Depois do grupo da noite, todos chamaram Nazaré para o parque de diversões. Alegrou-se com o convite, pois nunca tinha ido para nenhum deles em sua vida. Às vezes, com a família, na ativa, observava as crianças no parque. Via os olhos de João Paulo brilharem de modo incomum, enquanto Jerônimo examinava o chão a catar latinhas, ou qualquer coisa que redensse algum trocado.
Nazaré, ao aceitar o convite, parecia dizer "sim" à nova vida. Dizer sim era dar-lhe um nova chance: estava ali não para observar e catar latinhas; estava ali para se divertir! Sim, ela, exatamente aquela que outrora fora invisível. Aquele instante era o que sempre quis: ser uma mulher comum, que vai ao parque aos sábados com os amigos, com a família. Naquele momento, então, aquela mulher se fez mulher.
No parque, irmanada dos companheiros, uma tristeza aguda lhe roubou lágrimas enquanto estava na roda gigante a comer algodão doce. Recordou do filho, o qual de certo morreria de alegria caso estive ali, não em coma fazia várias semanas.
Todos riam, Nazaré deixou o passado de lado e teve sua noite pueril, com a qual nem imaginava como era. Finalmente, ela estava em "boa companhia", finalmente ela era ela!
Desceu da roda gigante determinada que a partir daquela noite, ela seria feliz e logo, muito em breve, estaria no parque de diversão com o filho.
Depois da roda gigante, Nazaré foi ao brinquedo samba, que lhe arrancou lágrimas de risos, as quais jamais pensou que jorrariam em seus olhos de brilho outrora apagado.
Nazaré notou que a vida, sem drogas e álcool, poderia lhe causar momentos tão magníficos quanto aquele e que poderia ser feliz em sua existência pós drogas.
Um companheiro conseguiu, no joguinho de espingarda, um urso azul e presentou Nazaré com aquele ursinho de pelúcia - será para o meu filho, pensou ela. Abraçou o ursinho fortemente e a noite se fazia incrível.
O tempo passou tão rápido que ela não notou que teria que voltar para o hospital. Falou para todos que teria que, infelizmente, teria que ir. Uma nova amiga lhe ofereceu carona, antes, porém, Nazaré pediu para ir ainda outra vez na roda gigante.
Naquela roda gigante tinha algo que fazia Nazaré meditar: o movimento lento e giratório, que ora estava no alto, olhava todo o parque e as pessoas, as quais eram tão pequenas; ora estava baixo e a visão ampla não existia, e as pessoas tinham o tamanho original, e depois já está alta. Era um ciclo no qual viveu sua vida inteira .
Quando os dentes da engrenagem se mexeram, uma leve nebrina começou. Ela riu, a amiga também. Ambas gargalharam. No alto, Nazaré viu Jerônimo pequeno com um carrinho de bebê repleto de latinhas. Ficou pálida com a imagem do marido. Nunca havia, de fato, se apercebido como era o homem, como ela era, como o filho era.
Naquele movimento maquinal, algo nela mudou mudou brutalmente, talvez as suas expressões. Virou o rosto. Não sabia se tal gesto seria por vergonha ou medo, apenas o fez e, de pronto, a amiga notou e lhe questionou o que acontecerá. Nazaré balançou a cabeça é com um sorriso sem graça respondeu à amiga:
- Nada mulher, só estou cansada.
Quando desceram da roda gigante, Jerônimo estava passando pela pista, no sentindo contrário ao parque de diversões.
Nazaré desceu da roda gigante em silêncio. O silêncio lhe seguiu por todo o caminho. Com a amiga, no carro, o silêncio gritava. Naquela noite, pela questão do horário, não pode entrar no hospital.
A amiga, então, a levou para casa e prometeu que pela manhã cedinho a levaria ao hospital.
Deitada na cama, Nazaré orou pelo marido, pelo filho, pediu a Deus forças, pois estava para desabar e teria que ser forte como nunca fora antes.
Quando dormiu, Nazaré sonhou que estava no parque de diversões com sua "sagrada família". Limpa e bem vestida, a família brincava nos brinquedos junta, como uma família deve ser. De repente, uma tempestade destruia todo parque e Nazaré estava completamente só.
- Nazaré? Nazaré? Está na hora, vamos tomar café.
Atordoada, Nazaré acordou chamando pelo visto filho.
A amiga a abraçou e as duas choraram. A amiga disse baixinho:
- Só por hoje.
Aos prantos, Nazaré respondia como um mântra:
- É só por hoje. Só por hoje, só por hoje.

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A Sagrada Família
AventuraDissecando a fome e o que existe de mais repugnante, a doença dos vícios, a escravidão e a profunda miséria humana. Este é A Sagrada Familia: Pai, mãe e filho dependentes químicos, moradores de rua que vagam como andarilhos por todo lugar carregando...