Vinte e sete

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- Por que você os deixou ir?

O informante de Augusto o questionava, de volta ao escritório onde poucos minutos antes tinha recebido Benjamin para o levar até onde torturava Elisabete.

Diante da falta de resposta do prepotente homem que apenas olhava pela janela para o próprio filho correndo com a mulher ferida em seus braços, houve uma nova tentativa:

- Era só matá-la, Augusto! Você me fez arriscar tudo para traze-la até aqui! Apenas para solta-los? Eles vão direto na polícia, inferno! Você acabou comigo!

Lentamente o pai de Benjamin tirou os olhos da janela e virou-se para encarar o homem que tão bravamente parecia querer enfrenta-lo. Audacioso, não era possível negar.

O silêncio tomou conta da ampla sala por algum tempo, enquanto os olhos de Augusto pareciam querer queimar e transformar em meras cinzas o seu interlocutor. Um riso frio veio de repente, e faria qualquer pessoa que o presenciasse sentir suas estranhas revirarem. Não foi diferente dessa vez.

- Você está aqui por livre e espontânea vontade. – Augusto retrucou quando finalmente parou de rir. – Não sei de onde tirou o direito de me cobrar alguma coisa. Você não se preocupou com isso enquanto tirava vantagem da situação.

- Nós tínhamos um acordo!

- Ora, ora, nunca imaginei que você desejava tanto a morte da pequena Lis. Eu achava que você até gostava dela.

Com um sorriso irônico, Augusto se dirigiu tranquilamente para sua mesa, onde juntou as fotos que tinha mostrado para Ben anteriormente.

Parou especificamente em uma, que mostrava Benjamin saindo do hotel naquela manhã e parecia tranquilo, quase leve.

O som estridente de um celular tocando o fez levantar os olhos e lançar um olhar de repreensão para o homem a sua frente, que imediatamente tirou o som do aparelho, atrapalhando-se na tarefa.

Satisfeito com a obediência imediata, Augusto voltou a analisar a foto.

- Benjamin é meu filho. O único. Quando eu morrer, tudo que é meu será dele. Exclusivamente.

Uma risada incrédula e desesperada se fez presente, mas Augusto não deu atenção, como se já esperasse por uma reação assim.

- Pelo amor de Deus! Desde quando você um pai sentimental? Você quase o matou quando ele era um garoto e fez o mesmo com Elisabete agora! Você só pode estar louco... O que impede os dois de te denunciarem agora mesmo? Ou me denunciarem? Nós estamos perdidos...

- Nada. Nada impediria, nisso você tem total razão.

O homem riu desesperado mais uma vez enquanto andava em círculos pela sala, sem acreditar no que estava ouvindo. Estava lidando com um lunático. Agora isso estava mais do que claro.

- Você está maluco, Augusto. Totalmente desequilibrado.

- O sangue fala mais alto, meu caro. Sempre falará. Eu posso ser preso hoje, amanhã ou depois. Mas, não ficarei mais de um dia na prisão e Benjamin sempre voltará para mim. Mais cedo ou mais tarde. Ele é como eu, é a minha imagem.

- Mas, Elisabete...

- Foi um erro! Eu assumo, foi um erro traze-la aqui e eu estou reparando-o. Subestimei os sentimentos de Benjamin por ela. Eu vi, naquela sala, que o perderia se continuasse com nosso plano. Estou apenas corrigindo um erro de cálculo. Ele está cego pela paixão, mas em breve, estará de volta.

O informante parecia inconformado enquanto passava as mãos pelos cabelos novamente, a ponto de arranca-los. Nada do que ouvia do imponente homem a sua frente parecia fazer o menor sentido.

Benjamin nunca voltaria. Não para ficar ao lado de Augusto, como ele acreditava.

Percebeu, pela primeira vez, o tamanho da insanidade que estava cometendo por dinheiro. Tinha acabado com sua vida e confiado em um maníaco egocêntrico.

Augusto estava cego. Era tão arrogante e confiante que estava de olhos fechados para suas próprias falhas. Não conseguia admitir que seu filho, torturado desde a infância, não nutria nenhum sentimento ou consideração pelo pai.

Era, claramente, uma visão distorcida da realidade.

- E eu, o que eu faço?

Sem tirar os olhos da foto de Benjamin, Augusto apenas deu de ombros.

- Acho que te dei dinheiro suficiente para que você suma da minha frente.

- Augusto, você não pode me usar e depois dispensar por conta apenas de um capricho seu!

- Não posso?

O desdém era tão perceptível em sua voz que se tornava quase palpável. Era como um tapa no homem que já estava em completo desespero.

Bastou apenas que um botão fosse pressionado para que os seguranças de Augusto adentrassem ao seu escritório.

Derrotado, restou ao informante deixar o local com suas próprias pernas. Sabia que resistir não era uma opção inteligente, a possibilidade de sair morto caso ofendesse Augusto além do limite era grande demais.

Sem dizer nada, retirou-se em passos largos. Querendo desaparecer daquela casa sufocante.

Augusto continuou observando as fotos que foram tiradas de Ben e Lis. Nunca achou que tivesse um coração, mas o sentimento estranho ao rejeitado por seu filho era o mais perto que podia chegar de um. Não que tivesse feito alguma coisa para receber o contrário de desprezo.

Levantando-se, ele voltou até a janela por onde tinha assistido Benjamin adentrar ao carro e sair em disparada.

Agora era o homem que o ajudara que corria pelo mesmo caminho, falando ao celular e parecendo não saber exatamente o que fazer.

Deixar as pessoas desbaratadas era algo que Augusto se orgulhava, por isso sorriu.

Talvez tenha chegado o momento de dar um tempo fora do país. Tinha todo um plano arranjado para quando esse momento chegasse.

Precisava só de alguns dias a mais para resolver algumas pendências. Provavelmente perdera sua fonte de informações sobre a polícia, mas ainda assim achava que poderia saber quando uma investigação estivesse se aproximando.

De qualquer forma, se afastaria por um tempo. Talvez Benjamin voltasse. Sim, talvez ele tivesse pegado gosto pelos negócios, no fim das contas.

O amor não poderia ser maior que o poder. Era como um jogo e a carta mais alta sempre vencia.

Os dados estavam lançados. O tempo iria dizer quem estava certo.

E Augusto nunca duvidou que seria ele.

Cartas entre nósOnde histórias criam vida. Descubra agora