e que mais nos fez alegres nessa sala. 

 * 

 Novamente na Corte, eu queria entrar no meu quarto e ficar no escuro por horas, dias, semanas, o que fosse, até tudo passar ou então eu acordar de um sonho e notar que nada disso tinha acontecido. Mas, a vida não estava ao meu favor e logo eu tinha que cuidar de outro problema, mesmo com o peso constante da perda machucando o meu peito. 

 Achei melhor enfrentar Zayn de vez antes de finalmente poder desabar. 

 Não encontro ninguém, então, desço as escadas até as celas sozinhas. Sinto um deja-vu ao descer e encontrar Zayn em uma das prisões, só que dessa vez, ele não está confuso ou assustado. Os olhos violetas continuam, mesmo que pareçam menos brilhantes e intensos, mas o ar era tão confiante que por um momento eu esqueci quem estava preso e quem estava solto. 

 - Enterrou a raivosa? Não foram poucas as vezes que eu pensei que isso seria algo útil e esperto de se fazer, graças ao Caldeirão Yue fez isso por nós. - Ele não podia me atacar fisicamente, então estava apostando nas palavras. Coitado. 

 - Como está indo com a sua dieta de ferro no sangue e na cela a sua volta? Poder o suficiente para você? - Ele vacila. Não sabia que desde ontem estávamos o apagando de hora em hora para ejetar uma quantidade de ferro no seu sangue que não lhe mataria, mas lhe deixaria fraco. As bolsas embaixo dos seus olhos eram prova o suficiente disso. 

 - Inteligente. - Zayn admite, mas vejo no seu rosto as engrenagens da mente trabalhando para a próxima. - Mas e então? Me neutralizam agora, quem disse que ele... - Ele aponta para si mesmo. - Não vai ter que lutar comigo dia após dia? A tentação de dormir do seu lado e simplesmente... - Seu dedo sobe até o pescoço e ele imita um corte. - Ou então matar um pequeno bebê? - Apenas a menção disso me faz querer proteger meu filho. Uma voz no fundo da minha cabeça gritando, um constante aviso de perigo, se faz presente. - O Zayn nunca mais será confiável novamente. 

 - Ele foi até agora, não foi? - O sorriso arrogante no seu rosto é o que me mata. A confiança dele para alguém que estava em tanta desvantagem não é normal. Ou ele estava blefando ou ele sabia de algo que não queria nos relevar ou éramos muito lerdos para notar por nós mesmos. 

 - Ele nunca tinha chegado tão longe quanto dessa vez. Eu nunca tinha conseguido assumir o controle. Agora que já foi uma vez, é questão de tempo até conseguir novamente. - O encaro, tentando passar uma certeza que não tinha. 

 - Acho que vou correr o risco. - Aproveitando as minhas novas habilidades de perceber a realidade, aplico o ferro em seu sangue, pressionando o embolo da seringa  enquanto observava o seu sorriso morrer, quando o corpo caia no chão. 

 Ele não tinha percebido quando eu peguei a agulha guardada nas minhas vestes e o ataquei, eu estava percebendo cada pequena coisa. Como o tom dele de falar era diferente. Os trejeitos. Até mesmo a respiração. De uma coisa, eu tinha certeza. Iria matar, ou pelo menos sumir, com isso. Suas palavras, no entanto, iria permanecer grudadas na minha mente. 

 Essa coisa iria ser neutralizada, iria ser apagada, mas a sensação de que não seria para sempre iria nos assombrar pro resto da vida. Não sabíamos o que esperar quando Zayn voltasse para o próprio corpo, se voltasse. Será que ele realmente lutaria dia após dia com a vontade de me matar? Se isso fosse verdade, não apenas eu, como o nosso filho, iria correr risco constante nos próximos anos. 

 Deixando o corpo desmaiado no chão, com uma última olhada, queimo a seringa da minha mão e a deixo ir, enquanto subia os degraus com as lágrimas escorrendo. Mesmo com a vitória, não conseguia sentir que ganhamos. 

Night Court - Zayn Malik.Onde histórias criam vida. Descubra agora